GASTOS PÚBLICOS

Muita obra sem teto, nem chão

Declarações do presidente da República vão na direção contrária ao equilíbrio fiscal, e ainda estimulam um mau costume dos governos no Brasil

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JC

Publicado em 05/11/2023 às 0:00
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Governo bom é aquele que gasta muito em obras, e não deixa dinheiro parado. A recente afirmação do presidente Lula, em reunião ministerial, pretende fazer desse conceito um mantra para o terceiro mandato, que já vai embalado no rumo do fim do primeiro ano. E se alinha à anterior, de que o déficit zero que vinha sendo proposto como inegociável pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, dificilmente será alcançado no ano que vem. A relação entre as duas falas é lógica, uma vez que obras precisam de recursos, e recursos sem limite para os gastos estouram a dívida pública, que no Brasil já ultrapassou todos os limites, com déficits estratosféricos desde a pandemia de Covid.
O governo Lula começou desmerecendo o teto de gastos, adotado no período de Michel Temer como medida para estancar a gastança que vinha, não por acaso, dos governos petistas. Mas a restrição da responsabilidade fiscal nunca foi popular entre os políticos brasileiros, seja no Executivo, seja no Legislativo. O ministro Haddad chegou defendendo uma nova fórmula de contenção, um arcabouço fiscal em que o equilíbrio deve ser obtido com o substancial aumento de receitas financeiras, para pagar a conta das despesas e investimentos públicos sem continuar provocando os rombos de sempre – que mais cedo ou mais tarde são pagos pela população, como se viu na gestão de Dilma Rousseff.
A reforma tributária surge no horizonte da equipe econômica como uma oportunidade para impedir a irresponsabilidade fiscal completa. Para tanto, os benefícios que vão sendo concedidos em reduções de alíquotas podem ser compensados pelo aumento da alíquota geral, deixando a carga maior para a maioria da população, em detrimento de setores que postulam privilégios. O importante, para a Fazenda, é assegurar um lastro que não comprometa a saúde fiscal do país. Mas essa não é a preocupação do presidente Lula. Na linguagem popular (e populista), os ministros não podem deixar o dinheiro parado. Quanto mais obras, melhor, na visão do presidente.
O problema é que o ímpeto realizador, no Brasil, topa no obstáculo da viabilização. Não são poucos os governantes que anunciam obras – necessárias, na maioria das vezes – sem a garantia dos recursos para que se transformem em realidade. Milhares de canteiros paralisados, à espera de recursos e trabalhadores, espalham-se pelo território nacional. O lançamento de projetos é sempre espetaculoso, enquanto, mais tarde, o silêncio acompanha o atraso dos cronogramas, quando não se lança a culpa em outras esferas de governo – na falta de liberação, na burocracia, ou até na rigidez dos órgãos de controle, que apenas cumprem seu papel na detecção de suspeitas de irregularidades na execução das obras.
Governar bem é gastar bem. A quantidade de obras iniciadas nem sempre é sinônimo de um bom governo. Melhor é quando a obra concluída gera o benefício coletivo, sem consequências negativas para os cofres públicos que precisam estar equilibrados.

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