OPINIÃO

As torcidas organizadas

É muito claro que os clubes alimentam as torcidas, gerando nelas um sentimento de pertencimento que as legitima a agir como bem entenderem

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JOÃO HUMBERTO MARTORELLI

Publicado em 07/03/2024 às 0:00 | Atualizado em 07/03/2024 às 10:02
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Não estou mais, nem quero estar ligado ao futebol, mas a cidadania impõe que me manifeste.

As torcidas organizadas violentas são basicamente um problema primário de segurança pública, cabendo ao Estado, por intermédio de suas instituições, prevenir e coibir as ações violentas. Uma constatação que se deve fazer aqui, particularmente no caso de Pernambuco, é que as instituições têm atuado: a) o Ministério Público denunciou infratores e propôs uma ação civil pública para extinguir as torcidas organizadas dos 3 grandes clubes, b) o Poder Judiciário proferiu sentença extinguindo-as, e c) a Polícia Civil e a Polícia Militar, no âmbito de suas atribuições, já fizeram diversos trabalhos de inteligência e sempre põem seu aparelho repressivo para funcionar; a própria governadora se envolveu recentemente no assunto. Então, é de se perguntar, por que as torcidas organizadas, apesar da repressão do aparelho estatal e da ampla repulsa da sociedade civil, continuam existindo e protagonizando deploráveis episódios de violência?

Para mim, parece óbvio que elas se nutrem do acolhimento que recebem nos clubes. À parte considerações sobre as causas da violência, mais apropriadas em um estudo de psicologia das massas, é muito claro que os clubes alimentam as torcidas, gerando nelas um sentimento de pertencimento que as legitima a agir como bem entenderem sob sua proteção. As torcidas usam os símbolos dos clubes sem pagar royalties, têm lugar cativo e destacado nos estádios para assistirem aos jogos, recebem ingressos gratuitos ou subsidiados e ajudas de viagem para acompanhar os clubes nos jogos fora da sede, algumas têm local reservado nas dependências do clube para guardar bandeiras e instrumentos diversos, são saudadas pelos jogadores com a mais absoluta alegria e intimidade, bastando ver que eles celebram o gol fazendo os símbolos das torcidas. E o fato é que têm poder político, ajudando o Presidente a se eleger ou a eleger seus sucessores e membros de seu grupo. No Sport, estima-se que a odiosa Torcida Jovem tenha 500 votos, o que, num colégio que é de 4.000 eleitores, é bastante significativo.

Sem prejuízo das ações indispensáveis de segurança pública, o clube tem papel decisivo e definitivo na extinção da violência das organizadas, estrangulando-as, tendo a coragem de acabar com a promiscuidade insidiosamente disfarçada pelos dirigentes - que vivem de caso, ora público e sem vergonha, ora clandestino, com elas. Algumas ações importantes na estratégia, entre outras: 1 - o Presidente deve romper publicamente com a torcida organizada e condenar seus atos; 2 - o Conselho deve excluir todos os integrantes da organizada dos quadros sociais; 3 - proibição de acesso dos membros da organizada às dependências do clube e aos jogos de futebol, afixando-se nos portões de entrada as fotos dos principais líderes; 4 - introdução nas regras estatutárias de absoluta repulsa às organizadas (o Sport está confeccionando um novo estatuto; se dele não constar o banimento da Torcida Jovem, assim, nome aos bois, será uma decepção); 5 - proibição de jogador saudar e manter relações com a organizada.

O Ministério Público e o Poder Executivo têm o dever de exigir essas ações dos clubes, se querem ir até o fundo da questão e acabar com esse câncer, que já matou muita gente, e vai matar mais.

João Humberto Martorelli, advogado

 

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