URBANISMO

Canal do Fragoso: "Estamos desesperados." Comunidade tem casas marcadas de surpresa para desapropriação em Olinda

Casas marcadas estão no entorno de onde será construída a Lagoa do Fragoso, que prevê 97 desapropriações

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Katarina Moraes

Publicado em 23/05/2022 às 7:30 | Atualizado em 23/05/2022 às 8:32
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Dezenas de moradores das comunidades Sítio Marreta e Sítio do Cajá e arredores tiveram os muros demarcados e as casas medidas por equipes do poder público no último mês sem que uma motivação fosse dada. A situação tem causado pânico na região, visto que está no entorno de onde será construída a Lagoa do Fragoso, que prevê, no mínimo, 97 desapropriações de imóveis, segundo a Prefeitura de Olinda.

No entanto, ainda não foi informado quais residências serão escolhidas. Atualmente, a Companhia Estadual de Habitação e Obras de Pernambuco (Cehab-PE) realiza um estudo de impacto da desapropriação da área, mas a execução será pelo município, que é o responsável pelas obras da lagoa de retenção.

BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM
Casas marcadas na Comunidade Sítio Marreta, em Olinda - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

O aposentado José Tertuliano, de 47 anos, dizia que iria “morrer” no local onde nasceu, mas, agora, teme a ameaça sobre seus planos. "Vieram marcar e não disseram nada, só que era em relação a uma obra. A gente está sem saber. Tem muita gente sem dormir, aperreada", disse.

Para Tertuliano, a vida na comunidade é um "paraíso". "A gente fica até 0h aqui na frente, dorme roupa no varal de fora. Até hoje nunca vimos assalto. Sair de um local desse para ir morar em outro canto é para matar um. Meu pai mora aqui há 67 anos, e estou vendo a hora dele ter um ataque", relatou.

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Obras do Canal do Fragoso, em Olinda, seguem sem prazo de conclusão. - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

Outro afetado é o pedreiro Lindemberg Cardoso, 41, que já teve a casa desapropriada para obra do Canal. "Minha casa era no valor de R$ 160 mil, mas me deram R$ 86 mil, e isso porque fiquei lutando. Morei dois meses de aluguel porque tive que sair de lá com 15 dias quando deram o dinheiro".

Quatro meses depois, construiu uma nova no Sítio Marreta, sem saber que a área também seria marcada. “Tiraram-me de lá e agora estou aqui, no mesmo estado. A conversa é que vai esticar mais a lagoa, e ninguém sabe como é. A gente não tem moradia digna, porque saem tirando. Estamos sem sossego. Querem que a gente vá para uma favela?”, questionou o pedreiro.

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Lindemberg Cardoso, de 41 anos, e dois de seus quatro filhos - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

Para cobrar respostas, uma comissão de moradores convocou reunião com o órgão, marcada nesta segunda-feira (23). "Aqui não tem barraco, são casas construídas com muito sacrifício, e ninguém nos diz a verdade", reclamou o aposentado Daniel Ferreira, 48.

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Aposentado Daniel Ferreira, 48, é uma das lideranças da comunidade contra a desapropriação - BRUNO CAMPOS/JC IMAGEM

Atraso nas obras

A Lagoa do Fragoso, que custará R$ 4,5 milhões, tem previsão de término em 12 meses a partir do início dos serviços. Ela auxiliará a reduzir inundações das redondezas, que sofrem com alagamentos nos períodos de chuva intensa. A Prefeitura de Olinda explicou que uma empresa já venceu a licitação, mas que aguarda a autorização do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) para dar início aos trabalhos, e que não será necessária nenhuma desapropriação na primeira frente de trabalho.

Anteriormente, eram previstas duas lagoas, mas o Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) desaconselhou que a do "Ouro Preto" fosse construída devido ao alto volume de desapropriações previsto. Ambas estavam inseridas no projeto de urbanização da Bacia do Fragoso, como uma contenção para o Canal do Fragoso, tocado pelo Governo do Estado, cujos serviços, iniciados em 2013, seguem sem prazo para serem concluídos.

O auditor Alfredo Montezuma, que fiscaliza as obras no TCE, aponta que o "o grande problema do atraso são justamente as desapropriações", e pede a responsabilização do controle urbano da Prefeitura de Olinda na região. 

"Nem todo mundo está nessa situação de morar há décadas em um local precisar sair. Quando vemos imagens de drone do Fragoso comparando com o passar dos anos, vemos uma expansão da ocupação. Por isso criticamos a prefeitura, porque se não fizer um controle adequado, vamos ficar enxugando gelo. Desapropriam, não atacam logo e as pessoas invadem novamente", disse.

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