Editorial

Vazamento de dados

Publicado em 28/11/2020 às 2:00
Leitura:

A civilização global se caracteriza por se basear no armazenamento descomunal e no fluxo incessante de informações. De bancos e servidores com grande capacidade, até o acesso fácil pelo celular de qualquer cidadão, a sociedade planetária unificada virtualmente é tão dependente desse modo de funcionamento que mal percebe os riscos da exposição individual a que está submetida. Para que os riscos sejam minimizados e a proteção seja intrínseca ao modo de vida contemporâneo, medidas legais e procedimentos de segurança devem ser parte da rotina - sob a responsabilidade, primeiro, do Estado e das empresas que, com a chancela e o monitoramento de instituições públicas, gerem a informação coletiva, e em seguida, dos indivíduos que dispõem de acesso aos dados.

O vazamento de registros pessoais e relativos à saúde de 16 milhões de brasileiros com suspeita de infecção pela Covid-19, denunciado esta semana pelo jornal O Estado de S. Paulo, expôs a falta de controle do governo federal a respeito da questão. Que é séria, não é um problema de menor importância. O fato de dados de personalidades expoentes da República, do presidente Jair Bolsonaro e ministros até o governador de São Paulo e os presidentes da Câmara e do Senado, terem sido postos à disposição das telas, amplifica a gravidade do vazamento. E ratifica a necessidade de responsabilização pela liberação das senhas, tanto da parte do Hospital Albert Einstein, de onde partiu o acesso original, quanto do Ministério da Saúde, que não pode se mostrar tão vulnerável.

A segurança na manipulação dos dados é prerrogativa da administração pública e garantia da privacidade dos cidadãos. Sua confiança serve, por exemplo, para a credibilidade das eleições por urna eletrônica, bem como para guiar políticas ou o desenvolvimento de pesquisas que se fiam em informações representativas da população. Quando não apenas um, mas dois sistemas do Ministério da Saúde foram deixados de portas abertas, revelando históricos clínicos e até prontuários, a condição de vigilância do governo federal é colocada em xeque. O presidente da República, que teve seus dados expostos e já havia lançado dúvidas acerca do processo eleitoral eletrônico, deveria ser o primeiro a zelar pela segurança das informações dos brasileiros.

Especialistas em direito digital manifestaram preocupação diante do vazamento consumado. Os dados podem ter sido usados para fins comerciais, ou mesmo por criminosos que se valem de informações pessoais para planejar seus golpes e ataques.

A Lei Geral de Proteção de Dados orienta a adoção de medidas para evitar ações ou acidentes como o que aconteceu - pois não há indícios, até agora, de invasão hacker ou falha nos sistemas. Os danos coletivos e individuais poderão ser cobrados do governo federal, do Hospital Albert Einstein, e dos servidores e funcionários envolvidos. Que o episódio traga lições para a urgência de se propagar, no País, a cultura de proteção dos dados.

 

Comentários

Últimas notícias