OPINIÃO

As duas portas da vida

Tempo de plantar, tempo de colher, este um preceito bíblico. Porém, falta ao Homem a consciência do bem

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ROBERTO PEREIRA

Publicado em 07/04/2024 às 5:00
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Recorro à clássica e extraordinária Oração aos Moços, de Rui Barbosa, quando, num dos seus parágrafos, assim professou: - A vida não tem mais que duas portas: uma de entrar, pelo nascimento; outra de sair, pela morte. Ninguém, cabendo-lhe a vez, se poderá furtar à entrada. Ninguém, desde que entrou, em lhe chegando o turno, se conseguirá evadir à saída. E, de um ao outro extremo, vai o caminho, longo ou breve, ninguém o sabe, entre cujos termos fatais se debate o homem pesaroso de que entrasse, receoso da hora em que saia, cativo de um e outro mistério, que lhe confinam a passagem terrestre.

Aí está, talvez, a filosofia da vida e a inevitável fatalidade da morte.
Todavia – todavia! -, nesta reflexão importa a trajetória que cada qual traça com o livre arbítrio entre o bem e o mal.

Colimada com esse pensamento está Cora Coralina: “O que vale na vida não é o ponto de partida e sim a caminhada. Caminhando e semeando no fim terá o que colher.”

Tempo de plantar, tempo de colher, este um preceito bíblico. Porém, falta ao Homem a consciência do bem, haja vista a sofreguidão dos que nascem, vivem e morrem sem um provimento de alma, para recordar o filósofo Bergson.

Veio do advogado carioca, Francisco Otaviano, poeta e um dos patronos da ABL, escrever o poema Ilusões da Vida a seguir descrito: “quem passou pela vida em branca nuvem / Em pleno plácido repouso adormeceu: / quem não sentiu o frio da desgraça, / Quem passou pela vida e não sofreu. / Foi espectro – não foi homem, / Só passou pela vida – não viveu.”

Este século, vaticinado como sendo da tecnologia, diante de tanta barbárie, deixa-nos estarrecidos. Viva Pascal: “A pouca ciência afasta de Deus. A muita, aproxima.”

Campeia, entretanto, a violência. A vida banalizada. A corrupção, entre os homens públicos, enlameando o ideário de servir às causas sociais sem delas se servirem.

O homem estigmatizado em lobo do próprio homem. Ambição e estupidez. Inveja e desamor. Rareia, cada vez mais, a caridade. Não me refiro à caridade que se pensa fazer dando esmolas a mendigos que se profissionalizaram, muitos destes, no peditório das ruas.

Refiro-me à caridade como expressão do amor. Do amor ao próximo, aquele a quem Deus mandou que amássemos como a nós mesmos, como uma das lições desta Semana Santa e deste domingo de Páscoa.

Segundo Dom Bosco, “Deus nos colocou no mundo para os outros.” Entretanto, essa disponibilidade do “eu” cada vez mais “eu” e do “nós” cada vem menos “nós”, parece sobrelevar-se às pessoas, à índole de cada um, como se o escorpião sempre tivesse que que sacar do seu veneno em atos de traição e de covardia, como na fábula de Esopo.

Morreram os dois: o escorpião e a rã, “antes a morte que tal sorte,” pensou, preferindo mesmo, nas profundezas da água, meter-lhe o ferrão, ante a exclamação da rã: “agora, vamos morrer nós dois.” O escorpião sorriu sarcasticamente e, pedindo-lhe escusas, arrematou: “desculpe, mas não pude evitar. Essa é a minha natureza.”

O homem parece nostálgico de Deus, do paraíso perdido. Não existe o amor, sentimento que, segundo Dante, é capaz de mover o sol e as outras estrelas.

“Não somos seres humanos tendo uma experiência espiritual. Somos seres espirituais tendo uma experiência humana,” bela conclusão de Pierre Teilhard de Chardin.

Assim, essa experiência, longa ou breve, remete-nos ao ponto futuro, à eternidade. Importa lembrar aos incautos: é no juízo final que seremos julgados, cada qual caçador de si mesmo, acusando-se dos males praticados, da insensatez e da ambição.

Por isso, onde as sandálias do pescador? Qual o porquê para tanta soberba? A briga pelo poder que, segundo Camus, é triste. Triste e efêmero. Enganoso. A luta pelas conquistas do vil metal. Onde a palavra que consola e o gesto que afaga?

‘Falta-nos uma preparação para a vida, refiro-me à vida terrena. Deus existe, incrédulos! Existe e, segundo, Einstein, não joga dados.

Com ele não há a probabilidade dos acertos. Concluamos com Ayrton Senna: “Deus é forte, / Ele é grande, / e quando Ele quer / não tem quem não queira.”

Roberto Pereira, ex-secretário de Educação e Cultura de Pernambuco e membro da Academia Brasileira de Eventos e Turismo.

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