OPINIÃO

Velhos medalhões deambulam na nova política

A espetacularização da política, fenômeno que se mostra irreversível a partir do adensamento das mídias digitais, exigirá dobrado esforço dos velhos medalhões para acompanharem esse ritmo frenético.

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OTÁVIO SANTANA DO RÊGO BARROS

Publicado em 16/03/2024 às 0:00 | Atualizado em 17/03/2024 às 8:50
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Como os "políticos modernos" usam metáforas futebolísticas para justificar suas ações, nada melhor que adequar-me às quatro linhas do gramado (sintético ou de grama) para comentar o cenário político-partidário por aqui.

Essa semana ocorreram vários jogos da Copa do Brasil, a meu juízo o torneio mais democrático no país, já que times grandes e pequenos, do Norte e do Sul, milionários e famélicos se digladiam sob regras que quase os iguala a despeito de tudo.

Em sua maioria, os times grandes prevaleceram sobre as camisas desconhecidas. Mas não sem sustos e até com o sofrimento de terem que vencer na loteria dos pênaltis.

Em algumas partidas, as equipes recheadas de novos medalhões reencontraram velhos medalhões em fase terminal a defender modestas agremiações. Abraços, reminiscências, desejos de boa sorte e um até logo sem compromissos.

Alguns desses velhos medalhões, moídos de tantas contusões ao longo da carreira, deram o máximo de seus corpos enrijecidos para fazerem bonito junto à sua torcida e quem sabe ainda serem lembrados por outro clube mais forte.

Esperança quase impossível de realizar-se. O fôlego só lhes durou meros quinze minutos de uma corrida deambulante, na qual a perna pesada mal conseguia dar um chute com precisão e a vitalidade de anos atrás se restringia a gritos esganiçados com o juiz, com os jogadores mais novos de seu time e com o técnico receoso de substituí-lo pelo peso de seus nomes.

Esses medalhões ainda defendem o rígido sistema 4-2-4, com laterais que não avançam, centroavantes parados no meio da área e meio-campistas que fazem longos lançamentos.

Muita semelhança com as quatro linhas da política nacional, que se encontra em acelerada decadência, refém de velhos sistemas patrimonialistas e superadas lideranças que vivem de um passado de glória, sendo incapazes de se ajustarem ao moderno e dinâmico ambiente de agora.

O poder inebria, corrompe, destrói e chega a ser afrodisíaco como afiançava Kissinger. A força absolutista que essas velhas lideranças tinham no passado e que ainda pensam desfrutar vai aos poucos escorrendo entre os dedos frágeis e retorcidos pela artrose, heranças de muitas disputas pelo cetro nas pelejas eleitorais.

Por mais que a longevidade seja sinônimo de experiência, ela também é sinônimo de fragilidade. E quanto mais longevas e débeis essas lideranças, mais absolutas elas tendem se tornar.

Oliver Cromwell, liderança inglesa do século 17 que desafiou a monarquia e enfrentou a teoria do direito divino, afirmava que "não há hábito mental mais perigoso ou imoral do que a santificação do sucesso".

Os nossos medalhões se acostumaram à santificação de seus sucessos. Querem ser monarcas ungidos por um deus que eles controlam e, em consequência, lhes aprova as decisões, mesmo as mais risíveis e perigosas.

Eis a razão pela qual eles não desistem. Não abdicam em nome de novos jogadores e novos esquemas. E se autoajudam na manutenção do status quo.

Não imaginam "laranjas mecânicas" - que time espetacular tinha a Holanda de Johan Cruijff! - que possam surpreender e vencer os novos desafios. Preferem o arcaico 4-2-4, crendo que chegarão a novos êxitos pelos mesmos desgastados caminhos.

Todavia, os tempos modernos têm sido implacáveis com essas posturas inflexíveis. A espetacularização da política, fenômeno que se mostra irreversível a partir do adensamento das mídias digitais, exigirá dobrado esforço dos velhos medalhões para acompanharem esse ritmo frenético.

E a ampulheta do tempo não lhes é favorável. Inevitável, uma nova dinâmica das relações institucionais e interpessoais está posta e a eles e nós impacta vigorosamente.

Apesar disso, medalhões cansados ainda jogam e se mostram importantes no campo de nossa política. Alguns, pela ciclotimia dos interesses, são ressuscitados do ostracismo, escalados para papéis de estrelas na peça republicana.

Mesmo assim, fica cada dia mais evidente que somente novos jogadores, dinâmicos e preparados, que se adaptem a esquemas modernos, que acalmem o elenco, que distribuam eficientemente a bola e que tenham senso de união, serão capazes de controlar e orientar o país, estados e municípios no rumo da paz e bem-estar sociais.

Precisaremos contratá-los já na próxima janela de transferências: as eleições municipais.

Otávio Santana do Rêgo Barros, general de Divisão da Reserva

 

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