Artigo de Sidney Rocha: "Arquivo Público de Pernambuco sob o fogo invisível do tempo"
Há espaços de inestimável valor histórico que continuam a clamar por atenção. O Arquivo Público enfrenta condições de precariedade e vulnerabilidade
Escrevo este artigo com esperança de que possa ser lido hoje, e não somente como fato do passado. Nos últimos meses, Pernambuco tem apresentado projetos de restauração de seu rico patrimônio histórico, numa nova fase de valorização cultural. Entre os mais recentes, está a restauração do prédio do Diario de Pernambuco e a revitalização do Cine São Luiz.
Enquanto essas conquistas são celebradas, há ainda espaços de inestimável valor histórico que continuam a clamar por atenção. O Arquivo Público de Pernambuco, um dos mais antigos do Brasil, enfrenta condições de extrema precariedade e vulnerabilidade. A não solução de problemas estruturais e de conservação, de longa data, vem colocando em risco o seu vasto acervo.
A restauração, conservação e manutenção do patrimônio pernambucano precisa ser uma missão contínua e inclusiva. Onde todos os espaços de cultura recebam a atenção que merecem, a proteção, a valorização. A começar pela própria Memória/História do Arquivo Público Estadual. Que carece e suplica, com urgência e emergência, prioridade de olhares e de ações.
Pernambuco não pode permitir que o espaço por excelência de sua História fique abandonado à selva selvagem, enquanto outros edifícios renascem. Estamos em plenos 200 anos da Confederação do Equador, com preciosos documentos no Arquivo.
Ironicamente, a precariedade do Arquivo é já histórica. Nenhum governo, nas últimas décadas, fez nada, ou quase nada, até hoje, para sua valorização. O governo de Raquel Lyra tem a chance, também histórica, de salvar a memória secular de Pernambuco. De fazer viver o Arquivo, com saúde e dignidade.
O Arquivo Público de Pernambuco preserva documentos que remontam ao século XVI, essenciais para entender a história não apenas de Pernambuco, mas do Brasil. Sem esses documentos, parte da memória pernambucana e brasileira se perderá para sempre. Sem o devido cuidado, não sobreviverá para contar a História.
A importância do Arquivo vai além da pesquisa histórica acadêmica: ele é um instrumento vivo de cidadania, acessado por estudantes, genealogistas e cidadãos que buscam conhecer sua própria história. Mais que isso, o Arquivo Público é responsável pela guarda e conservação de milhões de documentos de todas as áreas administrativas do Estado. Por isso precisa ser tratado como política pública permanente.
Ainda bem que a governadora Raquel Lyra, através da Secretaria de Comunicação, tem demonstrado preocupação com a situação do Arquivo. Tentando sanar problemas que herdou e, como dissemos, de décadas. O governo está comprometido em preservar a memória de Pernambuco e garantir condições adequadas para os seus principais repositórios de história, como o Arquivo Público.
Essa atenção especial é necessária porque o Arquivo não enfrenta apenas desafios físicos, mas também tecnológicos. A digitalização de documentos é uma demanda urgente. Estamos andando nesse sentido, mas é preciso uma ação sistêmica, integrada, contínua, ágil, que não demore a apresentar resultados. O Arquivo tem buscado parcerias com instituições, universidades, redes e empresas para viabilizar vários projetos. Mas é preciso muito mais.
Ao abordar a preservação do Arquivo Público, o governo Raquel Lyra também busca integrar a sociedade nesse esforço. Afinal, o patrimônio histórico não pertence apenas ao governo, mas a todos os pernambucanos.
Nosso próximo passo será buscar apoio para transformar o Arquivo Público em uma autarquia, com orçamento próprio, a exemplo de outros arquivos estaduais. Para evitar que o Arquivo Público seja sempre essa instituição “passando o pires”, pedindo socorro, chorando sua desdita, como tem sido ao longo do tempo. Temos, portanto, o dever histórico de consertar os rumos do nosso Arquivo. Isto marcará um feito histórico para o governo atual, sobretudo fazendo com que o Arquivo seja, dentro das políticas públicas, um compromisso do Estado. Inadiável.
Nossa ideia é a criação de um espaço cultural interativo dentro do Arquivo Público. Que seja: mais do que um local de armazenamento de documentos. Um centro de difusão cultural e histórica. Esse espaço será dedicado a exposições temporárias e permanentes sobre a história de Pernambuco, utilizando os documentos arquivados como base. Será outra forma de aproximar a população da sua história, permitindo que o Arquivo seja mais frequentado e valorizado.
Isso já estamos fazendo, com eventos ligados à educação, que pretendemos ampliar em 2025, quando o Arquivo completa 85 anos. Sob nossa gestão, o Arquivo se tornou uma casa de pensamento: retomamos seu braço editorial, de livros e de audiovisual, com várias publicações dirigidas, especialmente, a professores e estudantes.
Tramita na Secretaria de Comunicação – a quem o Arquivo está afeito – uma proposta para mudança do prédio anexo do Arquivo, fruto de detalhado estudo recente de Grupo de Trabalho com técnicos, especialistas e a sociedade civil.
É preciso encontrar um local para mudança urgente de endereço. Seu Anexo, à rua Imperial, nunca foi adequado à arquivologia. Hoje, menos ainda. No momento, o governo busca soluções as mais adequadas.
A recuperação do Arquivo Público é uma forma de corrigir a negligência, que durando tanto tempo, pode ser considerada crônica, como uma doença.
A falta de investimentos adequados ao longo dos anos gerou problemas de armazenamento e risco de perda de documentos raros e insubstituíveis. Na verdade, já contabilizamos várias dessas perdas. Certa e tristemente, constataremos mais. Nossa equipe, neste momento, trabalha no processo de avaliação arquivística para definição de documentos considerados sem valor permanente, enquanto aguarda definições para a mudança de prédio da rua Imperial.
Enquanto isso, esperamos as condições técnicas mínimas para publicar nossa Tabela de Periodicidade, que serve como guia para todos os órgãos do governo. O documento foi um dos primeiros consolidados dentre os arquivos públicos estaduais. Contudo, não há como receber acervos e documentos de instituições do governo, sem arquivistas, sem espaço adequado.
Resultado: documentos e documentos se acumulam nas secretarias. Estamos instruindo a formação de comissões nessas repartições, mas já estamos em uma situação crítica quanto a prazos, à obediência das leis de Comunicação e da Transparência.
A atual gestão de Raquel Lyra vê na revitalização do Arquivo uma forma de dar o devido reconhecimento a um local que já deveria ter sido tratado como prioridade há muito tempo. Essa iniciativa não se limita apenas ao estado físico do prédio, mas à criação de uma política estadual sólida de preservação documental.
As recentes revitalizações de edifícios históricos como o Diario de Pernambuco e o Cine São Luiz demonstram que Pernambuco está no caminho certo para preservar sua memória cultural. Contudo, o estado ainda tem um longo caminho a percorrer, no que se refere ao Arquivo Público. A governadora Raquel Lyra compreende essa urgência e tem demonstrado empenho em garantir que o Arquivo receba a atenção e os recursos que merece.
Dirigir o Arquivo Público é algo que honra minha trajetória de gestor. Inclusive por podermos, neste governo, iniciar um trabalho inédito de gestão documental que nunca se praticou de fato, de modo sistemática e contínuo, em Pernambuco.
Com esses esforços em curso, é possível vislumbrar um futuro em que o Arquivo Público de Pernambuco não só estará preservado fisicamente, mas também modernizado, acessível e valorizado por todos. É um passo fundamental para que a história pernambucana seja devidamente respeitada e continuada para as gerações futuras, servindo como um legado do compromisso do governo Raquel Lyra com a cultura e a memória do estado.
Sidney Rocha, escritor, diretor do Arquivo Público de Pernambuco