Adriano Oliveira: Pix, Lula e as redes sociais
Redes sociais são instrumentos para a execução da estratégia. Elas não são a estratégia. Essa, por sua vez, nasce da pesquisa qualitativa

A crise do PIX fortaleceu o debate sobre o desempenho das redes sociais do presidente da República. A imprensa divulga e divulgou intensamente que o governo Lula não sabe usar as redes sociais e que a “direita”, ou melhor, o bolsonarismo, dá um banho de estratégia na utilização das redes sociais quando comparado com o desempenho estratégico do atual mandatário da República.
Redes sociais são instrumentos para a execução da estratégia. Elas não são a estratégia. Essa, por sua vez, nasce da pesquisa qualitativa, a qual tem o objetivo de decifrar as percepções, desejos e sentimentos dos eleitores. A conjuntura importa para a definição da estratégia. O que falta a comunicação do governo Lula é estratégia e a sua ausência é derivada da frágil interpretação sociológica da realidade.
O governo Lula não é velho. Mas o governo Lula vive do passado. O atual presidente da República precisou restaurar os programas sociais, os quais fizeram com que a sua popularidade crescesse fantasticamente no período de 2002 a 2010. Todavia, naquela época, as ações do governo Lula eram novidades e inovadoras. Hoje não é mais! Parcela dos eleitores não quer apenas “bolsas”. Desejam mais. Portanto, o governo Lula vive do passado quando acredita que a comunicação das “bolsas” instituídas é suficiente para lhe dar popularidade.
Foram os méritos das eras passadas de FHC e de Lula que transformaram os hábitos e desejos do eleitor, além da demografia. Foi na era FHC que a inflação foi debelada: Uma cultura de estabilidade, ou seja, da não variação gritante de preços, foi instituída na mentalidade dos brasileiros. Lula inseriu os motes do consumo e da inclusão social. Ambos foram fortes incentivos para que Lula findasse as suas eras em 2010 com fantástica popularidade.
Confira no vídeo: Haddad desmente imposto sobre pets e Pix após vídeo falso feito com IA
"Imposto sobre Pix, mentira. Imposto sobre quem compra dólar, mentira. Imposto sobre quem tem um animal de estimação, mentira. Pessoal, vamos prestar atenção, está circulando uma fake news. Prejudica o debate público, prejudica a política, prejudica a democracia", disse o ministro no vídeo." />
Os méritos dos governos FHC e Lula trouxeram mudanças nos desejos e percepções dos eleitores. Os votantes não querem inflação. Seguem desejando bem-estar econômico, mais consumo e mais renda. Porém, eles querem mais. Se no passado, as classes B e C eram minoritárias e formadas por trabalhadores, hoje, ou melhor, há um bom tempo, elas são grandes e empreendedoras. Não basta falar para os trabalhadores. É necessário se comunicar com os empreendedores, batalhadores. Esses querem mais conquistas e não desejam viver apenas das políticas sociais do Estado.
São milhares de empreendedores que são evangélicos e que repudiam a agenda identitária do petismo. Eles condenam a esquerda por supostamente defender o comunismo. Eles repudiam o aborto e não se sentem à vontade para discutir abertamente determinadas pautas morais. Os empreendedores, os quais não são, necessariamente, evangélicos, têm a percepção de que o Estado arrecada muito, mas não oferta serviços públicos de qualidade. E mais: O Estado arrecada, gasta muito, não leva serviços de qualidade e ainda quer arrecadar muito.
A Lava Jato, entre 2014 a 2018, criou e reforçou entre os eleitores, que a classe política é corrupta. Em especial, os petistas e lulistas. A percepção para muitos é de que os políticos estão no poder “roubando” e querendo arrecadar mais através de mais impostos. O bolsonarismo, produto, em parte, da Lava Jato, tem a sabedoria de reforçar a percepção de corrupção na esquerda e de que ela não serve para nada, a não ser, roubar e arrecadar.
Os ricos, os quais são poucos no Brasil, agitam o mercado. Descredibilizam a política econômica do governo Lula. E fazem isto porque querem, corretamente, um plano a longo prazo para o controle do gasto público. Com o mercado agitado e insatisfeito, o real é desvalorizado, a dívida pública aumenta, a inflação cresce e os juros têm alta. Por consequência, governo dá explicações diárias, algumas equivocadas, sobre a contenção do gasto público.
Bolsonarismo, evangélicos, novos desejos dos eleitores, percepção do bem-estar econômico e fake news limitam a popularidade do governo Lula. Essas causas se retroalimentem, e algumas são causas de outras. O governo Lula precisa identificar adequadamente os desejos e sentimentos dos eleitores. Além de interpretar satisfatoriamente a conjuntura. Friso: A popularidade do atual governo não crescerá fortemente e o que hoje garante o favoritismo de Lula em 2026 é a ausência de uma direita civilizada, ou seja, não bolsonarista.
Adriano Oliveira é cientista político, professor da UFPE e fundador da "Cenário Inteligência: Pesquisa qualitativa & Estratégia"