O silêncio do pensamento
Trago a felicidade de palavras acumuladas. Urge guardá-las no íntimo, então, serei capaz de entender a existência. Quantas interrogações me rodeiam e não sei respondê-las!
Olho pela janela e aprecio o jardim do prédio. As árvores estão verdes, há uma sensação de que o silêncio permeia o entorno do que vejo. Sinto-me feliz diante da paisagem avulsa. Tudo muito calmo, somente ao longe o ruído da existência. E a respiração, acompanhando o ritmo do cenário. Entrego-me por completo ao espelho da memória. Vou e volto, mas o passado permanece quase estático. Quantas vezes o silêncio me fala tão alto? Busco a quietude para então ouvir o que lá de dentro se passa no âmago. Sento-me na poltrona e assumo as divagações. Então, ouço muito. A lembrança se exalta em reminiscências que se alojam no íntimo. Atravesso o tempo como se a ilusão me apontasse uma longa caminhada. O passado renasce com a força da sua intensidade. Olho de um lado para o outro; percebo uma mistura de exaltação e calmaria. Nada me aflige diante de evocações que merecem relevo. Absorvo os mínimos detalhes dos sigilos. Deixo-me fluir, longe de qualquer retraimento. De nada sei e, ao mesmo tempo, de tudo sei.
Apreendo os ocultos mistérios e me identifico com a paisagem tão próxima. Parece que conheço o espaço que me rodeia. Não sei quem sou e, no entanto, adivinho tantas coisas... Na verdade, preciso encontrar-me e, ao mesmo tempo, não desejo a dimensão face a face. Quantas multiplicidades me acompanham? Não sei responder e, sobretudo, evito tal digressão. Preciso cultuar as imagens longevas. Há em mim uma busca permanente do passado como se o pretérito me resguardasse de todos os esquecimentos. Os enigmas do ontem me fortalecem. Não adianta enganar-me. Cada passo simboliza um rodeio de entretempos.
Trago a felicidade de palavras acumuladas. Urge guardá-las no íntimo, então, serei capaz de entender a existência. Quantas interrogações me rodeiam e não sei respondê-las! Entretanto, tenho certeza: a lembrança acumula sempre e sempre anônimos devaneios. Estarei buscando caminhos enigmáticos? De nada duvido. Creio em todas as coisas, a amplitude do íntimo se alonga para muito além do que almejo. Esquecer, jamais. Ao contrário, adicionar elementos incógnitos auxiliam a decifrar o enredo que habita interioridades. Desde quando poderei descrever-me?
Perguntas e mais perguntas. Trago tantas incertezas pretéritas que, vez por outra, aprecio antigas indagações. Sei tão pouco... O que deixei para trás se presentifica ao largo da minha consciência. Não adianta fingir momentos outros. Somos uma múltipla realidade que jamais se define na sua essência. O silêncio me domina por completo. Quantas vezes tentei responder tal indagação? Melhor caminhar devagar ouvindo a memória insistentemente. Nada direi. Louvarei os mistérios. Assim, estarei bem mais forte diante das ansiedades. A precaução ajuda toda a caminhada. Aprecio presentificar-me para, então, conhecer-me em profusão. Busco ajuda nas metáforas do passado. Assim, saberei identificar-me com mais cautela.
Fátima Quintas , da Academia Pernambucana de Letras