OPINIÃO

A remição da pena pelo trabalho e pela educação

É hora de o Brasil acordar e fazer cumprir a Lei de Execução Penal de 1984.

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Adeildo Nunes

Publicado em 14/03/2024 às 0:00 | Atualizado em 14/03/2024 às 15:22
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Quando a Lei de Execução Penal (nº 7.210) entrou em vigor, em 1984, o legislador previu a possibilidade de o preso, condenado, remir a pena fixada na sentença penal condenatória, estipulando que para cada 3 (três) dias de trabalho, haveria de ser computado 1 (um) dia de cumprimento da sanção penal, através de decisão do Juiz de Execução Penal. Na visão do legislador originário, o trabalho do preso serviria como estímulo no sentido de conter a ociosidade prisional, sem contar que com a realização de tarefas laborativas, seria mais fácil profissionalizar aqueles que chegam à prisão sem nenhuma qualificação.

Nesse sentido, vale lembrar que cerca de 80% dos que ingressam em nossos estabelecimentos carcerários não têm uma profissão definida, daí a importância do trabalho prisional para a profissionalização do reeducando, mormente porque ela será essencial ao final do cumprimento da pena, provocando uma série de benefícios para o ex detento e para os seus familiares, já que uma renda mensal pelo trabalho em muito contribui para que o recluso não volte a delinquir, evitando o cometimento de novos crimes contra o patrimônio, principalmente.

No texto original, ainda hoje em vigor, somente aqueles que estejam cumprindo a pena em regime fechado e semiaberto estavam autorizados a exercer o trabalho, dentro ou fora do presídio, que aliás deve ter uma remuneração mínima de ¾ (três quartos) de um salário-mínimo, a cargo do tomador dos serviços, sem quaisquer descontos previdenciários ou sociais, porque o labor carcerário não gera relação de emprego, até que a pena seja extinta pelo seu cumprimento. Para a Lei de Execução Penal, o trabalho do condenado, como dever social e dignidade humana, também tem a finalidade de educar e de produzir, o que é uma realidade. Porém, insisto, o mais importante do trabalho prisional é a profissionalização do recluso, não importando o tipo de profissão almejada e o fim na ociosidade prisional, que é desastrosa.

O trabalho do condenado, por outro lado, pode ser realizado dentro do ambiente prisional ou fora dele. É evidente que os que cumprem o regime fechado, as suas atividades devem ser realizadas no âmbito da prisão em que se encontram cumprindo a pena. Todavia, estando o apenado em regime semiaberto, nada impede que ele seja consumado fora da prisão, mas com ordem judicial. A lei não autoriza o uso do monitoramento eletrônico para o trabalho externo, embora algumas decisões judiciais exijam este tipo de controle, que só é obrigatório nas saídas temporárias e na prisão domiciliar. A jornada de trabalho do apenado, entretanto, não pode ser inferior a 6 (seis) horas e nem superior a 8 (oito).

Hoje, se sabe, que o trabalho prisional é um direito do preso e uma obrigação do Estado. Contudo, nas prisões brasileiras somente 20% dos condenados desenvolvem uma atividade laboral. Os Estados alegam falta de recursos financeiros para implementá-lo, mas não custa nada lembrar que a Lei de Execução Penal autoriza a realização de convênios com entidades públicas ou particulares, nesse sentido. O trabalho externo, por oportuno, geralmente é realizado em empresas particulares, mercê da ausência de vínculo empregatício e sem obrigações sociais. Se o condenado descumprir quaisquer das obrigações estipuladas, poderá haver a sua revogação, mediante decisão judicial.

No tocante à remição pela educação, ela foi introduzida no Brasil com o advento da Lei Federal nº 12.433, de 2011, que autorizou a remição da pena para aqueles que desenvolvam quaisquer atividades educativas, dentro ou fora da prisão, seja o preso provisório ou já condenado, estendendo o benefício para os que estejam em regime aberto, liberdade condicional e até em prisão domiciliar, ficando estabelecido que para cada 12 (doze) horas de atividades, 1 (um) dia de cumprimento da pena. Imaginando que o preso tenha concluído um curso fundamental, médio ou superior, caberá um acréscimo de 1/3 (um terço) ao tempo de remição, a ser declarado pelo Juiz de Execução Penal.

Entretanto, se o preso, após declarada a remição - pelo exercício do trabalho ou pela educação - vier a cometer uma falta disciplinar grave, pode o Juiz revogar o equivalente a 1/3 (um terço) do tempo total de remição, como punição pela indisciplina cometida.

Na atualidade, embora sem previsão legal, a remição pelo trabalho ou pela educação deve beneficiar, indistintamente, todos os presos provisórios (com prisão preventiva) e os condenados em qualquer regime prisional, bem como aqueles que estejam recolhidos em prisão domiciliar e, por fim, os que estejam em livramento condicional.

Se o Estado disponibilizasse o trabalho e a educação para todos os reclusos, certamente haveria uma redução na criminalidade, porque enquanto o trabalho profissionaliza, a educação é a base para a preservação da dignidade humana. Depois de cumprida a pena, com evidência, o preso teria a oportunidade de viver com dignidade e perseverança. Sem isso, jamais diminuiremos a nossa população carcerária e nem tampouco reduziremos o crime. É hora de o Brasil acordar e fazer cumprir a Lei de Execução Penal de 1984.

Adeildo Nunes, juiz de Direito aposentado, professor, doutor e Mestre em Direito de Execução Penal, Membro do Instituto Brasileiro de Execução Penal - IBEP

 

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