O uso da força pelos órgãos de segurança pública (1)
A Lei nº 13.060, de 2014, tratou de proibir o uso de arma de fogo, pelos agentes de segurança, contra pessoa em fuga que esteja desarmada
Em 22.12.2014, com a aprovação da Lei Federal nº 13.060, pelo Congresso Nacional, pela primeira vez na história legislativa brasileira, houve o disciplinamento para o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública em todo território nacional, definindo que os órgãos de segurança pública deverão priorizar a utilização dos instrumentos de menor potencial ofensivo, desde que o seu uso não coloque em risco a integridade física ou psíquica dos policiais, obedecidos os princípios da legalidade, necessidade, razoabilidade e proporcionalidade. A Lei nº 13.060, de 2014, em plena vigência, tratou de proibir o uso de arma de fogo, pelos agentes de segurança, contra pessoa em fuga que esteja desarmada ou que não represente risco imediato de morte ou de lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros e contra veículo que desrespeite bloqueio policial em via pública, exceto quando o ato represente risco de morte ou lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros.
Na visão da Lei nº 13.060/2014, são considerados instrumentos de menor potencial ofensivo aqueles projetados especificamente para, com baixa probabilidade de causar mortes ou lesões permanentes, conter, debilitar ou incapacitar temporariamente pessoas, ao tempo em que estipulou que todos os cursos de formação e capacitação dos agentes de segurança pública deverão incluir conteúdo programático que os habilite ao uso dos instrumentos não letais, cabendo ao poder público o dever de fornecer a todo agente de segurança pública instrumentos de menor potencial ofensivo para o uso racional da força. Finalmente a Lei 13.060 estabeleceu que sempre que do uso da força praticada pelos agentes de segurança pública decorrerem ferimentos em pessoas, deverá ser assegurada a imediata prestação de assistência e socorro médico aos feridos, bem como a comunicação do ocorrido à família ou à pessoa por eles indicada.
Porém, foi a Lei Federal nº 13.675, de 11.06.2018, quem efetivamente disciplinou a organização e os funcionamento dos órgãos responsáveis pela nossa segurança pública, oportunidade em que criou uma nova política nacional de segurança pública e defesa social, instituindo o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), com a finalidade de preservar a ordem pública e a incolumidade das pessoas e do seu patrimônio, por meio de atuação conjunta, coordenada, sistêmica e integrada de todos os órgãos de segurança pública do país, em articulação com a sociedade.
Nos termos da Lei nº 13.675/2018, compete à União estabelecer a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) e aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer suas respectivas políticas, observadas as diretrizes da política nacional, especialmente para análise e enfrentamento dos riscos à harmonia da convivência social, com destaque às situações de emergência e aos crimes interestaduais e transnacionais.
Pois bem: através do Decreto nº 12.341, de 23.12.2024, o presidente da República resolveu regulamentar as Leis 13.060 e 13.765, em relação ao uso da força e dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos profissionais de segurança pública, com o intuito de promover a eficiência, a transparência, a valorização dos profissionais de segurança pública e o respeito aos direitos humanos, elegendo como princípios gerais para o uso da força, a legalidade, a precaução, a necessidade, a proporcionalidade, a razoabilidade, a responsabilização e a não discriminação.
O Decreto 12.341 foi feliz ao estabelecer regras claras e precisas sobre as diretrizes básicas que devem nortear a atuação dos agentes de segurança, no tocante ao uso da força. São elas: I - o uso da força e de instrumentos de menor potencial ofensivo somente poderá ocorrer para a consecução de um objetivo legal e nos estritos limites da lei; II - as operações e as ações de aplicação da lei devem ser planejadas e executadas mediante a adoção de todas as medidas necessárias para prevenir ou minimizar o uso da força e para mitigar a gravidade de qualquer dano direto ou indireto que possa ser causado a quaisquer pessoas; III - um recurso de força somente poderá ser empregado quando outros recursos de menor intensidade não forem suficientes para atingir os objetivos legais pretendidos; IV - o nível da força utilizado deve ser compatível com a gravidade da ameaça apresentada pela conduta das pessoas envolvidas e os objetivos legítimos da ação do profissional de segurança pública; V - a força deve ser empregada com bom senso, prudência e equilíbrio, de acordo com as circunstâncias do caso concreto, com vistas a atingir um objetivo legítimo da aplicação da lei; VI - os órgãos e os profissionais de segurança pública devem assumir a responsabilidade pelo uso inadequado da força, após a conclusão de processo de investigação, respeitado o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório; e VII - os profissionais de segurança pública devem atuar de forma não discriminatória, sem preconceitos de raça, etnia, cor, gênero, orientação sexual, idioma, religião, nacionalidade, origem social, deficiência, situação econômica, opinião política ou de outra natureza.
Na próxima semana daremos continuidade ao assunto.
Adeildo Nunes, juiz de Direito aposentado, professor no curso de pós-graduação em Direito do Instituto dos Magistrados do Nordeste (IMN), doutor e mestre em Direito de Execução Penal, membro do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP)