A reforma possível (Parte III): O desafio da regulamentação e uma longa transição
Neste último artigo, de uma serie de três, examino que setores foram beneficiados, foram isentos ou tiveram regimes especiais
Neste último artigo, de uma serie de três, examino que setores foram beneficiados, foram isentos ou tiveram regimes especiais. Destaco ademais os desafios da regulamentação para o Congresso e para a sociedade bem como ressalto a longa transição até que o novo sistema reine soberano.
A legislação que regulará os novos tributos será aplicada à medida em que ocorra a incorporação do novo sistema em substituição ao atual. A legislação básica para a CBS e o IBS deverá estar concluída em 240 dias a partir da promulgação da reforma. Esta nova legislação exigirá, nos próximos meses, intensas negociações no Congresso Nacional para as quais a sociedade, especialmente o setor produtivo, precisará estar atento e ser atuante. O desenho dessas normas irá mensurar os ganhos dos setores que foram beneficiados e identificará a alíquota padrão (soma das alíquotas do IBS e da CBS) que se aplicará aos segmentos que não foram favorecidos.
As alíquotas especiais corresponderão a 40% da alíquota padrão (redução de 60%) para um conjunto de nove setores da economia. Define também que 70% da alíquota padrão (redução de 30%) será aplicada para serviços profissionais fiscalizados por conselhos, serviços de profissão intelectual de natureza científica, literária ou artística, uma concessão privilegiada a um grupo de profissionais que se situa no topo da pirâmide de renda brasileira, mas que tem voz e força política no Congresso Nacional. Uma exceção que não se justifica no contexto de uma sociedade profundamente desigual.
A reforma determina que a alíquota será zerada para dez setores, (redução de 100% da alíquota padrão) e que regimes específicos que não se conformam á natureza do IVA se aplicam a outros, tais como Combustíveis e Lubrificantes, por exemplo.
Com tantas exceções, a alíquota padrão será elevada, estimando-se que possa se situar em torno dos 27% (estudo do Ministério da Fazenda) aplicando-se aos demais setores da economia, especialmente aos produtos do varejo e aos serviços. O texto aprovado prevê, contudo, uma avaliação quinquenal de custo-benefício dos regimes diferenciados e possibilidade de eventual transição dos produtos e serviços desonerados para a alíquota padrão.
A repartição dos benefícios e custos da reforma ficará, então, transparente para a sociedade no decorrer de um longo período de transição que se estenderá de 2026 até 2033, sendo que a transição para a CBS se completa em 2029, o IPI assume alíquota zero, também em 2029, exceto para produtos que concorram com a Zona Franca de Manaus e o IBS completa sua implantação em 2033.
A reforma isentará a cesta básica, promoverá por meio do cashback a devolução de parte dos impostos pagos pelas pessoas mais pobres na aquisição de produtos alimentícios, gás de cozinha e energia elétrica e criará um fundo que visa compensar o contribuinte pela redução, entre 2029 e 2032, dos benefícios concedidos, para aqueles outorgados até 31 de maio de 2023, incluindo ulteriores prorrogações e renovações. O valor total do Fundo de Compensação será de R$ 160 bilhões estendendo-se de 2025 até 2032. Estes itens são compensatórios e buscam reduzir perdas e corrigir injustiças tributárias para as empresas detentoras de benefícios fiscais e para os mais pobres.
A reforma é essencial para modernizar o país, inserindo-o entre aqueles que têm os sistemas tributários mais modernos, simples e eficientes do mundo. O atual será gradualmente extinto com uma transição de sete anos entre 2026 e 2032. Em 2033, o novo sistema estará totalmente implantado com exceção da tributação do destino que se estenderá de 2029 até 2078.
A reforma é a possível dentro do contexto cultural, econômico e político do país. Ela foi viabilizada porque alguns setores com voz política no Congresso Nacional foram beneficiados e porque os custos e benefícios foram estendidos e se tornarão difusos ao longo do extenso período de transição. Não existe a reforma ideal. Não vai atender a todos os interesses corporativos e dos entes federativos, mas é necessária para o Brasil. Terá um longo processo de transição sujeito a ajustes no seu curso, mas é essencial para modernizar o país.
Jorge Jatobá, Doutor em Economia. Professor Titular da UFPE, Ex-Secretário da Fazenda de Pernambuco e Sócio da CEPLAN-Consultoria Econômica e Planejamento