Artigo de Roberto Pereira: "Casos e causos em movimento"

PAULO FREIRE, educador, quando secretário de Educação de São Paulo, capital, encontrou-me ocupando a Pasta equivalente na cidade do Recife...

Publicado em 07/09/2024 às 11:07

PAULO FREIRE, educador, quando secretário de Educação de São Paulo, capital, encontrou-me ocupando a Pasta equivalente na cidade do Recife. Sempre que possível, conversávamos a bem conversar. Um dia, ele me contou que, ao assumir aquela Secretaria, na gestão da então prefeita Luiza Erundina, encontrou uma escola da rede municipal, concluída às pressas.

Ele terminou as obras e colocou à direita da placa que registrava a sua inauguração, uma outra, com o seguinte texto: "A placa à esquerda é mentirosa, eleitoreira, essa escola, porque concluída, somente foi inaugurada na data de hoje, São Paulo, 14/02/1989".

MEU PAI, escritor Nilo Pereira, andando comigo na Av. Guararapes, deparou-se com um “sebo” improvisado, com livros usados e estendidos na calçada, dentre os quais um de sua autoria. Alegremente, aproximou-se do vendedor, quando foi saudado: – o senhor é o professor Nilo? Sim, sou eu, e vejo que o meu mais novo livro já está em segunda “edichão.” Risos a bem sorrir, além dos abraços pela coincidência do encontro.

NA IGREJA DE NOTRE DAME, em Paris, um guia de turismo, ao adentrar a nave da Igreja, encontra, no altar-mor, uma irmã religiosa, rezando o terço com os seus fiéis. Após esperar por meia-hora, o guia se vira para a freira e arremata: – Irmã, vai se demorar? A senhora está atrapalhando o turismo cujos visitantes estão impacientes em aguardar esse tempo todo. Teria sido engraçado não fosse o desatino do líder que puxava o grupo.

LEDA ALVES, num sábado de muito cansaço, chegou, às 15 horas, em casa. Virou-se para a secretária e disse: “cama.” Não me chame por nada. Uma hora depois toca o telefone:
– Alô, casa de D. Leda Alves, quem fala?
– É Miguel Arraes. Gostaria de falar com ela.
– Agora, não pode. Ela se deitou e deixou ordem para não a chamar para ninguém. O senhor ligue mais tarde, por favor!
Às 18 horas, Leda acorda e pergunta à secretária:
– Alguém me ligou?
– Não, D. Leda, somente Miguel Arraes.
– E você, menina, não me chamou?
– Foi a ordem que a senhora me deu, ou não foi?
– E você, seguiu ao pé da letra, hein?
– Sim, claro!
– Ela retornou a ligação, governador queira me desculpar, o que o senhor deseja?
– Apenas lhe pedi para aceitar o convite de Jarbas para presidir a Fundação de Cultura Cidade do Recife.
– Pronto, aceitarei a missão.
– Obrigado, Leda!
(Leda tinha dito a Jarbas que, para aceitar o convite dele, teria que ouvir o Dr. Arraes, com quem ela tinha alinhamento histórico. Foi resolvido o impasse. Ganhou a cultura!)

GILBERTO FREYRE, na sessão solene de posse do poeta Waldemar Lopes, na Academia Pernambucana de Letras, após 30 minutos do discurso do novo acadêmico, impaciente com a demora, indaga: – Waldemar, ainda vai demorar? Sim, o dobro do tempo, por quê? Porque estou com a bunda doendo de tanto estar sentado. O auditório, repleto, veio às gargalhadas.

AGAMENON MAGALHÃES, então governador de Pernambuco, numa sessão solene, viu que um dos seus secretários puxou um calhamaço de papel, para proferir o seu discurso, perguntou ao secretário: – você vai ler esse discurso agora? – Sim, governador! – Passe-me esses papéis, que vou lê-los em casa. O sorriso dominou a cena.

MARCO MACIEL, quando governador de Pernambuco, ofereceu um jantar aos prefeitos da Zona da Mata. Ele, na entrada do salão de recepções, fez questão de receber, um a um, os burgomestres, e as esposas destes. Um deles, cumprimentando o governador, apresentou-lhe a consorte, dizendo: – governador, esta é a minha genitora. Maciel, sempre educado e gentil, arrematou, ah, sim, tão jovem! O prefeito deu um passo atrás e perquiriu: governador, genitora é mãe ou é esposa? No caso é mãe, retrucou.
Então, eu me enganei, trata-se de minha esposa. Entre os dois apenas um sorriso de meia-boca. Venceu a gentileza.

EU, desde criança, que tenho problema com a pronúncia da letra “r” nas palavras, apesar de tantos anos, ensinando matemática no Colégio Radier e os alunos nunca perceberam essa dificuldade. Em Campina Grande, uma prima muito querida, Maria Ângela, sempre que possível me fazia repetir o numeral “três mil, trezentos e trinta e três”, ação que em muito melhorou a minha pronúncia. Um dia, em São Paulo, em gozo de férias com Elaine e os meus filhos, hospedados na casa de um amigo, logo ao amanhecer, fui à padaria. Chegando, com o meu sotaque acentuado, diante dos sudestinos, pedi, com voz cheia, “treze” pães. A gargalhada foi geral. O atendente, gozador, perguntou-me: quantos? Respondi: quatorze, outro sorriso geral, porque todos entenderam que, pagando um pão a mais, tangenciei o numeral para fugir da galhofa.

Mas, qual foi a quantidade que o senhor pediu antes? – Pedi a média entre doze e quatorze, mas depois decidi por quatorze. O sorriso tomou conta da padaria, porque ficou nítido o embate entre dois sotaques de duas culturas regionais. Não sei quem venceu, mas sei que, ao final, saí sob os aplausos da plateia (os clientes).

Na verdade, venceu o poeta satírico Juvenal que criticava, na Roma antiga, os que pediam trigo no fórum e espetáculos gratuitos no circo, o clássico “panem et circenses” (pão e circo), os que se contentavam com comida e diversão grátis, sem questionamentos sobre o desempenho dos governantes, que, dessa forma, garantiam o apoio da população, um método sempre em usos e abusos, no Brasil e no mundo.

Roberto Pereira, ex-secretário de Educação e Cultura do Estado de Pernambuco e membro da Academia Brasileira de Eventos e Turismo

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