O inferno astral de Lula
Dono de um imenso capital político vindo de seu primeiro mandato presidencial, colhe agora os efeitos de uma sucessão de erros nacionais e internacionais que, após 14 meses de sua posse, cobram o seu preço de forma cavalar.
Na astrologia, "inferno astral" é tido como um período de turbulências, em geral observado na fase anterior ao aniversário de nascimento. Uma fase ruim da qual, acreditam os astrólogos, ninguém pode se furtar. Na política, convencionou-se a assim batizar um período de maré baixa, em que tudo dá errado, jogando a aprovação dos governantes para debaixo do tapete. Com uma diferença básica: alguns são levados a isso por força das circunstâncias sobre as quais não puderam intervir, e outros porque, diante das intempéries, não souberam lidar com elas ou até ajudaram a cavar o poço no qual se meteram.
Eleito em 2022 com a promessa de pacificar o país, saído de um conturbado governo Bolsonaro, o presidente Lula parece perfeitamente enquadrado na segunda categoria. Dono de um imenso capital político vindo de seu primeiro mandato presidencial, colhe agora os efeitos de uma sucessão de erros nacionais e internacionais que, após 14 meses de sua posse, cobram o seu preço de forma cavalar. Esta semana a pesquisa Quaest mostrou que a aprovação do presidente é hoje de 51%, cinco pontos apenas acima da desaprovação que é de 46%.
Considerando que a eleição presidencial terminou quase empatada - Lula teve apenas 2% a mais de votos do que Bolsonaro - observa-se que, apesar de todo o desgaste do ex-presidente, acusado de tramar um golpe de estado e na iminência de ser preso, Lula continua no mesmo lugar, patinando numa polarização que ele próprio tem estimulado, desde que assumiu o cargo. O Ipec mostrou situação ainda pior esta sexta-feira.No levantamento do Instituto a avaliação positiva do Governo (ótimo e bom) caiu de 38 para 33% de dezembro para cá e a negativa (ruim e péssimo) subiu de 30 para 32%.
Para completar, apesar e ter cedido ao Centrão um poder maior do que o próprio grupo almejava, o Governo perdeu esta quarta-feira o controle de algumas das principais comissões da Câmara dos Deputados para a nata do bolsonarismo. Partido que elegeu maior número de parlamentares, o PL de Bolsonaro, deu de ombros aos apelos do PT para que escolhesse presidentes das comissões pessoas menos radicais, e elegeu quem quis como a deputada Caroline de Toni(PL-SC) para presidente da poderosa Comissão de Constituição e Justiça; o deputado performático e homofóbico Nikolas Ferreira (PL-MG) para presidir a comissão de Educação; o pastor Eurico (PL-PE) para comandar a Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família, na qual são discutidas as pautas de costumes; e o deputado Alberto Fraga (PL-DF), integrante da chamada "bancada da bala", para presidir a Comissão de Segurança Pública.
O que está acontecendo com Lula? Esta é a maior indagação que paira hoje sobre as cabeças pensantes da Nação. Petistas enciumados já chegaram a colocar a culpa na primeira dama Janja da Silva e em Celso Amorim, o porta-voz internacional do presidente, mas, seja de quem for a influência, se é que ela existe, na verdade Lula tem colocado os pés pelas mãos em quase todo lugar onde se mete. Em 2023 passou 62 dias fora do país enquanto o ministro da fazenda Fernando Haddad patinava na condução da economia. Mas não logrou o êxito pretendido no cenário internacional e só acumulou mais problemas. Foi visto como simpático à Russia que invadiu a Ucrânia e até hoje ameaça dominar o país vizinho e, recentemente, no que foi citado como o maior erro de sua trajetória política, comparou o ataque de Israel aos terroristas do Hamas em Gaza ao Holocausto em que Hitler eliminou mais de 6 milhões de judeus. O ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e Itália, Rubens Ricúpero, disse que, em relação aos conflitos Ucrânia/Russia e Israel/Hamas, o presidente adotou uma posição que chama de "absurda por colocar o país agredido e o agressor no mesmo patamar". Ninguém esperava por isso.
Por essas e outras Lula está hoje proibido de entrar em Israel, país que lhe outorgou o desonroso título de "persona non grata", e esta semana estarreceu mais uma vez ao aprovar a postura do atual presidente da Venezuela, Nícolas Maduro, que afastou das eleições, que Lula chama de "democratas", sua principal opositora, Maria Corina Machado, e mantém presos mais de 300 opositores.
Principal líder de um partido como o PT que prega a inclusão social e a paridade de gênero, Lula, que não pode participar das eleições de 2018 porque estava preso sob suspeita de corrupção, sugeriu a Maria Corina que, ao invés de ficar chorando, fizesse como ele e indicasse alguém para substituí-la no pleito. De pronto, recebeu dela, que nunca respondeu a processos, uma resposta que faria corar qualquer homem que dê a atenção devida às mulheres: "Eu chorando, presidente Lula, o sr está dizendo isso porque sou mulher? Você não me conhece. Estou lutando para fazer valer o direito de milhões de venezuelanos que votaram em mim nas primárias e dos milhões que têm o direito de fazê-lo em eleições livres nas quais derrotarei Maduro. Você está validando os abusos de um autocrata que viola a Constituição e o Acordo de Barbados que afirma apoiar. A única verdade é que Maduro tem medo de me confrontar porque sabe que o povo venezuelano está na rua comigo".
Por mais esse vexame o presidente não precisaria passar, caso estivesse se conduzindo como o líder internacional que se propôs a ser logo após a sua posse. A promessa foi, até agora, em vão.