MOBILIDADE

Porque a moto virou transporte coletivo

Com o Metrô sucateado e os ônibus abarrotados e sem conforto, a população migra para a opção na garupa do perigo sobre duas rodas

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JC

Publicado em 18/03/2024 às 0:00
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Em reportagem especial no domingo, o JC mostrou a insatisfação justificada dos passageiros em relação ao sistema de transporte coletivo na Região Metropolitana do Recife. A recente medida do governo do Estado, adotando a tarifa única e garantindo o preço sem reajuste, poderia ser mais celebrada pelos usuários. Infelizmente, a comemoração esbarra na precariedade dos serviços oferecidos, e o que poderia ser uma conquista, soa mais como atrativo para recuperar os passageiros que migram, cada vez mais, para a alternativa mais rápida do deslocamento por mototáxi e aplicativos de motocicletas – mesmo que essa escolha signifique apostar no risco do modal de transporte que leva a maior quantidade de acidentados para os hospitais, todos os dias.
A decisão pela moto vem ganhando adeptos, pois é fácil deixar de embarcar num metrô superlotado, caindo aos pedaços e que quebra toda semana, ou de subir num ônibus também lotado, onde o calor torna a viagem um suplício, agravado pelo trânsito que não conta com corredores exclusivos para os coletivos na dimensão necessária. Do lado da gestão do metrô, a responsabilidade federal é omissa há muitos anos, e não há recursos para sequer manter os trens e as estações em mínimas condições de uso. A responsabilidade estadual, por sua vez, também passa ao largo, pois as boas intenções de estadualização não saíram da promessa.
Com a exceção de duas concessionárias, as frotas de ônibus estão degradadas pelo tempo, sem a modernização requerida para atendimento à demanda com qualidade e eficiência. Nem mesmo o sistema BRT, que deveria ser a nata dos ônibus, escapa em Pernambuco do padrão de baixo nível para o serviço aos passageiros. Há veículos com uma década de uso, sem a renovação das condições para o melhor proveito da população. Com menos de 18% dos ônibus aparelhados com ar condicionado, as viagens no clima recifense são tormentos desconfortáveis, sem falar nas consequências para a saúde, pela exposição ao alto calor e ao estresse da superlotação e da demora nos percursos, repetidamente. Há quem tenha descido de um BRT no meio do caminho, por causa do calor insuportável. Os relatos de gente passando mal devido ao clima sufocante são comuns, fazendo com que a gestão do transporte coletivo na Região Metropolitana receba o rótulo de desumana. Nesse cenário de péssima estrutura, o bilhete único para o inferno do cotidiano não tem como receber fogos de artifício.
No caso do BRT, são 46 estações, todas sem refrigeração – desde 2020. Para que a situação melhore e receba a compreensão dos pernambucanos, a atitude oficial dos gestores deveria demonstrar algo além de solidariedade com os passageiros submetidos a esse desmantelo. Sem sequer previsão de renovação da frota e de climatização nos ônibus, ou algum indicativo de interesse no bem-estar dos que andam de metrô, a questão da mobilidade tende a ser um dos fatores de aumento da desconfiança das pessoas em promessas desacompanhadas de decisões na direção da efetiva solução para um problema que se arrasta, há anos, para lugar nenhum.

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