Caberá ao novo prefeito do Recife tirar do papel um processo que se arrasta há mais de uma década: a regulamentação dos instrumentos urbanísticos. Outorga onerosa, IPTU progressivo, operações urbanas consorciadas. Muito já se falou da importância dessas ferramentas para atacar o problema do déficit habitacional, sobretudo com os repasses federais em queda. Além de orientar o crescimento das cidades de forma inclusiva, a aplicação desses instrumentos cria novas fontes de financiamento para a produção de habitação popular. A capital, no entanto, nunca havia conseguido avançar na formatação dessa legislação urbana. Agora uma proposta finalmente foi desenhada e está em discussão no Conselho da Cidade. Apesar de ser um passo fundamental, o modelo proposto pelo Executivo tem sido alvo de críticas por prevê facilidades que podem comprometer a aplicação prática das medidas.
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O maior questionamento é justamente em cima do instrumento mais propagado: a outorga onerosa do direito de construir. É quando as construtoras pagam um valor em dinheiro à prefeitura por erguer prédios acima do limite permitido na legislação. Na proposta da atual gestão há uma regra de transição que permite que o mercado imobiliário tenha um bônus nos cinco primeiros anos de aplicação, vá diminuindo o percentual desse benefício nos três anos seguintes, até chegar em 100% da cobrança só após oito anos de vigência da lei. O detalhe é que, em algumas zonas da cidade, esse "bônus" representa isenção total da outorga onerosa nos cinco primeiros anos. Ou seja, não haverá cobrança.
"Poderia ser uma boa ferramenta para ajudar no financiamento de moradia popular, como ocorreu em São Paulo. Mas o desenho proposto pela prefeitura vai inviabilizar a eficácia do instrumento", avalia Socorro Leite, coordenadora da ONG Habitat para a Humanidade. Ela questiona outro ponto que compromete o resultado do tão esperado instrumento: a desatualização da planta genérica de valores, que define o preço base do metro quadrado dos terrenos nas diversas áreas da cidade e que serão usados como referência para cobrança da outorga.
LIMITAÇÕES
O secretário de Planejamento Urbano do Recife, Antônio Alexandre, reconhece que há limitações no formato que podem retardar o ritmo dos resultados. Mas diz que, entre o desejável e o possível, a prefeitura tentou evitar que a futura aplicação do novo instrumento provocasse a paralisação do mercado imobiliário. "Em todos os lugares onde a ferramenta foi regulamentada com algum sucesso houve esse tempo de transição. É preciso reconhecer que esse é um ramo que exige um tempo de maturação maior em relação a outros negócios", defendeu. Antônio Alexandre disse que 70% do valor arrecadado com a cobrança dos instrumentos urbanísticos serão destinados a um fundo e carimbados para financiar a produção de habitações de interesse social na capital.
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