Solidariedade

Campanha pede leite materno para bebê, filho de grávida morta pela covid-19

Criança nasceu prematura e com baixo peso. A mãe, fisioterapeuta, veio a óbito no fim da tarde do último domingo (5). Bebê está internado na UTI pediátrica da Unimed

Ciara Carvalho
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Ciara Carvalho
Publicado em 07/04/2020 às 8:49 | Atualizado em 08/04/2020 às 9:31
LUISI MARQUES/ACERVO JC IMAGEM
O leite materno é o alimento mais completo para os primeiros meses de vida do bebê - FOTO: LUISI MARQUES/ACERVO JC IMAGEM

Uma onda de solidariedade se espalhou nas redes sociais para ajudar o bebê da fisioterapeuta, morta no último domingo, vítima da covid-19. O pedido é por doação de leito materno destinado à criança que está internada na UTI do hospital da Unimed. “A gente faz esse apelo a todas as mães que possam ajudar nesse momento. Não é só para ele. Muitas outras crianças estão precisando. Ele é só a porta de entrada. Essa doação vai ajudar a salvar a vida de muitos outros bebês”, diz uma das amigas da fisioterapeuta.

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Em nota, a Unimed divulgou que o banco de leite humano da unidade Recife está com estoque baixo devido ao período de isolamento social imposto por conta do aumento dos casos de covid-19. “Neste momento, toda doação é bem-vinda para todos os pacientes internados na unidade e o transporte do leite pode ser feito pela própria Unimed Recife. Além disso, o cadastro das mães doadoras pode ser realizado por telefone”, afirma o comunicado.

Para doar, é preciso seguir alguns critérios de segurança: estar em processo de amamentação, não estar gripada ou fazendo tratamento para nenhum tipo de infecção. É necessário também ter em mãos resultados de exame para sífilis, hepatite B, HIV e hemograma, de preferência recentes. Na ficha cadastral, que pode ser feita através do número (81) 3413-9175, serão coletados dados gerais, como idade e nome, além de informações sobre hábitos da mãe.

Preenchida a ficha cadastral e com o resultado dos exames em mãos, o hospital vai buscar o leite na casa da doadora, desde que esteja dentro da Região Metropolitana do Recife. “A unidade garante que não falta alimento para os bebês atendidos, mas que é importante a colaboração da sociedade civil para o aumento dos estoques de leite humano durante este período de isolamento social”, reforça a nota da Unimed.

"SE EU MORRER, CUIDA DAS MINHAS FILHAS"

O apelo, endereçado à mãe, foi feito pela fisioterapeuta, grávida de oito meses, assim que foi internada, no dia 28 de março, numa unidade do Hospital da Unimed, no Recife, com sintomas da covid-19: “Se eu morrer, cuida das minhas filhas.” A jovem, de 33 anos e mãe de duas meninas gêmeas, chegou à unidade médica com febre, tosse e dores no corpo. O teste logo confirmou a contaminação pelo novo coronavírus. Em uma semana, ela foi encaminhada à UTI para monitoramento mais rigoroso. Na manhã do último sábado, após complicações, os médicos decidiram fazer o parto e o bebê nasceu prematuro, com baixo peso. A fisioterapeuta veio a óbito no fim da tarde do último domingo (5). A pedido da família, os nomes da vítima e dos amigos e familiares ouvidos pela reportagem serão preservados. No depoimento de todos, o sentimento era o mesmo: susto e medo, diante da velocidade da doença.

No dia 24 de março, quatro dias antes da internação, a fisioterapeuta escreveu em suas redes sociais: “Tudo isso vai passar”, na legenda de uma ilustração em que Jesus Cristo está com as mãos sobre a barriga de uma gestante, em referência à pandemia do coronavírus. A jovem tinha uma vida saudável e não possuía nenhuma doença preexistente. “Foi tudo muito assustador. Porque ela não era do grupo de risco. Costumava ter uma alimentação natural e sempre fazia exercícios físicos, inclusive grávida. A gestação estava totalmente normal”, diz uma amiga de faculdade. As complicações, provocadas pela doença, atingiram o coração da fisioterapeuta. “Ela desenvolveu uma miocardia. Isso foi o maior complicador. Quando ela já estava na UTI, a saturação tinha se normalizado, mas o coração começou a apresentar problemas”, conta o namorado da fisioterapeuta e pai do bebê, que está internado na UTI da unidade pediátrica da Unimed.

Este foi o primeiro óbito de uma gestante com síndrome respiratória aguda grave (srag) causada pelo novo coronavírus em Pernambuco. O empresário, de 42 anos, contou que levou a namorada ao hospital no sábado (28), sem ter a dimensão das possíveis consequências da doença. “Como a febre não passava, achamos melhor ir para o hospital. Mas o quadro dela era estável. Não parecia ter maiores complicações. Foi mais por uma medida de precaução. Como a falta de ar persistia, os médicos decidiram encaminhá-la à UTI para poder ter um acompanhamento mais de perto. Mas, na madrugada do último sábado, o quadro piorou e eles decidiram fazer o parto, para que ela pudesse receber a medicação necessária, sem colocar em risco a vida do bebê”, disse o empresário, que ontem fez o teste para saber se está infectado com o coronavírus.

O menino, que recebeu o mesmo nome do pai, está entubado e o quadro, segundo a família, é estável. “Eu já o vi duas vezes na UTI. É muito difícil pensar em como tudo isso aconteceu de forma tão rápida”, disse o pai do bebê. O corpo da fisioterapeuta foi cremado na manhã de ontem. “Para a família, de certa forma, foi um pouco de consolo que ela pudesse ser cremada. Que não fosse mais uma pessoa enterrada em um caixão, distante de todos. Quando tudo isso passar, vamos prestar nossas homenagens. Ela merece todo nosso amor”, diz uma amiga de faculdade.

No Instagram da fisioterapeuta, amigos e parentes, em luto pela perda, pediram: “Não subestimem a covid-19”. “Ela era linda, jovem, saudável, cheia de vida e de luz, deixou duas filhas lindas e seu bebê continua lutando pela vida. ... que bom ter trocado tantos momentos engraçados e alto-astral com você. Descanse em paz. Estamos orando muito pelo seu bebê e por toda sua família! Que dor, inacreditável tudo isso. Fisioterapia de luto!”, postou uma das amigas, entre as dezenas de mensagens escritas.

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