OPINIÃO

Por um Centro Administrativo de Pernambuco

A implantação do Centro Administrativo de Pernambuco nas áreas centrais do Recife, especialmente no bairro de Santo Antônio, trazendo de volta Secretarias e órgãos públicos, não é suficiente para transformar a realidade do Centro, mas será, com certeza, um componente fundamental para uma inflexão na história recente de esvaziamento e degradação urbana e econômica

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SÉRGIO C. BUARQUE

Publicado em 08/11/2023 às 0:00 | Atualizado em 08/11/2023 às 11:45
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Como o Palácio do Governo está localizado na Ilha de Antônio Vaz, precisamente na ponta do bairro de Santo Antônio, onde se encontram os rios Capibaribe e Beberibe, era natural que as Secretarias de Estado e os principais órgãos públicos, inclusive federais, se situassem nas áreas centrais do Recife. A proximidade física com o gabinete dos Governadores facilitava a comunicação e reduzia os custos de deslocamento para despachos e reuniões do governo ou com dirigentes governamentais, quando se trata de órgãos federais. A revolução digital diminui um pouco a importância desta proximidade, mas não elimina a relevância dos contatos diretos e presenciais dos Governadores com seus auxiliares e parceiros do governo federal. E foi assim até meados dos anos setenta do século passado, quando começou um movimento de dispersão das secretarias e órgãos do governo para áreas periféricas do Recife.

Já no final dos anos sessenta, a Universidade Federal de Pernambuco promoveu o movimento de transferência para os edifícios que formam a Cidade Universitária, esvaziando a quase totalidade das faculdades que funcionavam no Centro, a começar pela emblemática Escola de Engenharia da Rua do Hospício. A SUDENE, que ocupava o prédio JK na avenida Dantas Barreto, mudou-se, logo depois, para o prédio construído no Engenho do Meio, às margens da BR 101. Nesses mais de 50 anos, o número de alunos e professores da Universidade cresceu exponencialmente e os servidores da SUDENE reduziram a ponto de tornar ocioso grande parte das instalações do edifício do Engenho do Meio. A SUDENE cedeu o prédio à Universidade e se transferiu para o edifício alugado em Boa Viagem.

O mais estranho, entretanto, foi o movimento de transferência das secretarias do governo do Estado para bairros distantes do Palácio do Governo. Hoje, apenas a Secretaria da Fazenda continua no bairro de Santo Antônio, as Secretarias de Desenvolvimento Econômico, Mulher e Ciência, Tecnologia e Inovação, estão no Bairro do Recife, e a Secretaria de Planejamento e Gestão foi levada para Santo Amaro. O restante das Secretarias do Estado de Pernambuco está distribuído do Pina (Secretaria de Administração) à Várzea (Secretaria de Educação), passando pelo Bongi (Secretaria de Saúde) e pelos Aflitos (Secretaria de Meio Ambiente). Além disso, vários órgãos estaduais de peso e com grande número de servidores, como a ADEPE, o CONDEPE/FIDEM, e a AGE, estão bem longe do Palácio do Governo.

Nas últimas décadas, em mais de uma ocasião, foi discutido no governo do Estado um projeto para construção de um Centro Administrativo fora do Centro do Recife, transferindo o Palácio do Governo e todas as secretarias do Estado. Era um modelo que estava sendo implementado em vários outros Estados do Brasil e parecia ter uma racionalidade operacional: proximidade de todas as unidades do governo, distância do tumulto urbano, e melhoria da mobilidade. Esta racionalidade do governo, entretanto, vai na direção oposta à concepção de desenvolvimento urbano, tendo provocado o esvaziamento das áreas centrais de Cidade, desperdício enorme de infraestrutura e equipamentos e desvalorização e degradação do espaço urbano nos Centros das cidades. Foi o que aconteceu com as áreas centrais do Recife, especialmente o bairro de Santo Antônio que foi, no passado, o núcleo central da vida social e econômica da Cidade.

Esta não foi, evidentemente, a única causa do esvaziamento do Centro do Recife. Mas, com certeza, foi determinante do processo de abandono em que se encontram as áreas centrais do Recife, na medida em retirou da circulação pelas suas ruas e avenidas centrais milhares de servidores com renda, que criam dinâmica econômica, ampliam o comércio e os serviços, e estimulam o estabelecimento de residência próxima do local de trabalho. Agora que se discute medidas para reabilitação urbana e dinamização econômica do Centro do Recife, o governo do Estado deve formular um plano de retorno das Secretarias de Estado e parte das instituições públicas para os bairros centrais, combinando o ganho de proximidade com o Palácio do Governo com o impulso à movimentação de pessoas pelas ruas e avenidas da Cidade, especialmente no bairro de Santo Antônio. Caro? Sim, mas de grande retorno e benefício para o Recife. Ao mesmo tempo, deveria negociar com o governo federal a ocupação do Centro com parte das suas instituições em Pernambuco, incluindo a SUDENE. Movimento semelhante está acontecendo no Bairro do Recife com as empresas do Porto Digital que mobilizam cerca de sete mil profissionais nas ruas e avenidas. Aquele que foi, no passado não muito longe, um dos bairros mais degradados do Recife, tem hoje uma notável dinâmica econômica que estimula a reabilitação urbana.

A implantação do Centro Administrativo de Pernambuco nas áreas centrais do Recife, especialmente no bairro de Santo Antônio, trazendo de volta Secretarias e órgãos públicos, não é suficiente para transformar a realidade do Centro, mas será, com certeza, um componente fundamental para uma inflexão na história recente de esvaziamento e degradação urbana e econômica. Edificações icônicas abandonadas, patrimônio histórico e arquitetônico de grande valor que estão esquecidos e degradados, poderiam se transformar em Secretarias de Estado e órgãos públicos, gerando um intenso movimento de pessoas com demandas econômicas e, mesmo, residenciais. Além disso, a concentração de servidores do governo no território promove a convivência e a interação direta de técnicos, gerentes e profissionais do setor público nos espaços públicos, fundamental para a criação de um ambiente de inovação e criatividade. Decisão política que muda a história da Cidade.

Sérgio C. Buarque, economista

 

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