OPINIÃO

Mudança na regra dos 80-20 para as eleições de 2024

A decisão do STF corrige grande parte da legislação vigente, em boa hora impugnada, está em harmonia com a lógica do sistema proporcional, valoriza o pluralismo político-partidário e preserva a vontade do eleitor.

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MAURÍCIO ROMÃO

Publicado em 02/03/2024 às 0:00 | Atualizado em 02/03/2024 às 9:45
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Por maioria de votos (7 x 4) o Plenário do STF, na sessão do dia 28/02/2024, considerou inconstitucional a aplicação das cláusulas de desempenho instituídas pela Lei 4.211/21 e Resolução TSE 23.677/21 na última fase da distribuição das sobras eleitorais nas eleições proporcionais, a chamada fase da "sobra das sobras".

A introdução de tais cláusulas no novel regramento objetivava evitar acesso ao Parlamento de partidos e candidatos com votações insignificantes e, para tanto, estatuiu-se a "regra dos 80-20": somente poderão concorrer às sobras de voto partidos ou federações com votação de pelo menos 80% do quociente eleitoral (QE) e que seus candidatos obtenham votos de no mínimo 20% desse QE.

No processo de alocação de vagas parlamentares entre os partidos que concorrem às eleições proporcionais, na referida fase, também conhecida como "fase da repescagem", a legislação impunha a restrição de que se houvesse vagas remanescentes não preenchidas nas fases anteriores elas seriam ocupadas apenas pelos partidos ou federações que atingissem a cláusula 80% do QE (o requisito de 20% do QE é flexibilizado).

Na decisão proferida, o Plenário do STF invalidou tal impedimento e entendeu que a exigência da cláusula de desempenho na última fase da distribuição de vagas inviabilizaria a ocupação de lugares no Parlamento por partidos pequenos e por candidatos que tenham votação expressiva.

Dessa forma, o colegiado legislou no sentido de democratizar o acesso à última fase de distribuição das sobras de voto a todos os partidos ou federações, nicho antes reservado às siglas que lograram cumprir os requerimentos de desempenho.

A Corte Máxima definiu, ainda, por margem apertada (6 x 5), que a decisão terá efeitos ex-nunc, sendo aplicada daqui para frente, incluindo as eleições de 2024, não tendo impactos no resultado do último pleito proporcional e, portanto, preservando os mandatos de sete deputados federais ameaçados de perdê-los caso a modulação retroagisse.

À luz da evidência empírica das eleições de 2022 detectam-se inúmeras distorções derivadas da Lei 14.211 no que concerne à fase da sobra das sobras, em particular, a que suscita a possibilidade de surgimento de Parlamentos com todas as cadeiras ocupadas por poucos partidos, normalmente os maiores, e até mesmo por apenas um, o que configuraria o aparecimento de inconcebíveis legislativos unipartidários.

Nesta mesma senda, a norma em vigência implica em expressivo descarte de votos consignados a partidos e candidatos, ademais de ensejar ascensão ao Parlamento de candidatos com votações inexpressivas (contrariando, paradoxalmente, a lógica que sustentou o estabelecimento da regra dos 80-20).

A decisão do STF corrige grande parte da legislação vigente, em boa hora impugnada, está em harmonia com a lógica do sistema proporcional, valoriza o pluralismo político-partidário e preserva a vontade do eleitor.

Maurício da Costa Romão,  Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. mauricio-romao@uol.com.br

 

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