Festejos juninos, arte, cultura e economia
Ouço a sanfona, o triângulo e a zabumba em tocatas que levam e elevam o baião e o forró, ensejando o xote e o xaxado, as danças das quadrilhas
O ciclo junino, depois do carnaval, é a festividade de maior apelo popular. De origem europeia, além de ser por vezes católico, por vezes pagão, alinhado ao sincretismo religioso, é emoldurado pela parte profana, mas sempre uma festa de caráter familiar e que, no Brasil, trazida pelos portugueses, acontece com maior força e beleza no Nordeste.
Ao longe a fogueira, ainda em uso, retrata emblematicamente o anúncio do nascimento de João Batista, uma promessa de sua mãe, Santa Isabel, à prima Nossa Senhora. Os balões e o espocar de fogos, perigos à vida e à preservação da natureza, persistem, apesar de proibidos, porque a tradição é forte e resistente.
Ouço a sanfona, o triângulo e a zabumba em tocatas que levam e elevam o baião e o forró, ensejando o xote e o xaxado, as danças das quadrilhas, estas cada vez mais estilizadas à falta de políticas públicas que pudessem apoiar a preservação das apresentações à maneira antiga, gritadas pelo marcador, quase sempre em francês, numa linguagem exagerada e propositadamente popular, mas gostosa de ouvir a “língua errada do povo, a língua certa do povo.”
Antes da quadrilha, o casamento no roçado, também chamado de casório caipira. O noivo, ao “fazer mal” à noiva, engravida-a, mas é levado pelo delegado e guardas à cerimônia do enlace matrimonial, sob o olhar dos pais da moça, ungido pela bênção do padre que preside a cerimônia, num ritual jocoso e cheio de chacotas, mas ameaçado pela fuga do noivo, somente evitada pela permanente vigilância dos policiais. No final, o casamento é inevitável.
Música e dança com o molejo da mulher nordestina. O forró pé de serra um encanto aos que têm ouvidos de ouvir e pernas de dançar. Nos entremeios, a gastronomia típica à base de milho, a exemplo da canjica, da pamonha, do munguzá, bolo de milho, além do pé de moleque e outras iguarias.
No Nordeste, a Chico Buarque, sem Luiz Gonzaga, as sanfonas tocam em funeral. É o momento de se homenagear, entre os crédulos, os três santos da tríade junina, Antônio, João e Pedro.
É dar vez às crendices, às preces para uma boa colheita, mas, sobretudo, às adivinhações e às orações para quem espera encontrar o seu amor, consoante a fé no santo casamenteiro Antônio, que, segundo se diz, somente atende se castigado, ora mergulhado na água, além das quadras da produção quase sempre de poetas anônimos, à semelhança de “Meu Santo Antônio querido, / Meu santo de carne e osso, / Se não me deres marido, / Não te tiro do poço.” Que saiam do poço o santo e a humana carência!
Arte e cultura, adivinhações e crendices fazem rodar a catraca da economia, haja vista o caleidoscópio das festas juninas do ano passado, alcançando uma das maiores dinâmicas, seja na economia, seja na movimentação de público dos últimos anos.
Segundo dados do Ministério do Turismo divulgados logo após as festividades dos santos Antônio, João e Pedro, além de notória preservação da cultura popular, movimentaram, segundo aquela Pasta do Turismo, mais de 26,2 milhões de pessoas e arrecadaram cerca de R$ 6 bilhões pelo Brasil afora. O número foi 76% maior do que o contabilizado no ano de 2022, ensejando, ao erário nacional, um retorno financeiro de mais de R$ 3,4 bilhões.
De norte a sul do país, o sucesso das festas juninas – embaladas pelo forró, baião, xote e xaxado, além de outros ritmos populares e da chamada cultura de chão, nos mais variados "arraiás" –, esquentando a economia nacional, gerando benefícios na cadeia produtiva do turismo e no tecido social.
Destaque-se que diversas cidades nordestinas habitualmente apresentam grandes expectativas de renda e público para este período, sendo esta a humana ansiedade para este ano em curso. Em duas das principais festas juninas do Brasil, Caruaru (PE) e Campina Grande (PB), a estimativa, para 2024, é de 5,7 milhões de pessoas curtindo as festas, o que deve movimentar mais de R$ 1,1 bilhão em arrecadação. Em nossa Petrolina (PE), por exemplo, 800 mil pessoas devem gerar R$ 275 milhões. Em Goiana, a mais nova liderança na Mata Norte, a expectativa é de que 70 mil pessoas possam gerar 32 milhões aos cofres públicos.
Entre os estados nordestinos que devem ter as maiores movimentações por causa dos festejos juninos, além de Paraíba, Pernambuco, estão ainda Sergipe, Ceará, Maranhão e Bahia – que este ano apresenta muitas atrações artísticas também na capital, Salvador.
São João nosso de cada dia, venha trazendo paz e alegria, benefícios aos cometimentos espirituais, bons fluídos e bons reflexos à economia local, à geração do turismo, paz e bem social, amém!
Roberto Pereira, ex-secretário de Educação e Cultura de Pernambuco e membro da Academia Brasileira de Eventos e Turismo.