A OAB no mês da Consciência Negra deu um grande passo à luta pela igualdade racial

E ouso dizer que as instituições brasileiras que resistem às cotas cometem um erro histórico. E esse debate nos chega tarde, inclusive !

Publicado em 22/11/2024 às 12:56
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A implantação das cotas raciais tem sido fundamental para combater a exclusão e marginalização dos negros, garantindo representatividade e igualdade de oportunidades.

A violência e a discriminação contra a população negra continuam sendo uma realidade, principalmente nas periferias das grandes cidades, onde a falta de segurança e de serviços básicos educação são ainda mais evidentes.

No caso específico da OAB-PE, a composição da lista sêxtupla seguiu os critérios de equidade, mantendo as regras de paridade de gênero (50%) e de equidade racial (mínimo de 30% de advogadas e advogados negros), conforme decidido pelo Pleno da OAB em sessão realizada em 25 de abril de 2022, onde restou alterado o Regimento Interno pela maioria dos Conselheiros Estaduais.

Hoje posso dizer que estou fazendo parte de uma grande mudança... de um avanço, ao menos na OAB de Pernambuco. No último pleito, realizado no dia 18.11.2024, tivemos a primeira mulher eleita em 93 anos de existência, um grande feito. E, hoje, o atual Presidente da OAB-PE, Fernando Ribeiro Lins, entregou ao Presidente do Tribunal de Justiça a lista sêxtupla para a ocupação de um advogado para vaga de Desembargador, o chamado “quinto constitucional”, onde a paridade de gênero e a cota racial foram devidamente respeitada.

E para os que não sabem o que é o “quinto constitucional” esclareço ser, na verdade, um marco na democratização do Poder Judiciário, já que assegura que 20% das vagas de determinados tribunais sejam destinadas a membros do sistema de Justiça que não são da carreira da magistratura, como advogados e membros do Ministério Público.

E a alteração no Regimento Interno da OAB-PE visaram ampliar a diversidade e inclusão dentro do Judiciário, garantindo uma representatividade mais plural no Tribunal de Justiça.

Em especial em relação as cotas, temos grande inexpressividade no nosso Judiciário. O Censo 2022 do IBGE mostrou que o Brasil tem 55,5% da população autodeclarada negra. No Poder Judiciário, 13,7% se autodeclaram negros. E se pergunta, porque os negros não se fazem presente ?

Infelizmente, a construção estrutural da sociedade brasileira é atravessada por ideais racistas que afastam determinados grupos do poder, neste caso nós negros.

As dificuldades de implementação decorrem de uma certa mentalidade conservadora que não consegue enxergar com clareza o racismo estrutural e histórico do país. E todas as vezes que “ousamos” falar sobre isso, somos tomados por argumentos de meritocracia e, portanto, elitistas.

Não é fácil.

E por isso, meu coração encontra-se tombado de alegria, eis que a inclusão das cotas raciais na lista sêxtupla pela OAB é a prova que a nossa Sociedade está mudando e a OAB Pernambuco faz parte disso. Eu não esperava menos do que isso !

Inclusive, para concorrer a lista sêxtupla, a OAB-PE determinou a participação das COMISSÕES DE HETEROIDENTIFICAÇÃO que avaliaram os candidatos, as quais foram essenciais para evitar que “não negros” entrassem, tirando vagas de negros.

Acredite até isso para nós negros, torna-se uma luta. Lutamos até para que negros não sejam excluídos pelos que “se dizem” negros.

Não restou erro. Os indicados na lista sêxtupla eram negros. Que orgulho !

E ouso dizer que as instituições brasileiras que resistem às cotas cometem um erro histórico. E esse debate nos chega tarde, inclusive !

E a você que diz que não interessa esse assunto ou como costuma chamar do famoso “mi mi mi” , reforço que o respeito a politica de cotas afirmativas interessa a todos, porque se trata do desenvolvimento do Brasil como nação e como o mundo nos vê, respeitando as diferenças e as aceitando.

Incluir negros nas cotas trata-se não só de uma dívida histórica ou de reparação, trata-se, de um clamor da população para que o Judiciário est3eja diligente à complexidade e, em especial, à diversidade da nossa sociedade. Uma sociedade que grita, chora e clama por equidade, por oportunidade, por Justiça.

A implementação das cotas não é um processo fácil e enfrenta oposição, seja na OAB Pernambuco, seja em qualquer outra Instituição. Mas, não podemos negar que trouxe um impacto significativo na vida de muitas pessoas, dando-lhes acesso a oportunidades antes negadas.

Os advogados hoje entraram para a história. A OAB-PE está na vanguarda de muitas outras no Brasil.

Nossa lista sêxtupla contemplou um homem negro e uma mulher negra, ambos com todos os requisitos para ser o (a) próximo (a) Desembargador (a) do Tribunal de Justiça de Pernambuco, com conduta ilibada, notório saber jurídico e mais de 10 (dez) anos de exercício e acima de tudo competência e coragem.

A indicação entregue hoje ao Tribunal de Justiça de Pernambuco não trata apenas de ocupar espaços. É algo maior. É transformar consciências... transformar vidas, garantindo que o Judiciário caminhe lado a lado com o povo que ele serve.

O Judiciário de Pernambuco terá a chance de refletir suas cores, suas histórias e suas lutas ao enviar à Governadora de Pernambuco na lista tríplice um negro e uma negra, acompanhando a história.

Eu já posso dizer que fiz parte desta linda história. Um passo foi dado, aguardando os próximos capítulos.

Márcia Santos, advogada trabalhista e secretária geral da Associação dos Advogados Trabalhistas de Pernambuco (ATATP)

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