A pressa e o risco das instâncias reguladoras

JC
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JC
Publicado em 28/04/2023 às 0:13

A propagação de mentiras pelas redes sociais é vista com cautela e receio no mundo inteiro. O crime virtual organizado já influenciou resultados eleitorais, com sua linha produtiva de difamações e falsidades. Além de tudo, a promoção de ataques sistemáticos às instituições, alimentando ódios e intolerâncias contra indivíduos que representam o status quo a ser combatido, ou mesmo contra poderes inteiros de uma República, a exemplo do Judiciário, provoca a sensação de que é necessário se fazer algo para coibir o avanço das redes do mal.

Com essa premissa, turbinada no Brasil pela balbúrdia do 8 de janeiro na Praça dos Três Poderes, o Congresso está para votar e aprovar, sem o ritual do exame pelas comissões, um projeto de lei destinado a regular – impedir – a circulação de fake news.

Nada mais atrelado à grita do momento, com o objetivo de tentar travar novas tentativas de desestabilização da democracia, conforme defendem os que empunham o projeto de lei. E nada mais arriscado, do ponto de vista institucional, para o mesmo ambiente de comunicação que se pretende proteger.

O atropelo do exame e do debate nas comissões parlamentares denuncia uma pressa que pode afetar o nobre e justificável propósito de combate às fake news. A questão é se o urgente PL vai colocar sob a mesma suspeita, e eventualmente sob a mesma mordaça, o produtor de mentiras e o jornalismo crítico a qualquer governo, por exemplo.

O país já afastou esboços de controle estatal da mídia, debaixo do codinome de controle social. Pois o que o PL em tramitação emergencial resgata, impossibilitado o debate a respeito de sua cobertura, é essa possibilidade, debaixo do véu da preocupação com a normalidade democrática.

A liberdade de expressão não se confunde com o direito de mentir e minar a democracia. No entanto, sem definições claras, e atribuições transparentes, corre-se o risco de transformar uma nação democrática em um lugar onde censores blindam não as instituições, mas as críticas – normais e necessárias – aos poderosos da ocasião.

É preciso se admitir a complexidade do tema, primeiro, expondo-se as dúvidas e dilemas para a sociedade, antes de se aprovar um desastre para o livre pensamento – e pior, com a sombra das fake news inviolada, caso seus produtores encontrem meios tecnológicos de burlar as propostas de segurança contidas no projeto de lei.

A delimitação dos papeis de cada um na formulação e exercício das tais instâncias reguladoras deve ser tão urgente quanto o ímpeto de fazer das fake news uma fachada para outros – antigos – objetivos. O jornalismo e a consciência crítica dos cidadãos não podem ser vítimas de um arroubo legislatório que estaria sendo embalado com péssimas intenções.

Não seria a primeira vez que os parlamentares, instruídos pelo Executivo ou não, embutem, na legislação sobre algo, medidas e ideias que não têm a ver com a origem da proposição.

A sanha regulatória precisa ser circunscrita ao que é falso, sem resvalar num território soberano do Estado Democrático de Direito: a publicização de notícias e opiniões.

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