OPINIÃO

Por trás do lixo: os desafios da reciclagem seletiva e a segurança ocupacional dos garis

As políticas voltadas para modernização do sistema de coleta, minimização da exposição laboral, envolvimento comunitário e fiscalização efetivas, são passos promissores para o futuro desta nobre profissão, essencial na cadeia mantenedora do equilíbrio e desenvolvimento de qualquer sociedade.

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HEITOR VERAS DE SOUSA

Publicado em 05/06/2024 às 0:00 | Atualizado em 05/06/2024 às 11:07
Notícia

O princípio dos 3 Rs — Reduzir, Reutilizar e Reciclar — formam a base de uma gestão de resíduos sustentável e eficaz, essenciais para minimizar o impacto ambiental das atividades humanas. O primeiro R, Reduzir, foca na diminuição da quantidade de resíduos gerados, incentivando um consumo mais consciente e a escolha de produtos com menor impacto ambiental. Este princípio é considerado o mais efetivo, pois atua na raiz do problema ao evitar a geração de resíduos. Em seguida, Reutilizar consiste em encontrar novas funções para objetos que, de outra forma, seriam descartados, prolongando sua vida útil e reduzindo a necessidade de produção de novos itens. Esse processo não apenas poupa recursos naturais, mas também economiza energia. Por fim, Reciclar transforma materiais usados em novos produtos, processando resíduos de maneira a reintroduzi-los no ciclo produtivo. A reciclagem ajuda a conservar recursos, diminuir emissões de gases de efeito estufa e reduzir a poluição. A aplicação integrada desses três princípios potencializa a proteção ambiental e promove uma economia mais circular e sustentável.

A reciclagem seletiva e a segurança ocupacional dos garis são temas cruciais para o desenvolvimento sustentável e a saúde pública. Enquanto a separação e o reaproveitamento de resíduos oferecem uma resposta vital para a gestão ambiental, os trabalhadores encarregados desta tarefa enfrentam diariamente riscos significativos. É conquista desta classe de profissionais desenvolver suas atividades perante inúmeros desafios enfrentados por eles em seu ambiente de trabalho. O envolvimento da comunidade e sistemas de gestão pública são cruciais no desenvolvimento e implementação de soluções para melhorar a segurança desses trabalhadores e a eficiência dos processos de coleta seletiva, visando a proteção do meio ambiente e a promoção da saúde pública. Ao separar materiais recicláveis do restante do lixo, minimiza-se o volume de resíduos enviados para aterros e incineradores, reduzindo a poluição e o consumo de recursos naturais.

Em dimensões regionais, a reciclagem contribui significativamente para a economia circular, criando empregos e reduzindo a dependência de matérias-primas virgens. Apesar de seus benefícios evidentes, muitas regiões ainda enfrentam baixas taxas de reciclagem, apenas cerca de 30% dos municípios brasileiros possuem programas efetivos de coleta seletiva. Essa deficiência não apenas compromete o potencial ambiental do sistema, mas também reflete a necessidade urgente de melhorar a infraestrutura e a conscientização pública sobre a importância deste processo.

Os garis, como parte essencial para a eficácia deste sistema, estão constantemente expostos a riscos significativos. O manuseio diário de resíduos expõe esses trabalhadores a materiais perigosos, como vidro quebrado, produtos químicos tóxicos e objetos cortantes. Também vale destacar a exposição a fatores de natureza ergonômica, atropelamentos, radiação solar, hidratação e alimentação. Ocorrências de acidentes de trabalho entre estes profissionais são frequentes e muitas vezes graves, destacando a necessidade urgente de implementar melhores práticas de segurança e equipamentos de proteção individual adequados.

Os resíduos industriais e hospitalares representam categorias particularmente perigosa de lixo, devido à periculosidade e alta capacidade de contaminar e disseminar doenças. Para os garis que lidam com esse tipo de resíduo, a segurança é uma preocupação primordial.

Um dos principais obstáculos para a eficiência da reciclagem seletiva no Brasil é a falta de conscientização e treinamento adequados sobre como separar e descartar com segurança as classes de resíduo. Muitos cidadãos ainda desconhecem a classificação dos materiais, quais podem oferecer perigono manuseio e como devem ser descartados, resultando frequentemente em armazenagem perigosa. Cidades que implementaram programas eficazes de educação ambiental observaram melhorias significativas na qualidade da reciclagem e na participação da comunidade. Essas iniciativas não apenas aprimoram a eficácia da coleta seletiva, mas também promovem uma maior apreciação e respeito pelo trabalho dos garis.

Para superar os desafios enfrentados na gestão destes resíduos e garantir a segurança dos garis, várias medidas podem ser implementadas: melhorar os Equipamentos de Proteção Individual, promover treinamentos regulares, modernizar a frota de coleta, ampliar campanhas de conscientização pública, fortalecer as políticas públicas e implementar parcerias entre governos, empresas e ONGs. Além disso, é crucial estabelecer sistemas de monitoramento para avaliar a eficácia das medidas implementadas e permitir ajustes baseados em feedback real dos trabalhadores e da população.

A reciclagem seletiva e a segurança dos garis são vitais para o futuro sustentável de qualquer organização social. Ao adotar medidas de aprimoramento, valorização e educação ambiental da sociedade sobre a importância de participar ativamente na autogestão de resíduos, ajudamos a não apenas cultivar um ambiente mais sustentável e propenso ao desenvolvimento, mas também a proteção e o respeito aos que cuidam dele. As políticas voltadas para modernização do sistema de coleta, minimização da exposição laboral, envolvimento comunitário e fiscalização efetivas, são passos promissores para o futuro desta nobre profissão, essencial na cadeia mantenedora do equilíbrio e desenvolvimento de qualquer sociedade.

Heitor Veras,  engenheiro ambiental especialista em Gestão e Tecnologias Ambientais (USP/SP)

 

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