Nepotismo: uma afronta à democracia e aos princípios republicanos

É hora de refletirmos sobre o modelo de gestão pública que queremos. A tolerância com o nepotismo é incompatível com a democracia

Publicado em 14/01/2025 às 0:00 | Atualizado em 14/01/2025 às 10:31
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O nepotismo é uma prática que desafia a essência da democracia e desvirtua os princípios fundamentais da administração pública no Brasil, como a legalidade, moralidade, impessoalidade e eficiência.

Embora a legislação brasileira proíba explicitamente essa prática, incluindo a súmula vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal (STF), a nomeação de parentes para cargos públicos segue sendo utilizada de forma descarada, frequentemente mascarada por estratégias como o nepotismo cruzado.

Recentemente, Pernambuco foi palco de um caso emblemático dessa afronta, com a nomeação por um dos novos prefeitos de cinco membros de sua família para o primeiro escalão da gestão municipal.

As nomeações, publicadas no Diário Oficial dos Municípios da AMUPE, ignoram os preceitos constitucionais e a legislação contra o nepotismo, demonstrando um desrespeito flagrante ao interesse público.

Consequências para a gestão pública

O nepotismo não é apenas um desvio ético; é também uma prática que compromete a eficiência da gestão pública.

Ao priorizar vínculos familiares em detrimento da competência técnica, o gestor público coloca interesses privados acima das necessidades coletivas, minando a confiança da sociedade na administração pública.

A prática do nepotismo contribui para a baixa eficiência das políticas públicas e para a perpetuação de desigualdades estruturais.

Além disso, a nomeação de parentes cria um ambiente de gestão fechado, onde o controle social e a transparência tornam-se frágeis, dificultando o combate à corrupção e à ineficiência.

Nepotismo cruzado

A legislação brasileira também condena o nepotismo cruzado, uma prática em que autoridades de diferentes esferas nomeiam parentes uns dos outros para burlar as regras.

Essa estratégia sofisticada não apenas viola o espírito da lei, mas também revela uma cultura política que despreza a impessoalidade como pilar da administração pública.

A perpetuação desse tipo de prática reflete uma visão patrimonialista da gestão pública, em que o poder é tratado como uma extensão dos interesses privados.

Essa postura desrespeita a ideia de que o Estado deve ser gerido com base em critérios técnicos e meritocráticos, conforme determina a Constituição Federal.

Transparência

Não são caso isolados, mostrando que esse fenômeno é um sintoma de um problema estrutural, que exige respostas firmes do sistema de justiça e da sociedade civil.

A lei deve ser aplicada com rigor, punindo gestores que desrespeitam os princípios constitucionais e permitindo que o interesse público prevaleça.

Ao mesmo tempo, é imprescindível que a sociedade exija maior transparência e fiscalização na gestão pública.

Portais de transparência, auditorias independentes e o fortalecimento de órgãos de controle, como o Ministério Público e os Tribunais de Contas, são ferramentas essenciais para identificar e coibir práticas de nepotismo.

É hora de refletirmos sobre o modelo de gestão pública que queremos. A tolerância com o nepotismo é incompatível com o fortalecimento da democracia e da eficiência estatal.

O caso de Pernambuco nos lembra que ainda há muito a fazer para consolidar os valores democráticos em nosso país. Mas, com fiscalização, educação e pressão popular, é possível construir um futuro em que práticas como o nepotismo sejam apenas uma página vergonhosa de nossa história política.

Priscila Lapa, jornalista e doutora em Ciência Política

Sandro Prado, economista e professor da FCAP-UPE.

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