A memória do Holocausto: aprendemos as lições?
Há mais de 75 anos, Israel luta pelo simples direito de ter sua soberania reconhecida
Neste sábado, 27 de janeiro, vivenciamos o Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto.
Quando, em igual data de 1945, as tropas soviéticas libertavam o campo de concentração e extermínio de Auschwitz-Birkenau, se tornava cada vez mais claro para todo o mundo que houvera sido praticado o maior dos crimes da história da humanidade. Desde então passou a se gritar a frase: “Nunca mais!”.
O regime nazista atingiu vários grupos sociais. Foram vítimas, negros, ciganos, Testemunhas de Jeová, pessoas com deficiência, homossexuais, dissidentes políticos. Mas particularmente foi atingido o povo judeu, para quem fora planejado e executado um plano de puro extermínio.
É difícil imaginar a dimensão do sofrimento perpetrado. Desde as leis discriminatórias, passando pelo confinamento em bairros insalubres até a deportação para os campos de escravidão e morte.
Como descrever as cenas de famílias destroçadas, pais impotentes diante do sofrimento dos filhos, filhos desamparados diante do assassinato dos pais?
Seis milhões de seres humanos eliminados por um regime que pretendia trazer uma “pureza” racial para nosso planeta e extinguir as “ervas daninhas” que não se coadunavam com esse conceito. Um milhão e meio de crianças judias assassinadas.
A história judaica, marcada por inúmeras tragédias, também registra uma capacidade de resiliência responsável por um resgate coletivo que se sucedeu a cada infortúnio. Das calúnias, massacres e expulsões da Idade Média emergiram novas e pujantes comunidades judaicas em outras paragens. Das expulsões da Península Ibérica e das fogueiras da Inquisição também floresceu a presença judaica em outros rincões, particularmente nesta cidade do Recife, de onde escrevo estas linhas, testemunha da formação da primeira comunidade judaica formal das Américas. Dos pogroms da Europa Oriental registrou-se um novo movimento migratório para o Novo Mundo, incluindo mais uma vez a capital pernambucana. E em paralelo, o fortalecimento de um movimento nacional judaico, o Sionismo, que plantou a semente do ressurgimento de um estado judeu em sua terra ancestral.
Já antes do surgimento do ovo da serpente do nazismo, na Europa, judeus e judias faziam seu caminho de regresso à antiga pátria, munidos do ideal de reconstruir uma identidade judaica soberana, livre das históricas perseguições.
E quando encerrou a hecatombe na Europa, já estavam maduras as bases da criação do moderno Estado de Israel.
Uma pequena terra, dois povos e a necessidade de um compromisso político que contemplasse os legítimos direitos de ambas as partes.
Há mais de 75 anos, Israel luta pelo simples direito de ter sua soberania reconhecida. Que possa viver em paz com seus vizinhos. Que não seja um país que precise a cada momento justificar seu direito à existência.
O povo palestino, coabitante daquela região, possui igual direito e precisa ter sua autodeterminação contemplada.
Mas quando falamos do Hamas e de todas as ramificações do fundamentalismo islâmico, estamos tratando de outra dimensão.
As cenas protagonizadas por esse grupo em 7 de outubro passado, invadindo território soberano israelense e assassinando friamente quem encontrasse a sua frente. Mulheres estupradas, filhos mortos na frente dos pais, pais mortos na frente dos filhos. A maior mortandade de judeus num único dia desde a triste memória do Holocausto.
O desencadear do conflito trouxe à tona novamente o discurso do antissemitismo. Poucos de nós poderíamos imaginar a dimensão que este sentimento alcançou. O que estava em parte adormecido despertou com toda a sua fúria e irracionalidade.
Os discursos e os atos que pareciam fazer parte de um triste passado recente voltaram a ecoar em alto e bom som, buscando desumanizar o povo judeu e justificar o injustificável.
O Hamas possui em sua gênese o espírito genocida. Separa os seres humanos de acordo com seus critérios de pureza. Investe seus recursos para eliminar aqueles que ousam existir de forma distinta. É triste constatar as vozes que se levantaram para aplaudir essa forma nazista contemporânea.
A recordação do Holocausto precisa sempre soprar em nossos ouvidos, desenhar em nossa vista, adentrar em nossas narinas, lembrando que jamais podemos dar guarida a ideologias que pregam o ódio, a discriminação, o desprezo pela vida humana, a negação da humanidade de quem expressa a diversidade.
A memória do Holocausto precisa se transformar em capacidade educativa. Para que possamos ensinar a nossas crianças que há espaço nesse mundo para todas as civilizações. Que todas as expressões étnicas, culturais, religiosas precisam ser respeitadas. Que não podemos nunca defender uns, subjugando outros.
“Nunca mais” é agora!
Jáder Tachlitsky, economista, professor de História Judaica e coordenador de Comunicação da Federação Israelita de Pernambuco