INDENIZAÇÃO

STJ mantém condenação, e Danilo Gentili deve pagar R$ 187 mil à ‘maior doadora de leite do Brasil’

Michele foi chamada de 'vaca' em rede nacional durante programa de humor em 2013; Decisão do Tribunal entende que acusados extrapolaram os limites da liberdade de imprensa

Katarina Moraes
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Katarina Moraes
Publicado em 07/04/2020 às 11:48 | Atualizado em 07/04/2020 às 21:26
Foto: Fernando da Hora/Acervo JC Imagem
Michele Rafaela Maximino orgulhou a cidade de Quipapá em 2013 após chegar ao marco de aproximadamente 480 litros de leite materno doados - FOTO: Foto: Fernando da Hora/Acervo JC Imagem

Parece estar chegando ao fim a batalha judicial travada pela pernambucana Michele Rafaela Maximino, conhecida como ‘a maior doadora de leite do Brasil’, contra os humoristas Danilo Gentili e Marcelo Mansfield e a Rede Bandeirantes. Após negar recurso de diminuição do valor da sentença dos acusados, Superior Tribunal de Justiça (STJ) resolveu manter a indenização de R$ 80 mil que, com juros e correções monetárias, deve chegar a R$ 187 mil.

O STJ entendeu que os acusados "extrapolaram os limites da liberdade de imprensa" e violaram "a honra e a imagem" de Michele em um programa televisivo de canal aberto, o que a expôs "ao ridículo, causando-lhe constrangimentos, humilhações e vexames", como defendido pelos seus advogados. "O Tribunal de origem, com base no contexto fático-probatório dos autos, reconheceu o dever de indenizar, em virtude da ofensa à imagem e à honra da autora", diz a decisão.

O advogado de Michele Rafaela, Cláudio Lino, explica que, com os juros e correções monetárias, a sentença de R$ 80 mil deve chegar a R$ 187.409 mil e que pode aumentar caso a defesa de Gentili e dos outros acusados entre com recurso. "O valor atual, até o mês de janeiro de 2020, é 187 mil. Se, por acaso, eles entrarem com outro recurso, vou pleitear a litigância de má fé, então o juiz pode até aumentar o valor em mais 10%".

Ouça entrevista com Michele no podcast O fato é...

O Tribunal teria, normalmente, 15 dias úteis para considerar o processo transitado e julgado. No entanto, com a pandemia do novo coronavírus, o STJ suspendeu os prazos até o dia 30, o que resultou em mais tempo para as partes acusadas. "Eles tem pouco tempo, mas estamos em uma situação inusitada, que é esta pandemia, já que o tribunal suspendeu os prazos", disse Cláudio Lino.

Processo

O processo começou na 2ª Vara Cível da Comarca de Olinda, passou para o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) e, agora, chega ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em 2016, os réus foram condenados pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) a pagar uma multa de R$ 200 mil. O apresentador recorreu da decisão na 5º Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Pernambuco, onde teve a multa reduzida para R$ 80 mil.

Relembre

Michele orgulhou a cidade de Quipapá em 2013 após chegar ao marco de aproximadamente 480 litros de leite materno doados. A solidariedade, porém, deslanchou em um triste episódio: a técnica em enfermagem foi ridicularizada pelo então apresentador do programa ‘Agora é Tarde’, Danilo Gentili, que a chamou de ‘vaca’ em rede nacional e a fez parar com as doações à época.

Apenas no ano passado a técnica em enfermagem voltou à Quipapá, sua cidade natal. Sua família veio morar no Recife após sofrer chacotas no município da Mata Sul de Pernambuco, devido à exposição em rede nacional. Michele chegou a deletar todas as suas redes sociais porque, segundo ela, os fãs de Gentili mandavam "pornografia e mensagens rudes" para ela.

Michele repete ato de amor

Após nascimento de João Miguel, no dia 4 de fevereiro, a Michele Rafaela Maximino, de 38 anos, se colocou mais uma vez a disposição das vidas, fazendo doações para os bebês que estão internados na UTI do Imip.

Segundo Maximino, por dia ela chega a produzir 3 litros de leite, fora o volume que está sendo consumido pelo mais novo membro da família. "Fora os momentos em que estou amamentando, preciso tirar leite 3 vezes ao dia, e mais algumas vezes para extrair o colostro, pois é uma substância mais grossa que o leite, e incomoda muito", acrescentou a técnica em enfermagem.

O marido de Michele, o professor Ederval Trajano, de 48 anos, comentou sobre as dificuldades que a esposa enfrentou nesta gravidez. "Foi uma gravidez muito conturbada. Como já é a quarta cesária, se torna uma gravidez de alto risco. Michele teve placenta baixa e apresentou sangramentos. Teve que ficar de repouso absoluto desde as 14 semanas. Ela chegou a ficar dez dias internada em Garanhuns e ainda teve uma infecção urinária", explica Ederval.

O despertar para a importância da doação

Foi na gestação da terceira filha, Mariana, agora com sete anos, que a família percebeu a importância da doação de leite. Como a menina nasceu prematura, teve que ficar internada na UTI. Ederval e Michele puderam acompanhar o drama das mães que não tinham leite para amamentar suas crianças. "Michele tinha muito leite. A partir daí, a gente percebeu que dava para salvar vidas e começamos a não desperdiçar mais", comenta o professor, que chama o leite de "néctar da vida". O casal ainda tem o jovem Richard, de 20 anos, e Gabriel, de nove anos. A técnica de enfermagem diz ainda que na terceira gravidez, conseguiu doar 480 litros de leite.

Cidade não tem banco de coleta e doação de leite materno

A doação do leite materno produzido por Michele demanda uma logística que envolve tempo e dinheiro da família. Isto porque a cidade onde a mulher mora, na Zona da Mata de Pernambuco, não possui banco de doação ou de coleta do líquido. Para que o leite não seja desperdiçado, visto que na última gravidez a técnica em enfermagem produzia cerca de três litros por dia, o marido tem que levá-lo, três vezes por semana, para a cidade de Caruaru, no Agreste do Estado, que fica a cerca de 70 quilômetros de Quipapá.

"Na cidade não tem banco de leite. Eu venho lutando desde 2013 para ter um banco, pelo menos, de coleta, só para arrecadar este leite. Porque o banco de doação requer uma estrutura maior. É muito triste saber que a cidade que tem a maior doadora de leite do Brasil não tem sequer um banco de coleta de leite", relata Ederval. Segundo ele, mesmo o líquido durando 15 dias congelado, não era possível fazer a viagem até a cidade do Agreste, devido à falta de dinheiro para combustível. "Eu trabalho, não tenho tempo para fazer isto. É uma luta. Eu espero que, com o nascimento do João, a gente consiga sensibilizar o governador ou o prefeito para que a gente tenha este local de coleta", relata.

Doação de leite

De acordo com o Instituto Nacional Figueira (Fiocruz), cada litro atende dez crianças e qualquer quantidade é aceita pelos bancos de leite materno. Segundo o Instituto, no Brasil, em 2018, 182.740 mulheres foram doadoras e 185.414 crianças receberam o leite que, no total, somou 215.328 litros captados. Pelo caráter sazonal das doações, os bancos sofrem com estoques baixos principalmente em festas de fim de ano, onde há escassez de até 60% do volume.

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