Complicado e difícil, sempre acrescentava meu pai. Guimarães Rosas nunca foi tão atual. Os perigos ameaçam a todo instante, com guerras tradicionais por territórios, ouro ou vaidade, com a violência da desigualdade social e do uso de drogas, com o armamento da população, com a bala perdida atravessando o caminho da escola, a enxurrada afogando a falta de planejamento, a loucura do trânsito atropelando a família sem se importar com sinal vermelho.
O mesmo sol que promove vida, também pode tirá-la. Um dia de descuido na juventude pode ser o melanoma do futuro. As primeiras paqueras podem transmitir a doença do beijo (Virus de Epstein Barr) e se o namoro for mais profundo, pode passar o HPV que, décadas depois, causa câncer de útero ou pênis. Se fumar então, nem se fala. Câncer de pulmão, boca, bexiga, rim e tudo o mais. Álcool em excesso também. Se o amendoim vier contaminado com a aflatoxina, quem sofre é o fígado com carcinoma que também acomete mais os que fizeram uma tatuagem descuidada e contraíram o vírus B ou C de hepatite. Se adquirir o HIV, estará exposto à sarcomas e linfomas. Respirando ar poluído, ao câncer de pulmão. Quem gosta muito de churrasco, é bom saber da sua relação com câncer gastrointestinal, também favorecido por salsichas, alimentos processados, defumados ou conservados. Até dormir demais, ou de menos, pode aumentar o risco de câncer de esôfago. O sedentarismo também envolve muitos perigos, inclusive 5% das mortes por câncer.
Água pura, até agora não, mas se houver descuido e vier com Arsênico, como na epidemia da Índia, pode causar câncer de vias urinárias, próstata, pulmão e fígado. Se contaminada com a Microcistina, quantidades no dia a dia é considerada uma forte promotora de câncer primário de fígado.
A gordura corporal tem relação com 13 tipos de câncer, mas mo mundo foi condicionado a gostar do que é doce e calórico. Agora a OMS relaciona adoçantes com câncer, ainda sem certeza, sem precisão sobre a grandeza do risco e com a discordância explícita do FDA. Se for semelhante à luz do sol, pode ser tranquilo usar uma gotinha para combater o amargo da vida, como quem faz uma caminhada no nascer do sol, sem ficar histérico com medo de câncer.
A forma como foi divulgada a notícia distorceu a conclusão da OMS, afinal o aspartame foi colocado no mesmo nível do risco de ser cabelereiro. O risco 2b significa que as evidências dos estudos em animais são "menos do que suficientes" para estabelecer a relação. A manchete bem que poderia ser: A OMS define o uso de aspartame como seguro na dose usual e estimula estudos sobre o assunto. Se até 17 latas de refrigerante com aspartame por dia, para um homem de 85 kg, for considerado seguro, algo está errado na proporção que foi dada ao problema, se os estudos concluíram que a "evidência não é convincente". É bom lembrar que água pura, se ingerida nessa quantidade, pode matar por hiponatremia.
A discussão é necessária, considerando o aumento dos casos de câncer no mundo, mas, como sempre, os poetas são mais certeiros do que a ciência: "São demais os perigos dessa vida, para quem tem paixão... aí então é preciso ter cuidado porque deve andar perto uma mulher, tão linda que só espalha sofrimento, tão cheia de pudor que vive nua", definiram Vinícius e Toquinho.
Sérgio Gondim, médico