Número de crianças e adolescentes atingidos por armas de fogo é recorte cruel da violência que assola a Região Metropolitana do Recife

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JC

Publicado em 31/01/2023 às 23:14
Editorial
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As estatísticas dão contornos mais visíveis à realidade que nem sempre se enxerga com a gravidade merecida. Diante de números alarmantes, a sociedade é levada a abandonar a indiferença, e os governos, a letargia. Tanto uma quanto a outra tendem a deixar as coisas como estão, naturalizando o que não deveria ser tratado como algo normal. É o caso da violência em Pernambuco, um dos estados em que mais se mata por armas de fogo no Brasil. O fracasso das políticas de segurança nos últimos anos, especialmente do Pacto pela Vida, que já deu certo resultado no passado, exige da nova gestão estadual
a aplicação de novas estratégias, para que não se caia no terreno comum das mesmas dificuldades encontradas e lamentadas em governos anteriores.

Em 2022, um número recorde de crianças e adolescentes foi vítima de disparos, de acordo com levantamento do Instituto Fogo Cruzado. Entre 2019 e 2022, das mais de 7 mil pessoas baleadas na Região Metropolitana do Recife, 428 eram adolescentes, e 42, crianças. Trata-se de um cenário de guerra, em que a sobrevivência não depende apenas da saúde e do atendimento a direitos básicos, como alimentação, mas também da garantia de segurança em comunidades dominadas pela criminalidade. Somente no ano passado, de 118 adolescentes vítimas de balas, 71 perderam a vida. E das 13 crianças
atingidas por tiros, três morreram. Tais índices não podem mais ser tidos como parte comum do cotidiano pernambucano e recifense. É crucial que se mude a percepção, colocando a violência armada como um problema intolerável, que demanda ações emergenciais do poder público e da sociedade. A violência é uma questão coletiva – e como tal deve ser abordada, coletivamente.

O aumento de vítimas infantis e jovens da violência armada no Grande Recife impõe à governadora Raquel Lyra e sua equipe a missão de prevenir a continuidade desse descalabro. E o primeiro passo é reduzir as chances de tiros dentro de casa. “É preciso olhar com mais atenção para a circulação de armas nas mãos de civis no Estado. Arma de fogo não é solução para a violência. Ela é o agravamento da violência. Se não queremos que nossas crianças e adolescentes cresçam em bairros violentos, com pessoas armadas, não podemos naturalizar armas de fogo dentro de casa”, diz Ana Maria Franca, coordenadora do Instituto Fogo Cruzado em Pernambuco. Não por acaso, a facilidade de acesso com as políticas de estímulo às armas de fogo no governo Jair Bolsonaro é um dos fatores apontados para o crescimento de mortes violentas.

Metade das 42 crianças feridas nos últimos quatro anos na RMR foi vítima de balas perdidas, sendo que nove estavam dentro de suas residências. Também é necessário buscar a melhoria da responsabilidade policial. Para evitar que uma criança brincando na frente de casa, como Heloysa, de 6 anos, seja morta num tiroteio por um disparo policial. Heloysa foi arrancada da vida em Porto de Galinhas, em março do ano passado. Investigações mostraram que o suspeito perseguido pela polícia não chegou a dar um único tiro.

A recuperação da segurança pública em Pernambuco passa por uma articulação da nova gestão estadual com os municípios, em todas as regiões. No caso do Grande Recife, a governança metropolitana, com a participação do Estado e das prefeituras, pode ser acionada para trazer mais efetividade às políticas de combate à violência.

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