Não, Biden
Na Faixa de Gaza, o Hamas expulsou à bala, em 2007, os membros da Fatah, organização base da ANP. Abbas tirou o Hamas da instituição que dirige. Portanto ele é incapaz de "revitalizar" uma governança unificada entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza como almeja Biden.
O presidente dos EUA, Joe Biden, publicou no The Washington Post (18/11/23) artigo propondo que a Autoridade Nacional Palestina (ANP), no final do conflito entre Israel e o Hamas, passe a ser responsável pela governança unificada da Cisjordânia com a Faixa de Gaza. Biden quer “revitalizar” a ANP. Mas, não diz como. Ele e o Secretário de Estado, Anthony Blinken, sabem ser impossível esse revigoramento nas circunstâncias atuais. Contudo, seu discurso cai bem em período eleitoral além de ser politicamente correto.
A verdade é que o conflito já dura mais de um século, ou seja, antes da existência do Estado de Israel e do uso do termo “palestino”. Só fez se agravar com o surgimento do radicalismo islâmico. Ao contrário da minoria yazidi e cristã no norte do Iraque cruelmente reprimidas, o Estado Judeu resolveu se armar e enfrentar a maioria islâmica/árabe que domina a região. Para sorte de Israel, há uma divisão islâmica entre xiitas e sunitas. Hoje em dia, quem diria, a Arábia Saudita, Egito e Jordânia estão mais próximos de Israel do que do Hamas. Um dos motivos do recente ataque terrorista foi tentar minar um acordo entre Israel e Arábia Saudita. Egito e Jordânia já possuem acordos de paz com o Estado Judeu.
A ANP, praticamente, nada fez, desde 1994, para construir os alicerces de um estado palestino. Aquilo que a literatura chama de processo de state building (construção do estado moderno). Infelizmente, a capacidade da elite política palestina na construção de sólidas instituições estatais deixou a desejar. Apesar de todo apoio econômico e político recebidos. É um típico caso de “estado falho” sem ter se tornado formalmente um estado.
O líder da ANP, Mahmoud Abbas, governa ditatorialmente a Cisjordânia e é acusado de corrupção pela oposição Seu governo apoia, incentiva, financia e educa as crianças para o terrorismo. Abbas concede bônus à família de terroristas que perderam suas vidas em atentados terroristas. Dá nome de ruas para terroristas. O terror confere status a quem o pratica. A Fatah é uma espécie de Hamas laico.
Paradoxalmente, se não fosse o apoio militar de Israel, Abbas já teria caído pois sua autoridade na Cisjordânia é contestada tanto pelas células do Hamas como da Jihad Islâmica. Quem quiser constatar isto basta assistir o seriado “Fauda” na Netflix. Para piorar, Abbas já negou o Holocausto e agora acusou, sem qualquer evidência, que helicópteros israelenses dispararam contra civis durante o festival de música eletrônica Supernova, em 7 de outubro passado.
Na Faixa de Gaza, o Hamas expulsou à bala, em 2007, os membros da Fatah, organização base da ANP. Abbas tirou o Hamas da instituição que dirige. Portanto ele é incapaz de “revitalizar” uma governança unificada entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza como almeja Biden. No momento, não há quem seja capaz disto. Esta é a realidade e Biden precisa aceitá-la para que a emenda não se torne pior do que o soneto. Se a criação de um estado palestino já era difícil antes desta guerra, o Hamas, praticamente, sepultou a criação do mesmo. Não há uma solução a curto e médio prazos para o imbróglio entre Israel e os palestinos. E a longo prazo, como lembra Keynes, todos nós estaremos mortos.
Jorge Zaverucha ,l doutor em Ciência Política pela Universidade de Chicago e professor titular da UFPE