OPINIÃO

Os netos estão com a carga toda

A propósito, a pilha dos netos ainda está com a carga plena. Vou ter que tomar um relaxante muscular para enfrentar a jornada da tarde. E estou apenas no primeiro dia dessas férias...

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OTÁVIO SANTANA DO RÊGO BARROS

Publicado em 30/03/2024 às 0:00 | Atualizado em 04/04/2024 às 14:55
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Terça-feira passada (26.03.24), o Centro de Comunicação Social do Exército (CComSEx) comemorou quarenta e três anos de sua criação.

A organização tem como principal missão assessorar diretamente o Comandante na condução da comunicação estratégica e operacional da força terrestre, em um contexto moderno de relações institucionais.

Na cerimônia alusiva à data, compareceram muitas autoridades civis e militares, com destaque para o próprio Comandante do Exército, General Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva.

Como antigo chefe daquele órgão, participei dos festejos, tendo a oportunidade de encontrar alguns profissionais de imprensa com os quais troquei percepções sobre o Brasil e o Mundo de hoje.

Um deles, chefe de redação de uma emissora de TV, demonstrou sustentada preocupação com a conjuntura atual, divisiva e cada dia mais radical, asseverando a necessidade de a sociedade se fechar em copas, unindo-se para a fiscalização e, ao mesmo tempo, proteção das instituições que conformam o Estado brasileiro.

Alegou ainda que há dificuldade dessa mesma sociedade em distinguir os equívocos cometidos por agentes públicos e privados, ao mesclar CNPJ e CPF como uma única entidade.

Foi um papo sério, mas suficientemente descontraído para que trocássemos chistes e terminássemos esperançosos com a situação de momento.

Disse-lhe que para tudo isso havia uma vacina sensacional, descoberta há séculos e que até hoje tem eficácia de 100% para gente de minha faixa etária: brincar com netos sem a responsabilidade de controlá-los.

Dileto leitor, quando você estiver lendo este pequeno texto, provavelmente estarei sentado no chão, rodeado de brinquedos, montando bonecos de lego ou ajudando a colocar pecinhas nos brinquedos de encaixe. Será a enésima dose da vacina de felicidade que tanto propago: brincar com os netos.

A energia que deles emana, temperada com a inocência da tenra idade, enche-nos de esperanças por dias melhores. Afinal, como diz um sábio chefe militar: as gerações se sucedem, se renovam, se aperfeiçoam e se fortalecem.

Há algum tempo, tenho insistido em defender a necessidade de renovação da cultura social que rege nossa coletividade. Uma renovação que deve começar imperativamente com as lideranças, em particular com as lideranças políticas.

Entendo que somente a energia natural dos mais jovens, detentoras de baterias de carga plena, poderá ajudar encontrarmos o rumo seguro para um futuro de menos sobressaltos.

E enquanto essas lideranças estiverem alinhadas com o firme propósito de bem servir a todos e não apenas aos que vestem o mesmo uniforme de sua agremiação, enquanto elas viverem para a política e não da política (lembrando Max Weber ao qualificar o político de profissão) serão a solução de mais eficácia.

Todavia, boas lideranças com ineptos liderados dão resultante zero.

Portanto, será impositivo enfrentar também o desafio de promover junto a todos os cidadãos o atributo da disciplina intelectual - conceito militar que advoga unidade de esforço para atingimento de um objetivo, após a decisão final da liderança.

Afinal, tomando Bobbio como referência, o regime democrático entende-se primariamente por um conjunto de regras de procedimentos para a formação de decisões coletivas, desde que estejam previstas e facilitadas a participação mais ampla possível dos interessados.

Decisões coletivas que serão construídas e certificadas pela maioria da população, seja através de seus representantes políticos, seja diretamente pelo próprio interessado, tal qual em uma ágora.

Na cultura social que hoje vivemos, há muita dificuldade dos vencidos em aceitar a decisão da maioria.

E, em tempos de tanta divisão, com a democracia tornando-se figura de linguagem e precisando ser adjetivada para ser clara ao cidadão comum, a atitude esperada do bom democrata agora é a de não se iludir com o melhor e não se resignar com pior, e, primordialmente, atuar para mitigar as fricções da sociedade.

A propósito, a pilha dos netos ainda está com a carga plena. Vou ter que tomar um relaxante muscular para enfrentar a jornada da tarde. E estou apenas no primeiro dia dessas férias...

Feliz e abençoada Páscoa!

Otávio Santana do Rêgo Barros, general  de Divisão da Reserva

 

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