Organizar para democratizar
Implantação do Sistema Nacional de Cultura promete estimular a produção e a difusão das artes para a população
O Recife foi palco, na última quinta, da sanção da lei do Sistema Nacional de Cultura (SNC) pelo presidente Lula, com a presença da governadora Raquel Lyra e da ministra da pasta, Margareth Menezes, além do prefeito João Campos. Chamado de “SUS da Cultura”, o sistema aguardava regulamentação há mais de uma década. Agora, a expectativa é de aumento dos recursos para a produção cultural no país, em especial através do Fundo Nacional de Cultura. Em outra face das expectativas, a mudança estrutural pode organizar melhor as informações do setor, reduzir a burocracia e democratizar o acesso à cultura pela população, ampliando a diversidade sem incorrer na politização dos projetos, e até integrando mais o trabalho dos artistas e produtores culturais com a educação.
Reduzir a papelada e o tempo de trâmite para aprovação dos projetos de financiamento é uma demanda antiga do setor cultural. Marco regulatório celebrado pelo governo como uma conquista que extrapola a gestão pública, o SNC já tem a adesão de todos os estados, e de quase dois terços dos municípios brasileiros. A adesão não é obrigatória, mas as vantagens que oferece configuram o instrumento como caminho sem volta, na direção correta, para o maior aproveitamento dos potenciais culturais no país. Ao fazerem parte do sistema, os entes federativos compartilham princípios essenciais como a diversidade nas expressões, a universalização do acesso aos serviços, a cooperação e a integração na execução das políticas, a transparência das informações e a descentralização das ações.
A exaltação dos artistas nacionais, enfatizada no discurso político do oportuno evento no Parque Dona Lindu, apenas ganhará desdobramentos na realidade com a participação efetiva de estados e municípios, dando forma e liberando recursos – sempre bem fiscalizados pelos órgãos de controle – para os projetos. O direito à fruição cultural, incorporado à cidadania, deve ser pensado muito além da oferta de apresentações artísticas e eventos de maneira gratuita. Há que se estruturar agendas culturais interligadas – não monotemáticas – em todas as formas de arte, em especial a literatura, fazendo com que a escrita e a leitura de livros façam mais parte do ambiente escolar, bem como da vida comunitária, através de novas bibliotecas e livrarias, por exemplo.
Do ponto de vista da gestão e do status político, o SNC representa um salto para o Ministério da Cultura (MinC), que ganha enfim um esquema estrutural, colaborativo e inserido em planos compartilhados. Para se ter uma ideia da mudança, todos os estados terão escritórios do MinC, além de agentes culturais que irão visitar os lugares como agentes de saúde. Presente à cerimônia, a governadora de Pernambuco reconheceu a importância do novo modelo, que pode “fomentar e irrigar a nossa cultura para além do discurso” – em todos os níveis de gestão. O prefeito João Campos, por sua vez, afirmou que a identidade do povo brasileiro se dá pela cultura, que deve ter uma política de Estado, e não de governos.
Que o SNC não demore e a se mostrar como avanço, estimulando artistas e empreendedores a democratizar o acesso cultural em todo o país.