DEMOCRACIA RELATIVA

Desequilíbrio entre os poderes é um risco

Em Israel, no Brasil e em outras partes do mundo, pressões autoritárias ameaçam o futuro democrático

JC
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JC
Publicado em 25/07/2023 às 0:00

Enquanto em Israel o parlamento aprova legislação que enfraquece o Poder Judiciário, de tal maneira que a população foi às ruas tentar impedir um avanço autoritário, no Brasil, o desequilíbrio é no sentido inverso – uma proposta do governo Lula amplia o poder dos juízes para, supostamente, impedir movimentos antidemocráticos. Infelizmente, da mesma forma que entre os israelenses, o futuro da democracia brasileira está em risco, quando se cogita a hipertrofia das decisões monocráticas, sob o respaldo do ocupante da hora da cadeira presidencial. Nem é preciso recordar o efeito devastador que tal prerrogativa pode causar, sob a caneta de um aspirante a ditador, ou mesmo entusiasta de democracias relativas.
Ao reduzir a capacidade da Suprema Corte de seu país, limitando as decisões que podem contrariar o governo e o próprio Legislativo, os parlamentares de Israel, na prática, retiram a função e a responsabilidades dos juízes supremos para conter os excessos dos demais poderes. Com isso, está aberto o portão para a condução autoritária. Em semelhante raciocínio, na medida em que o governo federal brasileiro prepara um “pacote democrático” que exacerba os poderes do Judiciário, com o apoio do Legislativo, cria-se um complô do Estado contra as instituições, parecendo o prenúncio de sombra a incidir na liberdade do cidadão.
O primeiro-ministro israelense, assim como autoridades no Brasil, consideram as medidas de força como necessárias, como se fossem uma espécie de correção ou ajuste nos papeis dos poderes republicanos. O problema é que se incorre na mesma justificativa utilizada por todos os regimes totalitários – a de que a democracia “boa” é aquela sob o regime, enquanto a “ruim” cabe aos outros, à oposição e detratores do governo e seus aliados. A supressão do papel corretivo da Suprema Corte em Israel é um atentado à democracia, e não um ajuste pautado pela necessidade da época. Uma época, aliás, de muitos aprendizes de ditadores, que não perdem oportunidades para flertar com o totalitarismo.
O exercício do poder democrático em três vértices objetiva a manutenção da estabilidade institucional para a vigência de direitos demandados pela população, numa democracia. Se o Executivo quer mais, o Legislativo quer mais e o Judiciário quer mais, a tensão gerada pode se traduzir em fricção ou em unidade pastosa que derruba o sistema de pesos e contrapesos que deve sustentar o processo democrático. Mudanças podem ser avaliadas, debatidas e efetuadas – como por exemplo a forma de entrada dos juízes no Supremo Tribunal Federal, no Brasil, a fim de proteger o Judiciário do jogo casuístico da política. Mas a imposição de reformas a toque de caixa, por maiorias parlamentares subtraídas de sua representatividade popular por interesses alheios às demandas coletivas, em nome de governos e juízes ávidos por mais poder, não é uma necessidade democrática. O desequilíbrio insinua permanência da instabilidade, atacando as instituições e corroendo a essência da democracia.

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