OPINIÃO

Quais os impactos do envelhecimento da população brasileira?

É preciso enxergar as demandas cada vez mais complexas para o sistema de saúde, previdência social, mobilidade urbana, assistência social, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade.

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AILTON VIEIRA DA CUNHA E PRISCILA LAPA

Publicado em 06/11/2023 às 0:00 | Atualizado em 06/11/2023 às 8:04
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O censo de 2020, divulgado recentemente, constatou que a população brasileira está mais velha do que a registrada no levantamento anterior. Além disso, em 2022, também foi verificado o maior aumento, desde 1940, nos dados de envelhecimento da população, quando comparados os dois últimos censos. Hoje, o Brasil tem 55 idosos para cada 100 jovens.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), houve um aumento na idade mediana do brasileiro: passou de 29 anos, em 2010, para 35 anos, em 2022. Isso significa que metade da população tem até 35 anos e, a outra metade, está acima dessa idade. Tal situação tem alertado os pesquisadores de várias áreas das Ciências Sociais sobre os desafios que o fenômeno do envelhecimento traz para o planejamento de políticas públicas e para a economia brasileira, sobretudo na sobrecarga na previdência social. Quanto mais velha é a população, menor é o número de pessoas ativas na cadeia de produção.

Estudos apontam que a reforma da previdência, realizada em 2019, não foi suficiente para controlar o déficit na arrecadação de recursos provocado pelo envelhecimento da população e consequente redução no número de contribuintes. Nessa direção, existe uma linha de argumentação que defende uma reforma na previdência cujo ponto central seja o aumento automático da idade de aposentadoria, conforme o aumento da expectativa de vida dos brasileiros.

De uma maneira geral, esse argumento troca a causa pelo efeito, no sentido de que o déficit no orçamento da previdência não é causado simplesmente pelo envelhecimento da população, mas tem uma forte correlação com o aumento do desemprego em uma faixa etária que começa aos 40 anos de idade, se consolida após os 50 anos e exclui quase a totalidade dos aposentados do processo produtivo. Ou seja, as pessoas são excluídas do mercado de trabalho mais cedo e se aposentam mais tarde, o que traz efeitos perversos também para essa população envelhecida.

A saída para esse problema não está apenas na reforma da previdência, mas sobretudo na lógica da empregabilidade de pessoas com mais de 50 anos e da possibilidade de inserção de aposentados no tecido produtivo, com geração de renda aliada à dignidade. Vale salientar que 34% dos domicílios brasileiros dependem de 70% da renda dos idosos, de acordo com diagnóstico publicado em 2020, por Ana Amélia Camarano, especialista em estudos populacionais. Conforme a pesquisadora, têm crescido os "nem-nem-nem" maduros, que são homens entre 50 e 64 anos que não trabalham nem são aposentados, desafiando os governos e legislativos na proposição e efetivação de políticas públicas capazes de promover a inclusão produtiva dessa parcela da sociedade.

Para além das questões de renda, os idosos cumprem um papel fundamental nas famílias, dando suporte aos netos para que os pais possam trabalhar, contribuindo, de forma decisiva, para a formação cidadã das famílias, dos vínculos sociais e afetivos. Planejar o futuro do país passa, portanto, pela compreensão mais ampla dos impactos do envelhecimento da população. É preciso enxergar as demandas cada vez mais complexas para o sistema de saúde, previdência social, mobilidade urbana, assistência social, criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade.

Priscila Lapa, doutora em Ciência Política; Ailton Vieira da Cunha, doutor em Sociologia.

 

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