Educação integral e as competências socioemocionais

Vários estudos mostram que estudantes mais responsáveis, colaborativos, persistentes, curiosos e resilientes aprendem mais e concluem seus estudos

Publicado em 03/02/2025 às 7:00
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Estamos vivendo um cenário disruptivo, no qual as transformações pelas quais o mundo vem passando não são mais lineares e sim exponenciais, especialmente impulsionadas pelas descontinuidades tecnológicas. Viver num ambiente disruptivo exige das pessoas novas competências e habilidades, que vão além daquelas meramente cognitivas. Tais competências são normalmente chamadas de socioemocionais, que incluem a criatividade, a colaboração, a persistência, a abertura ao novo, a comunicação e o pensamento crítico, entre outras.

Quando essas competências são desenvolvidas no ambiente escolar de forma intencional na estrutura curricular, articuladas com aquelas vinculadas ao cognitivo, estamos mais próximo do que chamamos de educação integral, e assim promovendo o desenvolvimento pleno de nossas crianças e de nossos jovens, em consonância com o artigo 2° da LDB (A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho).

Vários estudos mostram que estudantes mais responsáveis, colaborativos, persistentes, curiosos e resilientes aprendem mais, concluem seus estudos básicos na idade certa e saem preparados para seguir aprendendo ao longo da vida; na idade adulta, tornam-se cidadãos mais conscientes e participativos, trabalhadores mais éticos, produtivos e realizados, enfim, seres humanos mais aptos a fazerem boas escolhas e usufruírem delas.
Espera-se, assim, que as escolas preparem as nossas crianças e os nossos jovens para uma educação que seja capaz de desenvolver tais competências; que não seja mais uma disciplina, mas uma nova forma de ensinar e de aprender. Nossa escola, infelizmente, é ainda muito conteudista, e isso não dialoga com cenários disruptivos, como o que estamos vivendo. Certa vez, ouvi de uma dirigente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), em um evento sobre empregabilidade no estado de Santa Catarina, que “ainda contratamos pelo cognitivo, mas demitimos pelo socioemocional”.

Para trazer as nossas escolas, professores e estudantes para este novo ambiente, um passo importante foi dado com a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a partir de suas dez competências gerais que asseguram, entre outras coisas, alguns dos princípios que são fundamentais para o desenvolvimento integral, tais como, autonomia (o objetivo maior da educação integral é a formação para a autonomia, entendida como o empoderamento dos estudantes para fazer escolhas fundamentadas em seus projetos de vida), protagonismo (promover o protagonismo docente e estudantil é decisivo para que se vejam e sejam vistos como parte da solução e não do problema) e corresponsabilidade (o direito à educação deve ser assegurado com o envolvimento de todos pela educação, numa ética de corresponsabilidade entre o primeiro, o segundo e o terceiro setores, além de famílias e cidadãos mobilizados de forma coletiva e solidária, em consonância com o Artigo 205 da Constituição Federal).

Levar essa perspectiva ao dia a dia das escolas e redes de ensino de forma estruturada e intencional requer inovações não só na estrutura curricular e nas políticas educacionais, mas também na formação de professores e nas práticas pedagógicas a serem empregadas em sala de aula. Para isso, é importante reunir os conhecimentos que já vêm sendo produzidos, tanto pelos próprios professores no cotidiano das escolas, quanto pelos pesquisadores e especialistas das diversas áreas das ciências – educação, psicologia, economia, neurociências e muitas outras, que podem auxiliar a encontrar as práticas mais eficientes para atingir tais objetivos. Consequentemente, assegurar aos nossos alunos um aprendizado pleno que os habilitem a fazer escolhas com autonomia e conquistar realizações ao longo da vida, passa necessariamente em assegurar aos nossos professores o direito ao conhecimento.

Mozart Neves Ramos é titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira do Instituto de Estudos Avançados da USP de Ribeirão Preto

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