O cavalo-marinho e a biodiversidade
O Hippocampus propaga ciência, com informação e sensibilização ambiental de forma simples para milhares de cidadãos, não somente brasileiros

A Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) é um tratado da Organização das Nações Unidas estabelecido durante a Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em junho de 1992. A CDB é um dos mais importantes instrumentos internacionais relacionados ao meio ambiente. Ela está estruturada sobre três bases principais – a conservação da diversidade biológica, o uso sustentável da biodiversidade e a repartição justa e equitativa dos benefícios provenientes da utilização dos recursos genéticos. Refere-se à biodiversidade em três níveis: ecossistemas, espécies e recursos genéticos. É aí que se encontra o desafio para se levar adiante qualquer esforço de proteção a recurso tão vital como esse para a saúde do planeta. Afinal, só existe evolução com diversidade biológica..
Na verdade, a evolução constitui noção central para se entender a vida na Terra. Por isso, esforços consistentes de preservação da diversidade de formas de vida merecem apoio e todos os estímulos possíveis. Penso ser esse, o caso aqui em Pernambuco do chamado Projeto Hippocampus – localizado no município do Ipojuca há 24 anos, trabalhando pela conservação dos cavalos-marinhos, espécies ameaçadas de extinção. Esse animalzinho, que algumas pessoas acham lindo e outras, estranho, para os integrantes do Hippocampus, simplesmente tem que continuar existindo.
O cavalo-marinho integra uma cadeia de espécies que origina um todo consistente, ajudando no seu fortalecimento. Possui importância intrínseca. Daí por que gostaria de chamar atenção para as dificuldades que o Projeto Hippocampus atravessa neste momento. Atualmente, por concessão do Porto de Suape, ele ocupa ali uma área, que está comprometida com a implementação de um grande (e justificado) projeto de Hidrogênio Verde, em pleno desenvolvimento. O Hippocampus precisa desocupar essa área, estando em busca de parceria ou patrocínio para relocação dos laboratórios e de instalação de uma nova sede de visitação, necessária para a sustentabilidade financeira e plenitude dos trabalhos de educação, pesquisa e conservação do projeto. Quando fechou em 2020, devido à Covid-19, o projeto tinha uma sala de visitação e educação ambiental que recebia em torno de 4 mil pessoas por mês, sem contar as turmas de escolas e universidades.
Através de ações como essa, o Hippocampus propaga ciência, com informação e sensibilização ambiental de forma simples para milhares de cidadãos, não somente brasileiros, mas estrangeiros também, como os que passavam na sede de visitação, hoje em vias de quase fechamento. Ou seja, a conservação do cavalo-marinho termina se inserindo no setor turístico de Pernambuco. Ademais, o projeto mostrou capacidade de gerar benefícios para a melhoria de vida, educação e inclusão social da população de seu entorno. Conseguiu desenvolver parcerias técnico-científicas, convênios e patrocínios (com a UFPE, UFRPE, Unesp, órgãos ambientais municipais, estaduais e federais, sendo membro da União Internacional para a Conservação da Natureza-IUCN).
Esses laços foram afetados com a pandemia que levou ao fechamento da sede de visitação em Porto de Galinhas, a qual proporcionava a sustentabilidade financeira do projeto. Grande apoio surgiu do Porto de Suape, que recebeu os laboratórios. Mas agora, se instalou uma emergência.
A crise do Hippocampus é de que seu longo e produtivo trabalho esteja condenado à extinção, diante do vulto do projeto do Hidrogênio Verde. Não se trata de discutir o significado desse empreendimento, que possui enorme justificação. Está em jogo o insubstituível recurso da biodiversidade. O cavalo-marinho, lindo e estranho como for, constitui um elo da biodiversidade inegável e imprescindível.
Clóvis Cavalcanti, ex-Presidente da Sociedade Internacional de Economia Ecológica (ISEE) e membro da Academia Pernambucana de Ciências.