DIPLOMACIA

Justiça de Haia questionada pelo Brasil

Declarações do presidente Lula em favor da ditadura russa mais uma vez destoam da defesa da democracia no ambiente interno

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JC

Publicado em 15/09/2023 às 0:00
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O mesmo tribunal que recebeu denúncias sobre as ações e falas de Jair Bolsonaro durante a pandemia, e sobre o extermínio de indígenas no mesmo governo, foi alvo de questionamento pelo atual presidente da República, por causa de um convite ao ditador da Rússia, Vladimir Putin, para participar da reunião de cúpula do G20, no Rio de Janeiro, ano que vem. Apesar de existir uma condenação do Tribunal de Haia, o Tribunal Penal Internacional, que prevê a prisão de Putin por crimes de guerra na Ucrânia, deportação ilegal de crianças e transferência igualmente ilegal da população ucraniana de seus locais de moradia, Lula afirmou que o presidente russo não seria preso no Brasil.
Não é a primeira vez que o presidente brasileiro confunde suas opiniões pessoais com a posição oficial do Estado que representa – temporariamente. Nesse ponto, age de forma bem parecida ao antecessor, que quis transferir seu negacionismo em relação às vacinas contra a Covid para o Ministério da Saúde, atacando o programa nacional de imunizações. Ao negar a competência de Haia sobre Putin, Lula recorda uma espécie de apego a uma imagem ultrapassada e contraditória da política russa, há muitos anos desatrelada dos ideais revolucionários de libertação popular, e inteiramente acoplada ao domínio de oligarquias no poder, com restrições de liberdades individuais e direitos coletivos, sem que isso provoque qualquer incômodo no presidente brasileiro.
A declaração de Lula, em um rompante de indignação e solidariedade ao comandante invasor da Ucrânia, gerou uma fogueira diplomática que precisou ser apagada pelo ministro da Justiça, Flávio Dino. O ministro teve que contradizer a si mesmo, pois havia seguido a disposição de Lula, reafirmando a possibilidade de o Brasil sair do TPI. Horas depois, resolveu ir às redes sociais para garantir que “não há nenhuma proposta, neste momento, de saída do Brasil do Tribunal Penal Internacional”. Um vai e vem típico de governos populistas, que soltam balões de ensaio retóricos para esperar a reação. Bolsonaro fazia isso praticamente todo dia. Basta lembrar as idas e vindas das polêmicas no Ministério da Educação, na sua gestão.
Destaque com notícias contra Bolsonaro no site do PT, o Tribunal de Haia ganha uma oposição surpreendente, da parte de um de seus países signatários, o Brasil, exatamente por um presidente que se elegeu graças à coalisão formada em defesa da democracia e dos direitos dos cidadãos. A incoerência move a defesa que se faz de Putin, em relação à credibilidade seletiva conferida ao Tribunal Penal Internacional. E ainda traz para o Brasil o ônus de um convite desconectado de uma guerra que penaliza um país invadido – a Ucrânia – abalando a economia global, e deixando um horizonte sombrio a respeito da perspectiva de união da Rússia com outro regime totalitário, a Coreia do Norte, inclusive na direção de tecnologia para o uso de bombas nucleares. Fazer de conta que não existe guerra, nem crimes, nem medo, é um péssimo sinal de negacionismo diplomático para o governo de uma nação democrática.

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