Arcabouço fiscal promete mais gastos do que controle

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JC

Publicado em 23/04/2023 às 0:00
Editorial
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Desde o início do governo Lula, há quase quatro meses, os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e Simone Tebet, do Planejamento, entoam o discurso da responsabilidade fiscal, em contrapartida ao desinteresse que o presidente da República já demonstrou sobre o tema. A exemplo de outros políticos, e até de seu antecessor, Jair Bolsonaro, Lula critica o teto de gastos públicos, e postula o lastro financeiro para custear programas sociais e outras despesas. Em substituição à regra do teto, implantada por Michel Temer, o arcabouço apresentado pelo atual governo federal não é premissa de rigor fiscal. Como a própria ministra do Planejamento afirmou, se o arcabouço não for aprovado pelo Congresso, diversos gastos ficarão comprometidos. Ou seja, o arcabouço fiscal do terceiro governo Lula desponta não como limite, e sim, como permissão para gastar mais.
O motivo para a regra fiscal não é impedir programas sociais, nem o cumprimento de despesas obrigatórias. O objetivo é disciplinar a distribuição de recursos, de modo a interromper ou reverter o crescimento da dívida pública. Se a dívida pública não está controlada, até os programas que visam a distribuição de renda e a geração de postos de trabalho são minados pelo endividamento que restringe o desenvolvimento. E é aí que mora a dúvida sobre o arcabouço defendido pelo governo Lula: sua motivação não se atrela ao controle desejado por uma regra fiscal.
Como aponta o colunista de Economia do JC, Fernando Castilho, o que o governo federal pretende mesmo é fazer despesas. “O problema é o que vai acontecer no momento das vacas magras, levando em consideração o apetite por gastos demonstrado pelo governo”, adverte Castilho. Se a faixa definida para o crescimento real de receitas não for atendida, o que será do arcabouço? E da dívida pública? O equilíbrio das contas públicas continua na meta oficial, sustentado mais pela credibilidade de Haddad e Tebet. No entanto, uma vez que a realidade não venha a suprir as receitas esperadas, não há previsão institucional, no arcabouço, de punição para os gestores. A dívida cresce, o equilíbrio some e tudo fica por isso mesmo.
Para zerar o déficit fiscal no ano que vem, e oferecer um superávit de 1% em 2026, o cenário da economia e dos gastos públicos terá que ser muito diferente do atual. A atração de investimentos globais e de empresas privadas nacionais deverá ser em volume ainda não visto nos últimos anos. Caso as condições perfeitas não ocorram, é difícil crer que o governo e o presidente deixem de criar despesas em nome da responsabilidade social, ficando a lamentar formalmente o não cumprimento do arcabouço fiscal.
Desse modo, o esforço de integrantes do governo comprometidos com o equilíbrio das contas, em prol do rigor fiscal, estará apenas começando, uma vez aprovada a nova regra. Vale recordar que, antes mesmo de assumir, Lula conseguiu do Congresso a permissão para gastar R$ 210 bilhões acima do teto de gastos, na chamada PEC da transição. Para um governo com foco em elevar as despesas, a perspectiva não é das melhores.

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