EDUCAÇÃO

A radiografia da educação básica

Confira o artigo assinado por Mozart Neves Ramos

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MOZART NEVES RAMOS

Publicado em 03/03/2024 às 14:19 | Atualizado em 03/03/2024 às 14:54
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Por Mozart Neves Ramos

Na última quinta-feira, dia 22 de fevereiro, o Ministério da Educação apresentou os dados do Censo Escolar de 2023, trazendo informações relevantes sobre todas as etapas e modalidades escolares da educação básica em nosso país. O Censo é um instrumento estratégico para a boa gestão pública no campo da educação, pois permite a tomada de decisões com base em pesquisas e evidências. Traz não somente os dados da fotografia do momento, mas também o “filme” do que ocorreu nos últimos anos, em particular com relação ao acesso, à permanência e à conclusão escolar, além daqueles relativos ao professor.

A sensação que temos é de que o Brasil começa a se recuperar da pandemia em relação às matrículas – ou seja, ao acesso escolar. A primeira boa notícia veio da educação infantil. Houve um crescimento importante na creche e na pré-escola. O país tem cerca de 4,1 milhões de crianças de até 3 anos matriculadas em creches, faltando ainda 900 mil para alcançar a meta proposta no Plano Nacional de Educação (PNE).

Trata-se de um esforço importante que o país precisa fazer, mas, por outro lado, o Brasil praticamente universalizou a matrícula na pré-escola – são quase 5,3 milhões de crianças de 4 a 5 anos matriculadas, bem próximo do tamanho dessa faixa etária em nosso país, que, segundo o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é de 5,4 milhões.

No ensino fundamental, o país tem hoje cerca de 26,1 milhões de matrículas. Para os anos iniciais dessa etapa escolar (do 1° ao 5° ano), as redes municipais são as principais responsáveis pela oferta de cerca de 10 milhões de matrículas; para os anos finais (do 6° ao 9° ano), por sua vez, as matrículas são em larga maioria do setor público – quase meio a meio entre as redes municipais e estaduais. Já no ensino médio, de maior responsabilidade dos estados, há cerca de 7,7 milhões de estudantes matriculados, o que representa uma ligeira queda de 2,4% em relação a 2022, como aponta a matéria publicada pela Assessoria de Comunicação Social (ACS) do Inep.

O Censo também mostrou que há cerca de 9 milhões de jovens de 18 a 29 anos que não concluíram a educação básica – isso representa um país do tamanho do Uruguai mais Paraguai juntos. Além de impactar diretamente a produtividade do Brasil, isso traz graves problemas sociais.

A larga maioria certamente contribui para engrossar a taxa de jovens que nem estudam e nem trabalham –são cerca de 13 milhões de brasileiros nessa condição. Há uma forte correlação entre essa taxa e aquela relativa a homicídios juvenis.

A boa nova relacionada à nossa juventude foi o crescimento das matrículas no ensino técnico profissionalizante, tão importante para que o jovem possa ascender ao mundo do trabalho após a conclusão de seu ensino médio. Não custa lembrar que, de cada 100 jovens concluintes, apenas 22 vão para o ensino superior. Assim, torna-se estratégico para o desenvolvimento do país pensar nos 78 que vão precisar estar preparados para atividades laborais, para não “baterem no teto” ao término do ensino médio – e uma das consequências disso é entrar na ociosidade, com tudo de ruim que isso traz.

Por fim, outro ponto que nos chamou a atenção foi o elevado percentual de professores contratados como temporários. O levantamento mostra que as redes estaduais de ensino do país têm 690.406 professores, sendo 51,6% deles contratados de forma temporária. Os docentes contratados por concurso, portanto efetivos nos cargos, são apenas 46,5% do total. Os dados mostram que a maioria das redes estaduais de ensino já trabalha com mais professores temporários do que efetivos. A situação ocorre em 15 das 27 unidades da Federação. Isso compromete qualquer política relativa à formação continuada de professores, e consequentemente os resultados da aprendizagem escolar, já que o professor qualificado é o fator intraescolar mais importante para isso.

Espera-se assim que esses dados do Censo Escolar possam estimular os gestores públicos a tomar decisões cada vez mais respaldadas em pesquisas e evidências, pois, no atual cenário no qual estamos vivendo, não cabe mais que elas sejam pautadas em achismos.

Mozart Neves Ramos é titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira da USP de Ribeirão Preto e professor emérito da UFPE.

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