Trabalho infantil: fracasso coletivo
Sintoma da degradação social na nona economia do mundo, aumento do número de crianças trabalhando e fora da escola é desafio histórico no país
Quase 5% da população de 5 a 17 anos se encontrava em situação de trabalho infantil no Brasil no ano passado, de acordo com novos números divulgados esta semana pelo IBGE. Num país tão grande, a fatia representa perto de 2 milhões de crianças e adolescentes que precisam contribuir com o sustento da família, ou buscar de algum modo a própria sobrevivência. Trata-se de dado cruel de uma sociedade onde a infância não está protegida contra carências e violações dos direitos básicos de educação, saúde e desenvolvimento humano desde os primeiros anos de vida.
Mesmo se fazendo o recorte recomendado pelos especialistas, de que nem todo trabalho realizado por essa faixa etária deve ser classificado como trabalho infantil, o fato é que a estatística vem reforçar as condições de privação a que são submetidos milhões de brasileiros. O aumento verificado, que abrange o período da pandemia de Covid, significa um retrocesso para a diminuição que vinha se dando até 2019. A partir de agora, é preciso cuidar melhor dessa população, buscando o respeito aos direitos elementares, e ao mesmo tempo garantindo dignidade a suas famílias, para que o trabalho infantil não se ponha como necessidade irrevogável para as demandas da casa.
O prejuízo à escolarização é a principal consequência do trabalho infantil. Para o Brasil, onde mesmo aqueles que conseguem estar na escola sofrem com a má qualidade do ensino, na maioria dos casos, salvo honrosas exceções que se oferecem como modelos a serem espalhados, o tempo fora do ambiente escolar na infância e adolescência é como uma pandemia social de graves sequelas coletivas. A frequência à escola é um dos critérios do IBGE para o enquadramento em trabalho infantil, ao lado de outros como tipo de atividade, horas trabalhadas, risco para as crianças e situação de informalidade. Vale recordar que a legislação permite a categoria de aprendiz para os jovens de 14 e 15 anos. Muitos adolescentes de 16 e 17 anos, contudo, apresentam alto índice de abandono escolar, comprometendo a formação e se alijando da qualificação para o trabalho.
O trabalho infantil aparece como substituto da educação em parte dos casos assim identificados, indicando o desvio social para suprir a carência econômica. É de se refletir que, mesmo quando estudam, crianças e adolescentes expostos ao trabalho infantil são subtraídos de precioso de tempo de vida, seja na complementação do estudo, seja para o devido lazer para o crescimento saudável. O alto número de brasileiros de 5 a 17 anos inseridos nas piores modalidades de trabalho, envolvendo risco de acidentes e à saúde – 756 mil indivíduos – representa quase a metade dos que recorrem a atividades econômicas. Não dá para minimizar ou normalizar a questão.
A nona economia do planeta precisa buscar um melhor amparo para as novas gerações, que nascem para moldar o futuro de um país em claro estado de degradação social. Um desafio que passa pelo fortalecimento da educação, que deve ser vista como solução, antes que se propague como problema.