O impacto da pandemia na cobertura escolar do Ensino Fundamental (Meta 2 – PNE)
Neste artigo vamos abordar a meta 2 deste PNE, que trata da universalização do Ensino Fundamental (EF) de nove anos para toda a população de 6 a 14 anos de idade e da garantia de que,até 2024,pelo menos 95% dos estudantes concluam essa etapa na idade recomendada
No primeiro da série de vinte artigos em que vamos tratar da exequibilidade das metas do Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024), mostramos que o Brasil não conseguirá cumprir a meta relativa à educação infantil. Neste artigo vamos abordar a meta 2 deste PNE, que trata da universalização do Ensino Fundamental (EF) de nove anos para toda a população de 6 a 14 anos de idade e da garantia de que, até 2024, pelo menos 95% dos estudantes concluam essa etapa na idade recomendada. Como já enfatizamos no artigo anterior (JC– 14/08/2023), nossa análise tem como referência o relatório do 4° Ciclo de Acompanhamento do PNE produzido pelo Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) do Ministério da Educação (MEC).
Nossa análise começa pelo indicador de cobertura escolar do EF da população de 6 a 14 anos de idade quanto à sua universalização até 2024. Os números desse relatório revelam que desde o ano-base desse PNE, ou seja, 2013, o Brasil vinha mantendo uma cobertura próxima a 98%, considerada estatisticamente significativa para a chamada universalização. Todavia, com o advento da pandemia, o país sofreu um sobressalto de 2020 para 2021, com um recuo de cerca de dez anos nesse indicador, que o colocou num patamar inferior ao da linha de base (ano de 2013) desse PNE.
A cobertura de 2020 para 2021 caiu de 98,0% para 95,8%–este último é 1% menor do que aquele de 2013. A Região Sul foi a que mais retrocedeu, enquanto o estado de Roraima, dentre as unidades da Federação, foi o que mais caiu na cobertura escolar de 6 a 14 anos de idade–de 93,9% em 2020 para 88,1% em 2021, ou seja, uma queda de 5,8%; em relação ao ano-base de 2013, essa queda foi de 9,5%. O nosso estado de Pernambuco apresentou apenas uma leve queda de 0,4% de 2013 para 2021. Em 2021, o estado apresentou, por outro lado, uma cobertura escolar de 95,1%– abaixo da universalização esperada para 2024.
Quanto ao indicador de conclusão do Ensino Fundamental na idade recomendada de 16 anos para pelo menos 95% dos estudantes, os dados apontam que o Brasil alcançou, em 2021, um índice de apenas 81,1%. Em relação a 2020, houve um recuo de 0,8%. Para alcançar a meta de 95%, o país vai precisar crescer em média, ao ano, de 2022 a 2024, 4,6% – o que nos parece absolutamente improvável, olhando o desempenho desse indicador desde o ano de base de 2013. Dentre as regiões do Brasil, a Região Nordeste encontra-se na pior situação, com apenas 73,8% de estudantes concluindo o EF na idade recomendada. Quanto aos estados, a Bahia apresenta o pior desempenho, com apenas 64,5%. Pernambuco, por sua vez, encontra-se na média nacional de 81,1%.
Com relação a este indicador, a maior desigualdade ocorre em função da renda das famílias. Em 2019, a diferença entre os 25% mais ricos e os 25% mais pobres foi de 27,4%, ou seja: 94,4% dentre os mais ricos concluíram o Ensino Fundamental aos 16 anos de idade; em contrapartida, dentre os mais pobres, esse percentual foi de apenas 67,0%!
Em resumo, quanto à meta 2, o país provavelmente não cumprirá a cobertura escolar de matrículas de 6 aos 14 anos no Ensino Fundamental esperada para 2024, em decorrência da pandemia. Contudo, esse cenário pode mudar em função da eventual eficácia do trabalho de “busca ativa” (trazer os alunos de volta à escola) realizado neste ano de 2023 pelas Secretarias de Educação. O próximo Censo Escolar nos dirá isso. Quanto ao indicador de conclusão, o país não logrará êxito, porque é muito pouco provável que a taxa de conclusão na idade recomendada cresça 4,6% em média ao ano.
Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira do Instituto de Estudos Avançados da USP de Ribeirão Preto e professor emérito da UFPE.