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Cientistas descobrem quatro novas espécies de peixe em Fernando de Noronha

Além das quatro espécies inéditas, outras quatro estão em análise pelos cientistas, podendo também constituir descobertas inéditas

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JC

Publicado em 05/01/2021 às 19:37 | Atualizado em 05/01/2021 às 20:00
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Cientistas brasileiros e norte-americanos descobriram ao menos quatro novas de peixes, exclusivas do litoral do Brasil. A descoberta aconteceu durante uma expedição marítima realizada no arquipélago de Fernando de Noronha, em Pernambuco. Além disso, outras 15 espécies foram registradas pela primeira vez na região.

O trabalho ocorreu em duas etapas. Na primeira, a equipe permaneceu embarcada por 17 dias realizando a exploração em águas profundas. Na sequência, foram mais de 12 meses de dedicação à taxonomia (processo que descreve a diversidade dos seres vivos) das espécies, comparando características morfológicas com centenas de outros peixes e posteriormente comprovando se tratar de animais inéditos para a ciência. 

O estudo com os resultados da expedição foi publicado neste mês na revista científica Neotropical Ichthyology.

As descobertas

Uma nova espécie de peixe gobídeo (Psilotris sp.), de peixe-pedra (Scorpaena sp.), de peixe-lagarto (Synodus sp.) e de peixe-afrodite (Tosanoides sp.) foram as novidades. O peixe-pedra é uma espécie tipicamente venenosa, que se camufla no ambiente dos recifes como mecanismo de sobrevivência. O peixe-lagarto, por sua vez, também se camufla e fica praticamente imóvel à espera de indivíduos menores para abocanhar. Os novos gobídeos pertencem a um gênero raro, são pequenos e se alimentam de microrganismos, zooplanctons e microinvertebrados. Já o novo peixe-afrodite é apenas o segundo do gênero descoberto no Oceano Atlântico. O primeiro também foi encontrado no Brasil, em 2018, no Arquipélago de São Pedro e São Paulo, também em Pernambuco.  

De acordo com o pesquisador Hudson Pinheiro, que chefiou a equipe, o objetivo principal da exploração foi investigar um dos ambientes mais desconhecidos da ciência: os recifes profundos. Para isso, foram usadas tecnologias que podem descer a 140 metros abaixo da superfície e observar a biodiversidade local. “Pudemos entender melhor os ecossistemas profundos da ilha, o seu estado de preservação, as ameaças e a relação entre a biodiversidade do fundo e do raso”, explica.

Os cientistas destacam que a expedição permitiu a caracterização dos ambientes profundos de Noronha. Pela primeira vez, por exemplo, pesquisadores mergulharam nas paredes externas do arquipélago e na quebra da plataforma (uma mudança brusca na profundidade e relevo do oceano), atravessando termoclinas (que são fronteiras entre diferentes massas d’água) com temperatura e salinidade bastante distintas. “Cerca de 50% das espécies que nós encontramos lá no fundo são registros novos para o arquipélago”, informa Pinheiro.

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Expedição científica descobre quatro novas espécies de peixe em Fernando de Noronha - DIVULGAÇÃO

Novas espécies

Além das quatro espécies novas (nunca vistas anteriormente e não descritas pela ciência), outras quatro estão em análise pelos cientistas, podendo também constituir descobertas inéditas. “Encontramos detalhes, diferenças de coloração e morfologia que nos chamaram a atenção”, diz o pesquisador João Luiz Gasparini, destacando que “o isolamento do arquipélago promove a evolução dos peixes de forma distinta ao que acontece no continente, formando espécies endêmicas, que só existem na região mais profunda”.

Luiz A. Rocha/Divulgação
Psilotris - Luiz A. Rocha/Divulgação

Técnicas de exploração

Usando um ROV (drone submarino equipado com câmeras de vídeo, sensores e operado por controle remoto), foram registradas novas ocorrências e comportamentos reprodutivos de espécies comerciais, como garoupas e dentões (também conhecidos como vermelhos). O ROV também foi usado para a exploração pretérita, quando os cientistas primeiro lançam o robô para investigar os ambientes para depois os mergulhadores técnicos entrarem na água. A expedição científica também contou com uma metodologia conhecida como BRUVS, que são sistemas de filmagens subaquáticas remotas com iscas de atração.

“Vimos que algumas espécies, como a garoupa-marmoreada, estão utilizando os recifes da quebra da plataforma, entre 90 e 100 metros de profundidade, como áreas de reprodução”, relata o oceanógrafo João Batista Teixeira, que integrou a expedição. “Nossos vídeos revelaram uma altíssima abundância de predadores de topo de cadeia, uma enorme quantidade de tubarões, incluindo espécies ameaçadas de extinção”, detalha o pesquisador da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Caio Pimentel.

Outra tecnologia aplicada pelos expedicionários e que raramente é usada no Brasil foram os chamados rebreathers. O equipamento permite filtrar o dióxido de carbono exalado pelos mergulhadores e reutilizá-lo após uma mistura com oxigênio e outros gases. Nesse caso, foi usado o TRIMIX, que também contém nitrogênio e hélio. Isso permite que os cientistas fiquem mais tempo submersos, entre cinco e seis horas, e alcancem profundidades bem maiores. Além disso, o equipamento não libera bolhas, o que ajuda a não afugentar os peixes.

Luiz A. Rocha/Divulgação
Synodus - Luiz A. Rocha/Divulgação

Desenvolvimento sustentável no arquipélago 

O ideal, de acordo com os pesquisadores, é que uma parte dos recifes profundos seja transformada em área de criação de pescado, onde os peixes possam se reproduzir em segurança e, assim, manter os estoques saudáveis para serem utilizados no restante da ilha. O desafio dos cientistas agora é trabalhar com os gestores ambientais e pescadores, buscando estratégias de desenvolvimento sustentável e conservação marinha no arquipélago de Fernando de Noronha.

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