Paralisia Cerebral, uma enorme injustiça negligenciada

As crianças com PC são em grande parte de minorias vulneráveis, de famílias que vivem na linha da extrema pobreza, de raça/cor parda ou preta

Publicado em 26/08/2024 às 6:00

A Paralisia Cerebral (PC) caracteriza-se por deficiências motoras, sensoriais e cognitivas severas, cujo neurodesenvolvimento atípico é um aspecto considerável na expressão desses sinais clínicos. Os eventos adversos envolvidos no surgimento da PC acendem uma lesão cerebral irreversível; tal lesão, incitada em diversas regiões cerebrais, confere à PC uma característica de síndrome não progressiva que, mesmo com o atributo, pode exprimir sintomas gradativos e sujeitos a agravo ao longo da vida. Sua simulação em modelos animais (que realizamos na Unidade de Estudos em Nutrição e Plasticidade Fenotípica da UFPE) comumente inclui eventos de privação de oxigênio, infecção materno-gestacional, insultos isquêmicos, hemorrágicos ou mutagênicos.Esses danos produzem lesões cerebrais capazes de simular déficits da PC humana em animais experimentais. Lesões cerebrais precoces estão bem presentes na PC um oneroso distúrbio neurológico originado na infância.

No mundo, mais de 17 milhões de pessoas vivem com PC e no Brasil são pelo menos 30 mil novos casos por ano. Nesse contexto, durante o período perinatal, sob o abrigo materno intra e extrauterino, ocorrem fenômenos extraordinários, rápidos e intensos, concernentes ao crescimento e desenvolvimento do filhote mamífero.

Esses acontecimentos nesses ambientes perinatais, por poderem induzir consequências a curto e a longo prazo durante toda vida, são considerados preditivos de mudanças subsequentes do fenótipo.

Entende-se como fenótipo as características observáveis ou caracteres de um organismo de uma dada espécie, ou seja, morfologia, desenvolvimento, propriedades bioquímicas, propriedades fisiológicas e comportamentais. Dada a capacidade dos organismos de reagirem aos desafios impostos pelo ambiente, alterando a sua forma, estado, movimento ou padrão de atividade, essa propriedade imanente se denominou “plasticidade fenotípica”.

A plasticidade do desenvolvimento apresenta características ativas e adaptativas e, por ser uma variação intra-individual, é suscetível à influência do genoma individual e do ambiente, resultando por fim no fenótipo. Nesse paradigma que destaca a relevância do ambiente na formação do fenótipo, vários estudos sobre o desenvolvimento de mamíferos demonstram que variações ambientais na vida perinatal podem levar às mudanças fenotípicas com repercussões na vida adulta.

As crianças com PC são em grande parte de minorias sociais vulneráveis, de raça/cor parda ou preta, provenientes de famílias que vivem na linha da extrema pobreza. Assim, as crianças com paralisia cerebral nos sensibilizam muito, sobretudo em nossa região, elas são muitas vezes, vítimas de erros durante o parto. Portanto, crianças acometidas de PC revela-se uma enorme injustiça que é muitas vezes negligenciada pelas entidades oficiais em saúde. Talvez porque essas crianças sejam consideradas minorias. Ademais, ainda existe pouca pesquisa buscando estratégias para diminuir as consequências dessa tragédia humana.

Raul Manhães de Castro. Médico - Professor Emérito da UFPE e Membro da Academia Pernambucana de Ciências
Dra. Ana Elisa Toscano. Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento da UFPE

Tags

Autor