OPINIÃO

Retrocesso na governança das estatais

Depois dos avanços obtidos com a Lei das Estatais, o governo federal vem substituindo os técnicos por políticos

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CLÁUDIO SÁ LEITÃO

Publicado em 14/10/2023 às 0:00 | Atualizado em 14/10/2023 às 8:57
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A Lei No 13.303 de 30.06.2016, conhecida como "Lei das Estatais", foi aprovada no governo do ex-presidente Michel Temer, para deixar registrado um dos legados do seu mandato de transição, por influência da Operação Lava Jato, e como forma de criminalização da atividade política nas empresas estatais. A partir da" Lei das Estatais", as Companhias (Cias) Controladas pelo Estado aprimoraram suas estruturas e processos de Governança Corporativa (GC). Após a aprovação da Lei das Estatais, foi estabelecido uma série de exigências técnicas para preenchimento dos cargos de direção e de conselho das Cias Controladas pelo Estado.

Como a qualificação e o notório conhecimento técnico eram uma exigência para os cargos de direção e de conselheiro, agora as indicações políticas para esses postos, em cias privadas de capital aberto, que possuem participações societárias do BNDES Participações S.A. (BNDESPAR), holding ligada ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ficaram explicitas com as recentes nomeações efetuadas, por indicação do Governo Federal (GF). Há pouco tempo, as decisões tomadas pelo BNDESPAR refletem o seu desejo de ter posição mais ativa nos conselhos das cias privadas que representem os interesses do GF. Esse conflito de interesses é uma perigosa via de mão dupla que não conduz ao bom caminho da GC. De um lado os membros indicados politicamente, para uma posição de destaque, podem ser os advogados dos interesses privados no ambiente do GF.

Do outro lado, os indicados pelo GF podem defender posições lesivas aos interesses privados da Cia., ao interferir nos rumos estratégicos divergentes dos traçados anteriormente pela Cia. Um dos objetivos dos conselheiros de qualquer Cia. é defender os interesses dela, em suas funções básicas que são; boa administração e governança, boa produtividade, bons lucros e bons dividendos para os acionistas. No momento, a pretensão do GF é que prevaleça o seu interesse particular de acionista, detentor de grande poder econômico nas mãos, com bancos oficiais que representa um percentual elevado na oferta de crédito. Esses bancos oficiais tem muitas formas de influenciar nos rumos das cias. privadas, nas quais tem participação societária, como acesso as linhas de crédito do BNDES, sendo, ainda, a única fonte disponível de empréstimo de longo prazo do País. Isso significa dizer que o GF busca ter mais poder de decisão nos conselhos das cias privadas que o BNDESPAR participa societariamente.

As últimas indicações efetuadas pelo GF em cias privadas representa um retrocesso nas boas práticas de GC nas estatais, que determinam que o conselho tenha perfil diversificado e composição que permita o debate efetivo de ideias. Depois dos avanços obtidos, nos últimos anos, com a Lei das Estatais, no sentido de qualificar as indicações orientadas para o bem da Cia. e de acordo com elementos claramente técnicos e objetivos, de modo a poder agregar ao processo decisório do conselho, o GF veem substituindo os técnicos por políticos, como parte de sua estratégia de votar e, consequentemente, de ser ouvido nas decisões estratégicas que são tomadas pelas Cias. que o Estado é acionista.

Cláudio Sá Leitão, conselheiro de Empresas e CEO da Sá Leitão Auditores e Consultores.

 

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