Analfabetismo

Desigualdade na educação

As estatísticas atualizam a realidade que não muda, à espera de investimentos e ações articuladas

JC
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Publicado em 27/06/2023 às 0:00

As distâncias na sociedade brasileira são longínquas e profundas, como abismos antigos que parecem insuperáveis. De tantas lonjuras manifestas no cotidiano social, uma das mais perversas e evidentes encontra-se na educação. Na falta de oportunidades educacionais que perpetua a desigualdade, prolongando o abismo para o futuro. Onde causa e consequência se confundem, num ciclo sem fim de desamparo e desesperança. É assim que o analfabetismo, por exemplo, aparece no Brasil, sobretudo no Nordeste, região na qual a miséria e a pobreza despontam no país, e os analfabetos compõem parcela gritante de excluídos, em todos os estados.
Mais de 5 milhões de nordestinos com 15 anos ou mais são analfabetos, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE. Entre a população masculina, o percentual de quem não sabe ler e escrever é de 13% do total nessa faixa etária. Entre as mulheres, de 10%. De acordo com análise dos números realizada pela Agência Tatu, a desigualdade racial é escancarada: 80% dos analfabetos no Nordeste é formada por pessoas pretas ou pardas. Os dados são relativos ao ano passado, e ainda mostram o tamanho do déficit para a qualidade de vida dos idosos: quase um terço dos homens nordestinos com 60 anos ou mais são analfabetos.
Todos os estados do Nordeste apresentam taxa de analfabetismo alta, entre 10%, na Bahia, e 15% no Piauí. Em Pernambuco o índice é de 11%. A dívida educacional em toda a região, portanto, é similar. O que não exime a responsabilidade dos governantes – e da sociedade – em cada estado, em cada município. A exclusão que se reflete nos analfabetos assume outras formas, muitas vezes, na fome, na moradia improvisada ou inexistente, na falta de trabalho e de renda. Cuidar da alfabetização de jovens e adultos como emergência social é algo que não pode mais escapar do rol de prioridades para a recuperação e o desenvolvimento do Nordeste.
Em artigo publicado no JC no último domingo, o professor emérito da UFPE, Mozart Neves Ramos, ampliou a perspectiva, mencionando que em todo o território nacional há 11 milhões de analfabetos com 15 anos ou mais – portanto, quase a metade no Nordeste. E lembrou também o conceito de analfabetos funcionais, aqueles que não são capazes de interpretar o que leem. Aí temos um salto para 38 milhões de indivíduos nessa faixa etária. O que dá a dimensão dos desafios impostos aos brasileiros para superar um gargalo estrutural para o alcance de melhores condições de vida para o povo.
Citando um estudo do movimento Todos Pela Educação, segundo o qual a chance de um filho de pai analfabeto também ser analfabeto é de 32%, e esse filho de pai analfabeto possuir menos de 1% de probabilidade de cursar o ensino superior, Mozart Neves constata: “O analfabetismo preserva a desigualdade em nosso país”. As estatísticas atualizam a realidade que não muda, à espera de investimentos e ações articuladas, num esforço concentrado pela única força motriz possível de alterar o presente e o futuro de alguém, de uma família ou uma nação: a educação.

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