Os adjetivos e o terror
Não é preciso posição política. Basta não desumanizar humanos, como fizeram os nazistas e agora fazem os terroristas. Na escolha dos adjetivos, não pode haver dúvidas
"O Chimbinha é um guitarrista genial", disse um crítico musical. Ariano Suassuna protestou: "se gastam esse adjetivo com Chimbinha, o que vou falar de Beethoven?".
O uso errado das palavras pode ser por falta de vocabulário, por ingenuidade ou por má fé. Em 2017, sindicalistas invadiram a câmara, quebraram vidraças e os chamaram de manifestantes; não pegaram nem uma Ave-Maria de penitência. Alguns envolvidos no 8 de janeiro foram condenados a 17 anos, como terroristas. E o Hamas? Que palavra usar?
Alguns jornalistas e políticos ficaram desnorteados; até agora não acharam um termo que os agrade, pois gastaram o adjetivo com os aloprados. Os neurônios fervem, porém, as sinapses não se completam e o silêncio torna-se ensurdecedor. Outros arriscam: são terroristas! Porém, logo em seguida, vem um mas, como se fosse possível atenuar o que o mundo testemunhou. Tentar igualar Israel ao Hamas é uma genuflexão vergonhosa às ideologias e aos tiranos teocratas, para dizer o mínimo.
Bebês decepados, assassinato em massa, estupros e sequestros, não há defesa possível; de nenhuma cultura, de nenhum partido político, de nenhum líder, de nenhum ser humano. O silêncio ou a condenação suavizada é apoio velado.
Não venham militantes disfarçados analisarem o cenário histórico e político da antiga Canaã. Poucos cérebros no mundo o podem. Fiquemos nas humanidades, ou desumanidades.
A América Latina, mais uma vez, nos constrange. O presidente da Colômbia chamou israelenses de neonazistas; Daniel Ortega e Evo Morales expressaram seu apoio ao Hamas. O nosso governo atual, usou o termo terrorista, fez certo, mas evitou colocar Hamas na mesma frase. Talvez por ter sido parabenizado por esse grupo após a eleição, ou pela proximidade que tem com o Irã, o principal ator por trás do Hamas.
O Brasil, anão diplomático que é, se apequena ainda mais pela falta de firmeza; poderia, como atual chefe do conselho de segurança da ONU, exigir a liberação dos reféns, mas falta coragem. Celso Amorim prefaciou um livro de louvor ao grupo; vinte deputados de esquerda não assinaram uma moção de repúdio ao Hamas, que já em 1987, pregava a extinção de todo um povo. É vergonhoso.
Inocentes palestinos também são vítimas. Os líderes, instalados em hotéis 5 estrelas, assim desejam, pois, a vida para eles não tem valor, de nenhum povo; querem o caos, pois só assim sobrevivem. A causa do povo palestino não é a causa do Hamas.
Analistas sérios concordam que o objetivo foi evitar a recente aproximação de Israel com a Arábia Saudita, que enfraqueceria ainda mais o Irã e grupos terroristas. Desejam a reação sem precedentes de Israel e colocam seu povo escravizado como escudo, para depois exibir as imagens como propaganda.
É preciso que a indignação seja maior que a covardia. A honestidade, com os próprios valores, exige a condenação dessa barbárie sem meias palavras. Não é preciso posição política. Basta não desumanizar humanos, como fizeram os nazistas e agora fazem os terroristas. Na escolha dos adjetivos, não pode haver dúvidas.
Ermano Melo, médico oftalmologista