Inferaestrutura

Comunidade vive com medo debaixo do paredão da Barragem de Serro Azul. Retirada dos moradores não aconteceu

Estudo de impacto Ambiental da obra previa a transferência da população para uma agrovila e determinava um raio de segurança de 500 metros após o paredão da barragem, onde não deveria ficar nenhum morador

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Adriana Guarda

Publicado em 13/02/2022 às 8:05
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Da janela de suas casas, os moradores da Rua da Ponte olham para o paredão de 65 metros de altura (um prédio de 22 andares) da Barragem de Serro Azul, em Palmares. De tão perto, algumas residências parecem coladas ao morro de terra avermelhada. A obra, construída para conter as enchentes na Mata Sul e aplacar o pânico da população, continua provocando medo. O Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) do empreendimento, estabelecia um raio de segurança de 500 metros da barragem, onde não deveria se ver nenhum sinal de população. Mas não foi isso o que aconteceu. O governo de Pernambuco desistiu de desapropriar a área e os moradores foram obrigados a ter a barragem como vizinha, alguns vivendo a menos de 100 metros do paredão.

BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM
default - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

Se por uma lado, a barragem cumpriu seu papel de conter a força das águas e evitar o rastro de destruição das enchentes na Mata Sul do Estado; por outro, trouxe prejuízo ao pequeno distrito de Serro Azul. A população local entende que não cabe uma comparação da importância de um ou de outro ou qualquer juízo de valor. A discussão é que o projeto de implantação da obra previa compensações econômicas, sociais e ambientais, que não foram cumpridas, além do risco enfrentado pelas famílias vivendo aos pés do morro.

 

A primeira promessa seria desapropriar, indenizar e relocar as famílias das 66 casas da Rua da Ponte para o Conjunto Residencial Hermilo Borba Filho, que nunca foi construído. De acordo com o relarório de segurança das barragens da Agência Nacional de Águas (ANA), Serro Azul é considerado um equipamento de risco médio e aparece nos relatórios de 2019 e 2020, reportando acidentes e incidentes.

BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM
Das cinco Barragens prometidas após a enchente de 2010, apenas uma ficou pronta: a de Serro Azul em Palmares. - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

"Se existe um raio de segurança de 500 metros ele precisa ser respeitado. Algumas casas na cabeceira da rua estão a uma distância de 25 a 50 metros do paredão. Embora a engenharia diga que existe total segurança, a história das barragens no Brasil mostra o contrário. Então, para a segurança de todos, nós fazemos o contraponto entre a engenharia e a história e queremos sair", afirma o presidente da Associação de Moradores de Serro Azul, Elson José da Silva.

Também morador da Rua da Ponte, ele conta que a Associação esteve 20 vezes no Recife, procurando as mais diversas instancias para que as promessas acordadas como a comunidade fossem respeitadas. Quando perceberam que as negociações não avançariam, decidiram entrar com uma ação na Justiça.

O advogado Lenivaldo Lima diz que em 2016 35 famíias decidiram ingressar com ações, distribuídas em 15 processos. Depois de muitas idas e vindas, o Tribunal de Justiça de Pernambuco reconheceu que a população sofreu dano e determinou a realização de perícia judicial para avaliar o tipo e tamanho do dano. Mas o perito apontado pediu para deixar o caso, alegando falta de agenda para realizar as vsitas e as perícias.

Segundo o advogado, o impacto na vida da população de Serro Azul foi grande. As casas passaram a ser invadidas por animais, que antes viviam na mata, mas ficaram sem ter para onde ir com a chegada da barragem. Os quintais das casas deixaram de ter horta e fruteiras. As pessoas passaram a viver com pânico do paredão. A poluição sonora é tremenda e os moradores convivem com mau cheiro quando se abre e se fecham as comportas.

"A barragem não pode ser um mero paredão para conter água e nada mais. Ela pode abastecer a região hidricamente, pode gerar emprego e renda para a região e outras atividades. Pela mandeira que vem se comportando, o Estado deixou claro que não quer resolver o problema", acredita Lima.

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Das cinco Barragens prometidas após a enchente de 2010, apenas uma ficou pronta: a de Serro Azul em Palmares. - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

MEDO

Quando chove, quem vive aos pés da barragem sentem medo da obra que foi construída exatamente para frear as cheias. "A promessa do governo foi nos indenizar e tirar todo mundo daqui. Fizeram a medição das casas, pediram que a gente abrisse conta no banco e que informássemos os números das contas. Na época, falarama que na semana seguinte o dinheiro seria depositado. Ninguém viu um centavo do dinheiro e continuamos aqui, enfrentando esse risco, vivendo debaixo de um paredão. Tempo de inverno ninguém consegue dormir direito, porque tem muitas rachaduras aí. A gente pede que o governo dê uma solução, que venha fazer uma nova medição, porque durante esse tempo todo já fizemos reformas nas nossas casas", diz a moradora da Rua da Ponte, Luciene de Oliveira Silva, 49 anos.

A Barragem de Serro Azul, que movimentou o distrito durante a sua construção, também fez o lugar perder dinamismo econômico depois que foi inaugurada,em 2017. A PE-103, que passava pela comunidade e seguia até bonito desapareceu com a construção e seria reconstruída em outro local, mas 5 anos se passaram e a nova estrada não saiu do papel.

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Das cinco Barragens prometidas após a enchente de 2010, apenas uma ficou pronta: a de Serro Azul em Palmares. - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

"Depois que a barragem chegou, o comércio teve uma redução de 70%. Ficamos isolados no pé do paredão e perdemos o fluxo turístico, que promovia o encontro das pessoas que vinham de Palmares e Bonito. Esse povo desapareceu e nós ficamos a ver navios. Queremos que o governo tenha a consciência de vir aqui e renovar a negociação que fez com o povo de indenizar, de trazer um projeto de emprego e renda para alavanacar a economia da localidade", defende o comerciante Amaro Miguel, 58 anos, que há 30 anos tem negócio em Serro Azul.

ESTRADA

Questionada pelo JC por várias das promessas feitas aos moradores de Serro Azul, a Secretaria de Infraestrutura e Recursos Hídricos respondeu apenas sobre a estrada. Segundo a SeInfra, "o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) concluiu, em janeiro, a contratação da empresa responsável pela elaboração do projeto de implantação e pavimentação da chamada variante da barragem da usina de Serro Azul, localizada na PE-103, com uma extensão de 16,09 km. A previsão é de que o projeto seja concluído no final do primeiro semestre deste ano. Após esta etapa, será publicado o edital para contratação das obras".

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