Chuvas em Pernambuco: Por que programas como o Guarda-Chuva deram tão certo e não foram replicados?
O que explica o fato de outros programas de prevenção de risco nos morros não apresentarem o mesmo desempenho se já existia um conhecimento adquirido de outras gestões?
Criado em 2001, o programa Guarda-Chuva representou um salto na gestão de risco dos morros do Recife. Também foi no mesmo ano que aconteceu a reestruturação da Coordenação de Defesa Civil do Recife (Codecir). Antes disso, na segunda gestão do governador Jarbas Vasconcelos (1993-1996), foram criados instrumentos que pavimentaram o que viria depois, como um Mapeamento de Risco das Encostas Ocupadas do Recife e a busca do uso de tecnologias construtivas de baixo custo para reduzir os riscos de deslizamentos.
O Guarda-Chuva tinha seis eixos de atuação: controle urbano preventivo para ocupação em área de riscos nos morros e alagados; Defesa Civil Permanente (ação descentralizada e gestão de proximidade); ações integradas de pequeno porte; urbanização e desenvolvimento de política habitacional; ações educativas e culturais para prevenção de riscos e acidentes e participação popular. Com uma ação coordenada e contínua, extrapolando o período de inverno, o número de vítimas de deslizamentos caíram vertiginosamente. Enquato em 1996 o total de óbitos foi de 46; em 2001 caiu para 11.
O ex-prefeito do Recife e deputado estadual João Paulo, recorda que recebeu a prefeitura com 10.500 pontos de risco nos morros e que entregou com 3.500. Segundo a atual gestão do município, este número é de 15 mil pontos, o que significa um retrocesso.
"Se o número subiu dessa forma, significa que não foi dado continuidade ao trabalho. Na nossa gestão, tínhamos uma Defesa Civil azeitada. Quando recebíamos os avisos da Apac de que haveria uma grande precipitação, removíamos as famílias dos locais de risco e dávamos garantias a ela. Por isso foram evitadas tantas mortes na nossa gestão. Nossa intenção não era dexar a tragédia acontecer e depois ir cuidar", alerta.
O programa Guarda-Chuva investiu R$ 292,5 milhões em obras de contenção de encostas, construção de escadarias com corrimão e remoção de famílias mediante o pagamento de auxílio moradia. "A tragédia das últimas chuvas representou um acordar para a cidade. As pessoas atingidas foram os pretos e pobres das periferias. Sabemos que diante da possibilidade de acontecimento de novos desastres naturais, em função das mudanças climáticas, as tragédias naturais podem ser mais frequentes", observa.
AÇÃO INTEGRADA
Os municípios pernambucanos precisam voltar a buscar referência e aprender com as experiências passadas. A Condepe/Fidem já coordenou um grande grupo de planejamento e ação para atuar nos morros, chamado Viva o Morro. Especialistas em desenvolvimento urbano defendem que está faltando uma ação integrada, como aconteceu em outros momentos. É necessário o envolvimento do governo Federal, do Estado e das prefeituras no processo, além da academia oferecendo soluções técnico-científicas.
Tudo passa pela redução das desigualdades sociais. Déficit habitacional, falta de saneamento, acesso à água, saúde e educação tudo está associado. O cenário de desalinhamento político entre governo Federal e Estadual atrapalha e o Recife, com uma grande parte da população vivendo e área de morros, deveria dar o exemplo e adotar uma estratégia mais asservita. A tragédia das chuvas deixa uma mancha irreversível.