OPINIÃO

Alfabetização, tempo integral e aprendizado escolar

O país não tem hoje um indicador oficial para aferir se a criança está ou não alfabetizada ...

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MOZART NEVES RAMOS

Publicado em 16/10/2023 às 0:00 | Atualizado em 16/10/2023 às 8:24
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Dando continuidade a nossa análise do Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024), em conformidade com os nossos quatro últimos artigos publicados neste JC, neste vamos tratar das metas 5, 6 e 7, relativas à alfabetização de crianças, escolas de tempo integral e aprendizagem escolar.

Começamos pela meta 5, que tem como objetivo alfabetizar todas as crianças no máximo até o final do 3° ano do Ensino Fundamental (EF). Para monitorar essa meta foi criado em 2013, pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), do Ministério da Educação (MEC), o programa de Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA). As duas aplicações do ANA foram divulgadas em 2014 e 2016, e assim foi possível constatar os níveis de alfabetização em leitura, escrita e numeramento ao final do 3° ano do EF. Mas, a partir de 2017, em decorrência de mudanças governamentais, o programa foi descontinuado, e hoje não temos um indicador claro da alfabetização das nossas crianças. Portanto, o que se sabe é que, em 2016, 45,3% das crianças ao final do 3° ano do EF tinham aprendizado adequado em leitura, 66,1% em escrita e 45,5% em matemática - portanto, muito aquém da meta de alfabetizar todas as crianças até 2024. Se levarmos em conta o efeito da pandemia, que afetou fortemente as crianças nessa etapa escolar, essa meta não será cumprida. Não obstante, como já adiantamos, o país não tem hoje um indicador oficial para aferir se a criança está ou não alfabetizada. Espera-se que o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, recentemente lançado pelo MEC, inspirado no modelo de alfabetização cearense, possa corrigir essa lacuna.

A meta 6 tem como objetivo oferecer educação em tempo integral (ETI) em no mínimo 50% das escolas públicas, de forma a atender pelo menos 25% dos alunos da Educação Básica. De acordo com o relatório do 4° Ciclo de Monitoramento das Metas do PNE, produzido pelo Inep/MEC, em 2021 apenas 22,4% das escolas públicas funcionavam em tempo integral, com 15,1% de alunos atendidos. Portanto, o país está muito longe de alcançar a meta 6. Para que isso acontecesse seria preciso aumentar em 9,9 pontos percentuais o número de alunos em ETI, assegurando um crescimento médio de 3,3 pontos percentuais por ano; além disso, seria preciso aumentar em 27,6 pontos percentuais o número de escolas de ETI, promovendo um crescimento médio de 9,2 pontos percentuais por ano. Considerando o desempenho histórico desde o ano-base de 2013 do PNE, isso é absolutamente improvável. Mais uma meta que não será alcançada!

Por fim, a meta 7 tem por objetivo fomentar a qualidade da Educação Básica em todas as etapas e modalidades, com melhora do fluxo escolar e da aprendizagem, de modo a atingir as médias nacionais do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) - indicador que foi criado para monitorá-la e que integra fluxo e aprendizagem). Para os Anos Iniciais do EF, o Ideb previsto em 2021era de 6,0, mas o país chegou a 5,8 - neste caso o não atingimento se deveu ao efeito da pandemia, pois o Brasil vinha numa evolução muito positiva e batendo as metas parciais. Quanto aos Anos Finais do EF, o Brasil já vinha encontrando muitas dificuldades para atingir as metas parciais desde 2013, e, de fato, o Ideb verificado em 2021 foi de 5,1, enquanto a meta prevista era de 5,5. No que se refere ao Ensino Médio, as dificuldades foram ainda maiores: de 2013 para cá a distância entre o valor projetado e o verificado só fez crescer; de fato, o valor verificado do Ideb em 2021 foi de apenas 4,2, enquanto o previsto era de 5,2 - uma diferença de 1,0 ponto entre o projetado e o verificado. Assim, o Brasil não alcançou a meta 7 em nenhuma das três etapas escolares.

Mozart Neves Ramos,  titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira da USP de Ribeirão Preto e professor emérito da UFPE.

 

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