Aos estados mais ricos, tudo
Tratamento diferenciado para Minas, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul é uma afronta à federação brasileira – e uma espoliação dos mais pobres
Sob o silêncio, talvez envergonhado, talvez condescendente, de governadores, parlamentares de bancadas federais, estaduais e municipais, foi selado pelo Planalto um acordo com estados ricos do país: suas dívidas bilionárias não precisam ser pagas, sem constrangimentos. O presidente Lula e o ministro Fernando Haddad passam a mão na cabeça dos gestores do Rio de Janeiro, de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul. E os outros? Os outros que se virem, com o rigor fiscal que vale para a maioria, e com o desequilíbrio regional que fortalece a desigualdade econômica e social no território brasileiro.
O colunista Fernando Castilho, da JC Negócios, foi didático. Vale a pena retomar sua análise. Em 2018, sob a presidência de Michel Temer, o Rio de Janeiro, Minas e o Rio Grande do Sul foram classificados como insolventes, enquanto Pernambuco, numa faixa acima, não poderia tomar empréstimos do governo federal. Critérios de poupança, endividamento e comprometimento com a folha de pessoal foram organizados para se tentar conter o descontrole fiscal nos estados. De lá para cá, alguns melhoraram as contas, como a Bahia, Mato Grosso e a Paraíba. Mas os três insolventes continuaram na mesma posição.
Dias atrás, uma proposta do ministro da Fazenda juntou aos inadimplentes – com enormes dívidas contraídas junto ao povo brasileiro – os estados de São Paulo, Espírito Santo, Paraná e Santa Catarina. Em um programa chamado Juros pela Educação, o Sul e o Sudeste poderão ver os juros das dívidas cortados pela metade, desde que invistam parte da diferença em cursos profissionalizantes em todo o país. Pode parecer interessante, mas o problema é que, no ano passado, Lula quitou quase R$ 10 bilhões em dívidas do Rio de Janeiro, de Minas e do Rio Grande do Sul, que não pagaram um centavo ao Tesouro Nacional. Os três, assim, não entram no programa, que poderá ser utilizado pelos demais, das duas regiões.
“O ruim dessa solução de ajuda aos mais ricos é que os mais pobres pagam suas contas, fazem ajustes e estão prestes a poder voltar a crescer. Enquanto o Governo Federal, mais uma vez, ajuda a quem é mal pagador”, escreveu Castilho. A maioria dos estados realizou ajustes nas contas e vem fazendo o dever de casa, pagando parcelas da dívida pública para receber novos investimentos, como Pernambuco. Levando em consideração a relação entre desequilíbrio regional e desigualdade, a diferença de pesos e medidas na cobrança das dívidas poderia causar um clamor uníssono entre os políticos de fora dos acordos que, na prática, perdoam desperdícios e recursos mal gastos – para ficarmos na gestão republicana.
Talvez por receio de desagradar o dono do caixa, governadores e bancadas preferem se manter calados e inertes, diante dos benefícios seletivos aos estados mais ricos. Será essa a visão de desenvolvimento que poderá reduzir a desigualdade nacional?