Covid-19

Cientistas pernambucanos pedem apoio para pesquisar o novo coronavírus

Grupo formado por pesquisadores de instituições públicas, empresas privadas e ONGs se une para mapear epidemia, ampliar testagem, monitorar pacientes e estudar o coronavírus

Maria Luiza Borges
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Maria Luiza Borges
Publicado em 29/03/2020 às 11:37 | Atualizado em 30/03/2020 às 13:00
Reprodução da internet
Site brasilsemcorona.com.br traz informações sobre a covid-19 no Brasil - FOTO: Reprodução da internet

Tão logo os primeiros casos de covid-19 foram diagnosticados em Pernambuco, começou a circular no WhatsApp um mapa mostrando a geolocalização das notificações registradas no Recife. Desconfiada como sou com tudo que chega via zap, fui atrás de descobrir se aquele mapa era verdadeiro ou eu se estava diante de desinformação pura e simples. Descobri não só que era verdadeiro como que por trás daquele trabalho estava uma equipe de pesquisadores de várias empresas e instituições que pretende fazer muito mais do que mapeamento epidemiológico. O grupo quer massificar a testagem para a covid-19, monitorar remotamente doentes através da telemedicina, acompanhar a circulação de pessoas e sequenciar o genoma do novo coronavírus em pacientes pernambucanos.

O movimento, que pode ser conferido na página brasilsemcorona.com.br, foi iniciado pelas startups Colab e Epitrack e ganhou reforço de pesquisadores de várias instituições públicas e privadas, entre elas o Lika (Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami), da UFPE; IRRD (Instituto de Redução de Risco e Desastre), da UFRPE; IFPE; e empresas como Genomika, PrivateKit SafePath, Circor, E-Life, Nutes, Canon-Medical e Healthdrones, que atuam em áreas que vão de análise bioquímica a mídias sociais. Para conseguir avançar nas outras frentes, o grupo busca recursos através de plataformas de crowdfunding e lançou um edital na Fade, fundação ligada à UFPE. O objetivo é levantar R$ 3,5 milhões para tornar Pernambuco uma das referências no estudo da doença causada pelo novo coronavírus (se quiser dar uma força, é só clicar nos links que estão mais abaixo nesse texto).

O professor José Luiz de Lima Filho, do Lika, conta que as instituições começaram o trabalho em janeiro. “Notamos que os números da propagação do novo coronavírus não seguiam dados epidemiológicos tradicionais. Os resultados indicavam que o vírus é muito mais rápido e que o número de vítimas iria crescer exponencialmente. Quando foi detectado o primeiro caso no Estado, começamos com o boletim distribuído pela Prefeitura do Recife e o retorno foi muito bom. Agora precisamos expandir para novas camadas. A próxima delas é ir na direção do que orientou a OMS: testar, testar, testar”, diz.

As amostras de material dos pacientes suspeitos seriam colhidas nas unidade de Saúde e testadas pela Genomika, com o apoio do Lika. O exame, do tipo molecular, será o mesmo usado nos EUA e no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, chamado “padrão ouro”. José Luiz diz que o grupo tem condições de realizar pelo menos 600 testes por dia. “O problema é que estão faltando insumos no mundo inteiro”, lamenta. O professor estima que em 20 dias a Genomika, empresa cujo CEO estudou no Lika, deve estar equipada para expandir a testagem.

DIVULGAÇÃO
Protótipo de equipamento que monitoraria temperatura, pressão e nível de oxigênio dos doentes de forma remota. - DIVULGAÇÃO

A terceira frente seria implementada em parceira com o Instituto de Tecnologia de Massachussetts (MIT), que desenvolveu um aplicativo para celular que compartilha informações e movimentos da população que podem auxiliar as autoridades sanitárias a lidar com os pontos críticos de infecções.

A quarta onda é o uso da telemedicina para monitorar pacientes. Um protótipo de equipamento que mede temperatura, pressão e nível de oxigênio no sangue foi construído e a meta é produzir vários que permitam em tempo real ao serviço de saúde saber a situação de cada paciente, mesmo em casa, e socorrer os casos mais graves. “É possível, também, permitir que o paciente seja orientado por telefone ou por meio digital”, detalha José Luiz.

Por fim, o grupo quer ainda pesquisar o comportamento do vírus na nossa população. “Precisamos criar um banco de amostras, isolar e sequenciar o novo coronavírus em pacientes pernambucanos, prestar especial atenção nos casos que resultaram em morte”, acrescenta. Ele considera que o projeto é muito mais do que uma pesquisa. “É a união entre universidades nacionais e internacionais como o MIT e o University College de Londres, empresas, ONGs como o Círculo do Coração, Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, CESAR e Porto Digital, além dos Governos Estadual e Municipal, de Pernambuco e do Recife”.

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Veja o edital da Fade/UFPE 

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PESQUISAS PELO MUNDO

Ainda não há tratamento nem vacina contra o novo coronavírus, mas cientistas de todo o mundo correm contra o tempo num ritmo nunca visto para tentar debelar a pandemia. O site de informação científica The Conversation identificou pesquisas com três tipos de antivirais e pelo menos 10 vacinas diferentes. Muitos partem de estudos de outras cepas de coronavírus que provocam doenças como a SARS e a MERS. Sabe-se, por exemplo, que o genoma do coronavírus responsável pela covid-19 tem 79% de semelhança com o da SARS. Os cientistas já descobriram como o vírus entra na célula pulmonar e que enzima facilita essa invasão.

Medicamentos

Conhecido o inimigo, é hora de testar armas já existentes contra patógenos semelhantes (no Brasil, a Fundação Oswaldo Cruz vai participar de um amplo estudo envolvendo vários países). É aí que entram antivirais como as já famosas Coroquina e Hidroxicloroquina, que bloqueiam a entrada do vírus nas células. Uma das pesquisas mais avançadas nessa área é a da Universidade de Minnesota. Também nessa classe de medicamentos está o Barcitinib, usado contra artrite reumatoide, e o Camostat Mesylate.

Pelo menos duas outras classes de drogas estão sendo testadas. A de análogos virais (Remdesivir, Favipiravir), que buscam impedir a reprodução do vírus dentro da célula, além de drogas usadas no coquetel anti-aids (Ritonavir, Lopinavir), que inibem uma enzima de que o vírus precisa para se multiplicar. O site identificou 27 pesquisas usando uma ou mais drogas associadas.

Imunização

Do ponto de vista do desenvolvimento de uma vacina, a Organização Mundial da Saúde acompanha 41 iniciativas. The Conversation reproduziu dez delas.

A China começou a testar em humanos uma vacina que já mostrou resultados em macacos. O local escolhido para o teste foi Wuhan, onde a pandemia começou. Ali, 108 voluntários saudáveis estão participando do teste em humanos.

Uma associação internacional de entidades públicas, privadas, civis e filantrópicas conhecida pela sigla CEPI custeia oito projetos. Um do Instituto Pasteur com a Universidade de Pittsburg e a empresa Themis Bioscience estuda uma vacina em que o gene da covid-19 seria adicionado a um não virulento do sarampo para induzir uma resposta do organismo. Outra linha, da Universidade de Hong Kong, tenta adicionar o vírus da covid-19 ao da influenza. A Universidade de Oxford e o Jenner Institute estudam uma vacina recombinante que poderia ser produzida em células embrionárias de aves. A Novavax aposta em um estudo envolvendo nanotecnologia. A Universidade de Queensland estuda uma molécula sintética que simularia a estrutura do vírus (também em fase de teste em humanos). Os laboratórios Moderna e CureVac desenvolvem produtos diferentes com a mesma abordagem, usando fragmentos de RNA que provocariam uma resposta imunológica. O laboratório Inovio Pharmaceuticals usa uma proteína presente na superfície do novo coronavírus. A décima pesquisa, custeada pelo Governo da Espanha, busca desenvolver uma vacina usando uma forma atenuada do vírus.

Nem todos os produtos resultantes dessas pesquisas devem apresentar resultados efetivos e baixa toxicidade, mas com tantas abordagens diferentes, a esperança é em algum momento de 2021 a covid-19 ser previnível e tratável, deixando esse triste momento da história humana para trás.

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